É lapidar o que vem ocorrendo num setor da economia que movimenta quase R$ 10 bilhões – o equivalente a 1% do Produto Interno Bruto (PIB). O Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), responsável pelo controle da mineração no Brasil, acumula uma jazida de denúncias que vão desde adulteração de documentos, tráfico de influência até lavras clandestinas. Sobre as filiais do departamento em São Paulo e Minas Gerais, Estados que respondem por cerca de 70% da produção mineral no País, recaem as maiores suspeitas. Vinculado ao Ministério de Minas e Energia, o DNPM é a autarquia responsável por tudo o que é considerado minério: da simples areia retirada dos rios às pedras preciosas. Assim, qualquer um que deseje explorar o solo brasileiro, patrimônio da União, tem de recorrer antes a esse órgão federal.

André Sarmento
RADICAL Kohle ignora licitação e impede limpeza do Tietê

Em São Paulo, o empresário Eduardo Rodrigues Machado é um dos campeões em requerimentos de áreas com matéria-prima para a construção civil. Suas três empresas – Pirâmide, Viterbo e Rio do Peixe –, que somam 111 projetos para a extração de areia e granito, transformaram-no em um dos maiores empreendedores do Vale do Ribeira, a região mais rica em minérios do Estado. Extratores de areia ouvidos pela reportagem acreditam que o DNPM paulista possa estar tomando as dores das empresas de Machado nas disputas minerais. O departamento atendeu, em 1995, ao requerimento do empresário para a exploração de areia do rio Tietê, no trecho que corta a capital. A extração, porém, nunca ocorreu pela falta de autorização da Secretaria do Meio Ambiente e do Departamento de Águas e Energia do Estado (Daee). Quatro anos depois, o Daee mudou de idéia. Com o objetivo de reduzir o preço, permitiu a exploração e a venda da areia obtida na dragagem à Triunfo, empresa que venceu a licitação para a limpeza do Tietê. No entanto, quem impediu a comercialização dessa vez foi o DNPM, que chegou a paralisar o desassoreamento, aumentando o risco de enchentes na capital. No entender do órgão federal, o direito legal daquela área pertence a quem primeiro a requereu no departamento, ou seja, à empresa de Machado e de outros dois empresários. Para o DNPM, a Triunfo estaria realizando “lavra clandestina” por não ter tal documento.

Max G Pinto
SORTUDO Machado sempre se dá bem nas decisões federais

Desfecho – A liberação da limpeza no Tietê só aconteceu quando o Daee apelou ao presidente Fernando Henrique. Mas, por falta de autorização do DNPM, a Triunfo nunca pôde comercializar a areia, hoje estocada num dos depósitos da empresa para utilização em aterros sanitários. Eduardo Machado, que participou do leilão e perdeu a disputa para a Triunfo, nega que tenha interferido na decisão do DNPM. Diz ainda que, dias depois, ofereceu “de graça” para a concorrente sua autorização para explorar a areia retirada do Tietê. “Na época, abrimos mão do nosso interesse, pois sabíamos que os tributos da Triunfo com a venda da areia seriam revertidos para toda a população”, diz Machado, justificando a boa ação. O diretor técnico da Triunfo, João Villar Garcia, tem outra versão: “A oferta do minerador foi uma transferência temporária para o Daee, e não para nós, em troca da permissão de extrair areia do Tietê depois que fosse finalizado nosso contrato.”

Embora confie na postura isenta do DNPM em São Paulo, a Triunfo também levou a pior quando o departamento desconsiderou o contrato de locação entre ela e o sitiante Roberto Pettená, dono do terreno onde havia a pedreira que abastecia sua empresa nas obras de duplicação de um dos trechos da rodovia Regis Bittencourt. De acordo com a legislação do setor, o minério disponível num terreno pertence à União, que concede o direito de exploração à primeira pessoa que o requerer ao DNPM, independentemente de ele ser ou não o proprietário, desde que haja um acordo com este. Assim, quando Pettená quis desfazer o contrato de locação da Triunfo, o DNPM atendeu o pedido do sitiante. A Triunfo perdeu a pedreira. Nesse meio tempo, Pettená também conseguiu a autorização do departamento para explorar a brita de sua propriedade – permissão que ele colocou à venda. Procurado pela reportagem, o sitiante negou que o rompimento com a Triunfo tenha sido insuflado pelo futuro comprador de sua área, mas revelou que a negociação está sendo feita com a Pirâmide, uma das empresas de Machado.