André Sarmento
“Não há nenhuma preocupação com a mudança do secretariado. O governo vai continuar se chamando Mário Covas”
Geraldo Alkmin, governador
de São Paulo

Os 40 anos de vida pública do governador Mário Covas – encerrada às 5h30 da terça-feira 6, depois de dois anos de uma corajosa e sofrida batalha contra o câncer – provaram que não é preciso cobrir-se de lama para exercer a política. O guerreiro revelou-se um mestre, passando esta lição para os que ficam justamente no momento em que a política brasileira se transformou em sinônimo de sujeira. As palavras ética, dignidade e transparência eram repetidas à exaustão durante as 32 horas de velório e homenagens prestadas a Covas, mesmo por aqueles que desconhecem seu significado. “O Mário passou a lição de casa. Agora, vocês têm que repassar adiante”, disse dona Lila, durante o velório, ao ex-governador José Richa, um dos fundadores do PSDB, junto com Covas. O governador do Estado mais rico da Federação foi além do exemplo de retidão por ele deixado. Seu espólio, herdado por Geraldo Alckmin, é valioso. Nos seus 18 meses de gestão, ele terá R$ 7 bilhões para investimentos. Durante seis anos, Covas cumpriu sua missão à frente do Palácio dos Bandeirantes. Saneou o Estado falido, mesmo à custa de sua popularidade. Quando começava a experimentar o doce gostinho dos frutos de sua política austera, caiu doente. “Os médicos não imaginam o bem que a inauguração de uma obra me faz. Passamos anos comendo pedra e pirão de areia”, desabafou o governador, em meados de janeiro, enquanto mostrava suas obras ao amigo e jornalista Márcio Moreira Alves, durante um passeio de helicóptero.

André Sarmento
Lila, pela última vez com Mário no velório…

Nos períodos em que Covas foi obrigado a se afastar do cargo por motivos de saúde, Alckmin já vinha inaugurando obras. Mas o ritmo foi acelerado nos últimos dois meses. “O Geraldo é o homem certo na hora certa. Tem uma porção de inaugurações que eu queria fazer, mas é o Geraldo que vai”, comentou Covas, poucos dias antes de ser internado pela última vez. Mas Geraldinho – como passou a ser chamado pelo padrinho – sempre fez questão de lembrar que estava ali apenas para representar o jogador titular, seriamente contundido. “As obras são do governo Mário Covas”, repetia. E continuarão sendo. Afinal, elas só poderão ser inauguradas por causa da política de ajuste promovida por Covas, reconhecida até mesmo no Exterior, como ficou evidente após a sua morte. Um dos jornais mais prestigiados do mundo, o The New York Times, por exemplo, lembrou que, além de ter sido um dos arquitetos da transição democrática do Brasil, o governador de São Paulo era a imagem do administrador eficiente e honesto. Covas, na verdade, inaugurou a política do aperto de cinto muito antes de a Lei de Responsabilidade Fiscal sair do forno. Não poucos economistas e especialistas em finanças públicas elogiam o pioneirismo do governador. “Ele ajudou a acabar com a mentalidade do gasto irresponsável por parte dos governantes. A política de ajuste que ele implementou é difícil e sacrificada. Apesar do custo à população, ele renegociou, saneou o Estado, que pôde voltar a investir”, opinou o economista e deputado federal Marcos Cintra (PL-SP).