Num mundo ficcional regido pelo endeusamento americano da tecnologia, as séries de detetives exibidas pelo canal pago Multishow, nas quais os policiais se apresentam e são tratados como seres normais, funcionam como um oásis aos cultores do gênero. Algumas delas trazem, inclusive, a figura do comissário, aquele profissional simpático, que serve de ponte entre a autoridade policial e a população, algo impensável para os brasileiros. Todas as séries são produções européias da França, Itália, Inglaterra e Áustria. Navarro – comissário de polícia (sexta-feira, às 22h), Julie Lescaut (domingo, às 20h, e segunda-feira, às 2h30) e Plataforma – nos trilhos da lei (sábado, às 14h30) vêm da França. As duas primeiras são as mais formais. Fica para a terceira introduzir elementos que se aproximam do cinema americano, trazendo as aventuras da sedutora Marie Saint-Georges (Sophie Duez). Mas é nos dois primeiros casos que o espectador se depara com personagens totalmente fora dos estereótipos consagrados pela glamourização da violência.

Não são séries para a molecada. Talvez para os pais interessados em argumentos mais condizentes com o cotidiano – europeu, diga-se, nem por isso menos interessantes para nós. Seus protagonistas têm mais de 40 anos, são charmosos e vivem sozinhos com os filhos. Navarro (Roger Hanin) é o típico mal-humorado parisiense, sempre descabelado e morrendo de medo que o céu lhe desabe sobre a cabeça, ou seja, que a filha de 16 anos durma com o namorado. No caso de Julie Lescaut, a Julie em questão – vivida por Véronique Genest – é uma mulher sofisticada, que leva as filhas pequenas à escola e dá tiros, mas sem perder a pose nos tailleurs bem cortados.

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Zingaretti, o mal-humorado: trapalhadas à siciliana

Bem menos urbano e acostumado a lidar com a bandidagem, o Detetive Montalbano (sexta-feira, às 22h30), personagem do escritor italiano Andrea Camilleri, figura entre os favoritos do público, ao lado de Poirot, de Agatha Christie (domingo, às 21h45, segunda-feira, às 4h, e quinta-feira, às 23h30), série inglesa sem grandes novidades, na qual o detetive belga é interpretado por David Schet. Siciliano e mal-humorado, Salvo Montalbano (Luca Zingaretti) é a transposição mediterrânea de detetives durões como Sam Spade e Philip Marlowe. Só que seu brilhantismo acaba sendo prejudicado pela lerdeza mental de seus colaboradores, provocando situações bem familiares aos brasileiros. Exatamente o oposto do Comissário Rex (de segunda a quarta-feira, às 22h30, e sábado, às 17h), seriado austríaco com humor e racionalismo característicos da sua cultura.

Tal frieza combina perfeitamente com as aventuras ambientadas na austera Viena. Mas acaba se transformando em humor involuntário quando o telespectador percebe que Rex, na verdade, é o cão do inspetor Richard Moser (Tobias Moretti). O cachorro é um enorme pastor alemão, que resolve todos os casos entre uma farejada e outra e passa os dias fazendo traquinagens com os colegas de seu dono. Neste caso, não há efeito especial que supere a graça do ridículo daqueles homens corados rindo feito tontos em torno do animal no fim de cada episódio.