Fotos: José Leomar
Cláudio Cabral se defende: “Foi uma brincadeira”

Está nas mãos de quatro ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) um processo por crime de racismo inédito na história jurídica do STJ. O réu é o colunista social cearense Cláudio Silveira Cabral Ferreira, que, em 21 abril de 1997, na coluna Interfase Cabral, publicada no jornal Tribuna do Ceará, escreveu que “feijoada é comida de músico baiano, negros e índios. Sub-raças, evidentemente.” O comentário foi considerado preconceituoso pelas comissões de Direitos Humanos da Organização dos Advogados do Brasil (OAB-CE) e da Assembléia Legislativa do Ceará. O Instituto Zumbi, o Movimento Negro Unificado e o Grupo Negro do Bairro Jardim Iracema também reagiram. O caso acabou em denúncia criminal no Tribunal de Justiça do Estado. A briga se arrasta por três anos e meio. Agora, Cabral corre o risco de pegar até seis anos de prisão por um fato que ele considera um mal-entendido: “Foi só brincadeira”, afirma. No Tribunal de Justiça do Estado, o juiz Francisco Pedrosa Teixeira aceitou a desculpa do colunista. Na sentença, Pedrosa absolveu o acusado por entender que tudo não passou de uma “galhofa”. Na decisão, o juiz declara que se trata de “uma afirmação de extremo mau gosto”, mas ressalta: “Se feita em mesa de bar, não teria a mesma repercussão além de uma sonora gargalhada dos circunstantes.” Inconformado com a decisão, o promotor Marcus Renan Palácio de Moraes Santos recorreu da decisão ao STJ. Segundo ele, a absolvição não é justificável juridicamente. “O juiz acabou por demonstrar um posicionamento ideológico sobre o caso”, diz Moraes.

O promotor Renan rejeita a decisão da Justiça cearense

O fundador do Instituto Zumbi, braço do Movimento Negro Unificado, Florêncio da Silva, contou que esse é o segundo processo que o colunista responde por crime de racismo. “Em 1994, Cabral escreveu no mesmo jornal sobre ‘o absurdo de atrizes brancas contracenarem com negros parecidos com escravos’.” Segundo Florêncio, que é advogado, esse primeiro inquérito não foi concluído, mas hoje o clima social é outro. “Naquela época, não havia muito espaço para uma mobilização assim. Mas o Estado tem uma dívida com o negro e acredito que chegou a hora de darmos um basta nisso”, acusa.

Os deputados Marcos Rolim (PT-RS) e Nelson Pellegrino (PT-BA), presidente e vice-presidente da comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, enviaram aos ministros do STJ um pedido para que o recurso do Ministério Público do Ceará seja acolhido. No documento, os parlamentares defendem a criação de uma jurisprudência. “Assim, a nossa vasta legislação se tornará efetiva e com maior possibilidade de sucesso no difícil combate à cultura da discriminação racial no Brasil”, argumentam. Cláudio Cabral responde ainda a um processo por exercício ilegal da profissão e falsidade ideológica. Para o presidente do Sindicato dos Jornalistas do Ceará, Paulo Mamede, a medida faz parte de uma luta pela qualidade das mensagens veiculadas, do mesmo modo que a exigência de profissionais de imprensa qualificados, com curso superior em jornalismo. Surpreso, Cabral diz que não esperava tanta repercussão. “Pedi desculpas na coluna seguinte. Foi um deslize.”