No faroeste caboclo da política nacional, o “xerife” do Ministério Público Luiz Francisco de Souza entrou desarmado no saloon do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado. Ora encolhido na cadeira, ora abrindo os braços sobre o plenário lotado, o procurador da República contou mais uma vez tudo o que viu e ouviu. Confirmou todo o teor da conversa que ele e seus colegas Guilherme Schelb e Eliana Torelly tiveram com o senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) e seu assessor, Fernando César Mesquita, na sede da Procuradoria da República no DF, no início da tarde do dia 19 de fevereiro. Respondeu pacientemente a uma saraivada de quase cinco horas de perguntas, confirmando todo o teor da conversa divulgada por ISTOÉ, inclusive o trecho em que ACM assegura ter uma “lista” com os nomes dos senadores que votaram contra e a favor da cassação de Luiz Estevão, na sessão secreta que levou à perda do mandato do senador. Luiz Francisco descreveu como ACM se divertia ao ridicularizar a senadora Heloísa Helena (PT-AL), que, segundo o senador baiano, teria votado contra a cassação de Estevão. Antes do procurador, os repórteres de ISTOÉ Andrei Meireles, Mino Pedrosa e Mário Simas Filho, autores da reportagem, confirmaram o inteiro teor das conversas divulgadas pela revista. A disposição para contar a verdade parou por aí. Testemunhas, como Luiz Francisco, de uma das maiores armações políticas dos últimos tempos – a tentativa do cacique baiano de usar o MP para espalhar seu arsenal de denúncias e bravatas –, Schelb e Torelly entraram mudos e saíram quase calados. Brandiram o direito ético de não falar uma palavra sobre o conteúdo da fita. Quando abriram a boca, gastaram toda a munição para, a despeito de sua ética pessoal, falar mal do colega.

Ricardo Stuckert/Leopoldo Silva/Ricardo Stuckert
Andrei (acima, à dir.), Mino e Simas (abaixo) reafirmam as reportagens de ISTOÉ na Comissão de Ética e ajudam o Senado a apurar o comportamento do senador Antônio Carlos Magalhães

Com a confirmação de Luiz Francisco, e o silêncio dos outros procuradores, ACM pode ser submetido a um processo de cassação por falta de decoro parlamentar se ficar provado que teve acesso a informações sobre votações sigilosas. Peritos da Universidade de Campinas (Unicamp) estão periciando o painel eletrônico do Senado. Independentemente do que vier a dar essa perícia, ACM pode ser empurrado para a forca da quebra de decoro por causa de outro trecho da fita. Não há nenhuma dúvida de que seu assessor Fernando César Mesquita confidenciou ter vazado para a imprensa o sigilo bancário e fiscal de Luiz Estevão. “Ele só pode ter dado essas informações sigilosas com o conhecimento de ACM”, afirmou o senador Pedro Simon (PMDB-RS). Luiz Francisco também confirmou o que os jornalistas de ISTOÉ reafirmaram: ACM contou aos procuradores que, pegando o ex-

Ricardo Stuckert
“Vocês não podem vir aqui defender os interesses de ACM” Roberto Freire (PPS-PE) para Schelb e Torelly

secretário-geral da Presidência Eduardo Jorge Caldas Pereira, o Ministério Público chegaria ao presidente Fernando Henrique Cardoso. Uma autêntica facada nas costas. A gravação da conversa também foi explicada por Luiz Francisco e pelos jornalistas de ISTOÉ. Um dos dois gravadores usados por Luiz Francisco, deixado em seu gabinete, foi emprestado por ISTOÉ – aquele cuja fita, inicialmente inaudível, foi melhorada mais tarde pelo perito Ricardo Molina, a pedido de ISTOÉ. Outro gravador ficou no bolso de Luiz Francisco — cujas fitas, de boa qualidade, foram ouvidas dois dias depois pelos jornalistas Andrei Meireles e Mino Pedrosa. “Eu gravei o senador por resguardo, para minha defesa”, lembrou Luiz Francisco, que, ao contrário de Schelb, estava preocupado em não ser usado no tiroteio político entre ACM e o PMDB do presidente do Senado, Jader Barbalho. Schelb chegou a dizer que foi ele quem convidou ACM para a conversa, diferentemente do que disse a seu colega. Afilhada de casamento de ACM, que foi correligionário político de seu sogro, Eliana Torelly insistiu que entrou de “gaiata” na história e que apenas cedeu o gabinete para a conversa.


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