Nas janelas dos sobrados centenários, os músicos vão ocupando seus lugares. São trombonistas, trompetistas, flautistas, saxofonistas e clarinetistas. Os percussionistas, com seus bumbos, taróis e pratos também se colocam nas janelas históricas, da mesma forma que os tocadores dos vários tipos de tuba. Na rua, no meio da multidão, o maestro se prepara para reger sua orquestra de 94 integrantes. É uma noite fria de julho, mas as centenas de pessoas nem ligam para a temperatura baixa. A música começa, vinda do alto, envolvendo o público, ressoando pelos ricos sobrados coloniais da rua da Quitanda, em Diamantina, cidade histórica mineira e patrimônio cultural da humanidade desde 1999. É mais uma apresentação da vesperata, um espetáculo musical único, privilégio da cidade de Chica da Silva e de Juscelino Kubitschek. “Já tentamos fazer a vesperata em outras ruas de Diamantina, mas não deu certo. Só mesmo aqui na rua da Quitanda, que forma um anfiteatro natural”, explica Irineu de Souza Domingos, o “maestro Alex”, diretor da banda mirim municipal, e um dos criadores da vesperata em 1977. Na época, a cidade iniciava uma campanha para ser reconhecida pela Unesco como patrimônio cultural da humanidade e a música foi um dos aspectos empregados para mostrar que, além da beleza das construções do centro histórico já tombado pelo Brasil, a cidade tinha uma presença marcante na cultura e nas artes.

Agora, Diamantina se prepara para comemorar o centenário de seu filho mais ilustre, o ex-presidente Juscelino Kubitschek, que nasceu em 12 de setembro de 1902. E a música, tanto da vesperata, das românticas serenatas, dos barrocos concertos nas igrejas históricas quanto dos modernos shows de música popular nos bares da cidade, voltará a ser o principal destaque do ano do centenário. As duas principais bandas da cidade, que tocam nas vesperatas e nos concertos nas igrejas, são a da PM e a banda mirim, bancada pela prefeitura. Criada em 1985 pelo maestro Alex e pelo então prefeito, Antônio de Carvalho Cruz, a banda é uma espécie de bolsa-escola. Os alunos, todos dos bairros pobres da periferia e da região, recebem meio salário mínimo por mês para aprender um ou mais instrumentos musicais. Em 16 anos, mais de dois mil jovens, rapazes e moças, tornaram-se músicos profissionais. Na banda da PM, 17 sargentos músicos são antigos alunos da banda mirim.

Restauração – JK faria 99 anos em setembro deste ano. Para Diamantina, a festa já começou e só terminará no dia do centésimo aniversário, em 2002. Além da parte musical local, a cidade pretende fazer exposições sobre JK, sobre as artes, a cultura e a arquitetura de seus tempos de governo. “É hora de o País, no começo de um novo século, recordar quem foi o causador de um surto de progresso, desenvolvimento e cultura com efeitos que permanecem até hoje”, afirma Serafim Jardim, presidente da Casa de Juscelino, ONG sediada na casa onde JK passou a infância em Diamantina. Restaurada em 1985, ela ganhou este ano um auditório construído em madeira no quintal e um bar no porão, o Bar do Nonô, apelido de Juscelino desde a infância, onde se apresentam músicos da cidade. Todos os cômodos têm objetos relacionados com JK, desde seus tempos de garoto até os anos da Presidência.

Mas os festejos do centenário do presidente mais famoso e querido do País, eleito pelos leitores de ISTOÉ como o “Brasileiro do Século XX”, não vão ficar apenas na esfera municipal de Diamantina. Na área federal, os ministérios da Cultura, das Comunicações e do Esporte e Turismo, os dois últimos dirigidos por mineiros, já anunciam apoio ao centenário. O ministro da Cultura, Francisco Weffort, é o presidente da Comissão Nacional do Centenário JK, que já prepara a abertura das comemorações para Brasília, nos dias 11 e 12 de setembro, e Diamantina, nos dias 13 e 14. Pimenta da Veiga, ministro das Comunicações, dará suporte financeiro, através dos Correios. Carlos Melles, ministro do Esporte e Turismo, encampou a reivindicação da cidade, de aumentar a pista do aeroporto local em 400 metros. “Hoje, só recebemos aviões de até 50 passageiros. Com o aumento da pista, Diamantina ficará definitivamente aberta ao turismo nacional e internacional”, torce o prefeito, Gustavo Botelho. O governador de Minas, Itamar Franco, não ficou atrás. Programa eventos não só para Diamantina, mas também para Belo Horizonte. Foi na capital mineira que JK, prefeito nomeado por Getúlio Vargas, começou sua parceria com o arquiteto Oscar Niemeyer, que legaria aos brasileiros o conjunto arquitetônico da Pampulha e Brasília, primeira cidade moderna reconhecida como patrimônio cultural da humanidade.