Poucos campos da medicina estão vivendo hoje uma revolução tão intensa quanto o da cirurgia. Instituições de ponta do mundo inteiro se esmeram em aperfeiçoar ou criar técnicas que permitam basicamente os mesmos benefícios: maior precisão, cortes quase imperceptíveis, menor agressão ao interior do corpo e recuperação mais rápida. Do esforço, surgem opções ousadas. Um exemplo são as chamadas operações pelos orifícios naturais. Neste gênero de procedimento, os cirurgiões estão utilizando o nariz, a boca e a vagina para introduzir os instrumentos necessários.

A operação mais recente nesta área foi realizada há duas semanas nos EUA. A equipe do Centro para o Futuro da Cirurgia, da Universidade da Califórnia, fez um procedimento de redução de estômago usando a vagina como canal de acesso. O trabalho durou 75 minutos, com a paciente sob anestesia geral. Primeiro, os médicos fizeram duas incisões no umbigo – uma para introduzir uma microcâmera que enviava as imagens para uma tela e outra, para a colocação de um instrumento que isolava o estômago dos outros órgãos.
A extração de parte do estômago foi feita com a inserção de instrumentos pela vagina. O órgão foi acessado após um pequeno corte no útero para permitir a passagem das peças. A parte cortada foi puxada para fora através da vagina. "Esta pode ser uma boa opção para quem precisa fazer a cirurgia", disse Santiago Horgan, diretor do centro. Há um ano, a mesma equipe protagonizou outra façanha ao extrair a vesícula de uma paciente pela vagina. Agora, testa a eficácia de retirada do órgão pela boca.
No Brasil, um dos grupos mais adiantados nas cirurgias por orifícios naturais é o da Santa Casa de São Paulo. Desde janeiro, eles realizaram 11 operações de remoção de tumores no cérebro usando o nariz como porta de entrada. "É um procedimento bem menos agressivo. Não expõe o cérebro ao ambiente", afirma o neurocirurgião Américo Rubens Leite dos Santos, integrante da equipe.

Na cirurgia, os médicos usam as narinas do paciente. Em uma delas, colocam o endoscópio (uma lente e uma microcâmera) para obter as imagens, enviadas para uma tela. Na outra, inserem os instrumentos (tesouras, pinças, etc.) especialmente desenhados para a operação. E é por esse canal que extraem o tumor. A técnica é indicada apenas para os casos nos quais as células tumorais estão na base do crânio.
Também em São Paulo, o ginecologista Thomaz Gollop, dos Hospitais Albert Einstein e Pérola Byington, faz operações para extrair o útero através da vagina. "Elas custam menos e a paciente tem melhor recuperação", diz. Na opinião de Ricardo Lima, diretor do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, a opção tem tudo para se tornar o futuro das cirurgias. "Precisamos apenas de mais estudos para que isso aconteça", afirma.
Outra tendência que se fortalece é a que preconiza menos e menores cortes na pele. Recentemente, médicos da Universidade do Texas Southwestern (EUA) fizeram a extração de uma vesícula usando apenas um corte, no umbigo, em vez dos quatro tradicionalmente realizados no abdome. "É um pouco mais difícil do que a retirada pela técnica convencional. Mas acredito que os cirurgiões logo aprenderão esse caminho. O paciente terá menos cicatrizes, dor, e voltará muito mais rápido à rotina", disse o médico Esteban Varela, um dos cirurgiões responsáveis pela proeza.