Uma das características da cineasta carioca Sandra Werneck – demonstrada tanto nos seus curtas e documentários quanto no seu longa-metragem de estréia, Pequeno dicionário amoroso – é contar histórias de maneira nada linear. Sandra gosta de jogar o espectador num redemoinho de situações e fazer com que ele assista ao filme com uma ligeira sensação de desconforto por não estar aparentemente entendendo um enredo comum, que seria mais compreensível caso fosse descrito de um modo folhetinesco. Em Amores possíveis (Brasil, 2000) – cartaz nacional na sexta-feira 30 –, a diretora radicalizou na sua brincadeira com a linguagem. Como diz o próprio título, a fita joga com as várias possibilidades de amar. São três histórias que podem se interligar, dependendo da interpretação de cada um. Ou então serem completamente distintas, embora todas abordem o tema da eterna dificuldade de relacionamento entre duas pessoas, independentemente do sexo. E são exatamente estas opções que tornam o filme de Sandra Werneck tão atraente.

A diretora toma como ponto de partida um encontro entre Carlos e Júlia, marcado há 15 anos, no qual ela não apareceu. Passado o tempo, acompanham-se três diferentes Carlos – todos interpretados com sobriedade e humor por Murilo Benício – e três Júlias, que tiveram em Carolina Ferraz, uma quase estreante em cinema, o amparo preciso. Na primeira versão, ele está casado com Maria (Beth Goulart). É uma união já sem brilho, desgastada pelo cotidiano, que ganha cor e complicação ao encontrar Júlia. Na segunda, há a transgressão. Carlos abandona a mulher para viver com Pedro, papel de Emílio de Mello, outro ator que empresta concisão e delicadeza sem afetação a três Pedros distintos. Na terceira, ele é um garotão, filho único de dona Sônia – divertidíssima composição de Irene Ravache –, que como todo rebento nesta condição desenvolve certa ligação edipiana a ponto de nunca encontrar a mulher ideal, até se deparar com ela. Na tríade amorosa, Sandra Werneck propõe interseções perfeitamente possíveis. Seja na falta de coragem em relação ao desejo, na ousadia de conviver com as diferenças ou na simples fantasia de um dia encontrar o amor perfeito.