Ilusões/ Casa Daros, RJ/ até 22/2/2015

O provérbio bíblico adverte: “A beleza é uma ilusão e a formosura passageira”. Mas a humanidade sempre fez da beleza um valor soberano e permanente; estrutura de poder, em torno da qual erige seus conceitos e verdades. Pelo menos enquanto dure. A “Bíblia” foi precisa: na história – tanto da arte quanto das sociedades –, a noção de belo não é eterna. Na sociedade contemporânea, a beleza é um valor relativo. E é justamente sobre a relatividade da beleza que se debruça o artista panamenho Humberto Vélez, autor do projeto “Miss Education”, uma intervenção realizada no concurso Miss Panamá.

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INTERVENÇÃO
O artista Luis Camnitzer, júri do concurso Miss Education,
criado por Humberto Vélez

Na semana passada, Vélez esteve no Rio para uma conversa aberta ao público, ao lado do artista Luis Camnitzer e do curador da Coleção Daros Latinamerica, Hans-Michael Herzog. Intitulado “A Ilusão da Beleza”, o evento aconteceu no contexto da exposição “Ilusões”, em cartaz na Casa Daros até fevereiro. “Existem múltiplos tipos de beleza”, diz Vélez à ISTOÉ.

“O que faço é criar performances baseadas em relações humanas. Meu trabalho é conhecer grupos e desenvolver uma obra de arte a partir do conceito de beleza que eles têm.” Antes da intervenção no concurso de miss no Panamá, o artista trabalhou em Londres com lutadores de boxe e nas Ilhas Canárias com fisiculturistas.

O projeto Miss Education já teve duas edições. Em 2013, teve como júri o artista uruguaio Luis Camnitzer, e em 2014 o curador Gerardo Mosquera, que em 2003 trabalhou no Brasil como curador do Panorama da Arte Brasileira do MAM-SP. “O inesperado desdobramento de Miss Education, com as candidatas desejando e se preparando para o título, fez com que a organização de Miss Panamá decidisse manter por tempo indeterminado essa premiação”, conta Vélez.

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CONCEITO
"Landscape as an Attitude" (1979), de Camnitzer, na mostra "Ilusões"

Com a intervenção, o artista traça um paralelo com o mundo da arte e suas estruturas de poder. Desse modo, o concurso está para as premiações de arte assim como o padrão de beleza feminina está para os critérios de legitimação do sistema da arte. “Busco romper os esquemas de poder da arte contemporânea, a fim de incluir novas formas de beleza, com valor e dignidade, por parte de nossos artistas latino-americanos. Só que é um outro tipo de beleza, fundamentalmente sensual”, diz ele.

Da mostra “Ilusões” participam 12 artistas, entre os quais Luis Camnitzer e Teresa Serrano. A artista mexicana, residente entre Nova York e a Cidade do México, apresenta um trabalho que reflete sobre padrões repetitivos, mas não de beleza. “Boca de Tabla” (2008) é um filme psicológico, que fala sobre os níveis de ansiedade e claustrofobia de uma mulher que se movimenta ciclicamente dentro da própria casa, sem poder sair. 

Fotos: Peter Sch lchli; FERNANDO BOCANEGRA; Pedro Agilson