Garçom de uma cantina italiana na Lapa, zona oeste de São Paulo, João Luís Almeida Brito servia uma taça de sorvete na noite do sábado 22 quando um estrondo cessou as conversas na casa. “Olhei e vi um carrão virando e dois carros sendo arremessados”, conta Brito, que teve o seu Uno 86 atingido por um dos veículos lançados na colisão. Passava das 11 da noite e, a 30 metros do acidente, cerca de 40 pessoas ocupavam as mesas na calçada oposta. Os clientes da cantina se surpreenderam ao socorrer as vítimas e ver que o motorista do Jeep Cherokee Sport capotado era o comentarista e ex-jogador de futebol Walter Casagrande Jr. Ao seu lado, a namorada, Karine Vasconcellos.

Atendido pelo resgate, o casal foi para o Hospital das Clínicas. Agitado, o ex-jogador exigiu que Karine fosse tratada no hospital Albert Einstein. Quando acompanhava a namorada na ambulância que fazia a transferência, Casagrande sentiu forte sonolência e apagou. Chegou ao Einstein em coma e permaneceu inconsciente por 12 horas, tempo no qual sofreu uma parada respiratória e precisou da ajuda de aparelhos para respirar. Após melhora gradativa, recebeu alta por volta do meio-dia da terçafeira 25. Karine, que fraturou a quinta vértebra cervical, deixou o hospital no dia seguinte. “Não foi constatada nenhuma fratura nem lesão de órgãos internos. Recomendei apenas repouso absoluto”, diz Artur Timerman, médico responsável pelo atendimento.

Segundo o boletim de ocorrência, Casagrande disse aos policiais que tinha tomado tranqüilizantes em virtude de tratamento médico e bebido um pouco de vinho. Também não está descartada a hipótese de falha mecânica, pois o carro do comentarista deveria ter passado por um recall para a correção de um defeito que pode ocasionar perda de dirigibilidade – ainda não se sabe se o reparo foi feito.

Só será possível determinar de fato o que aconteceu quando o laudo do acidente ficar pronto, mas Casagrande tem preocupado amigos e parentes com visitas freqüentes ao hospital. Em dezembro, foi parar na UTI em estado grave, depois de sentir fortes dores no peito e apresentar queda de pressão arterial e arritmia cardíaca. Meses antes, havia sido internado por conta de uma hepatite C. Separado há um ano e meio de sua primeira mulher, com quem tem três filhos, o comentarista vem alternando bons momentos com crises de depressão. Há pouco mais de um mês, pediu licença das transmissões futebolísticas na Rede Globo alegando problemas pessoais.

Nos últimos tempos, Casagrande voltara a fumar, vício que nunca escondeu na época de jogador, quando consumia até dois maços por dia. Ao lado de Sócrates, foi um dos líderes da Democracia Corintiana, movimento em que os atletas do time reivindicaram para si um poder nas decisões tomadas. No auge da popularidade, após a conquista do título paulista de 1982, foi detido e acusado por policiais de portar cocaína. Ele negou e se disse vítima de armadilha da ditadura, que não via a Democracia com bons olhos. Seis meses depois, foi absolvido por falta de provas.

A polícia requisitou a ficha médica dele aos dois hospitais por onde o exjogador passou, para saber se ele estava alcoolizado no momento do acidente. Se comprovado, pode ser indiciado por embriaguez ao volante, direção perigosa (se o laudo mostrar que ele estava em alta velocidade) e por expor a vida de outras pessoas a risco. Casagrande não tem antecedentes criminais e, segundo o delegado Renato Ferreira, responsável pela investigação, será convocado para depor na próxima semana.