A milionária disputa entre o grupo Opportunity e a poderosa Telecom Italia chegou ao tribunal de Londres, a corte civil internacional temida mundialmente em razão das severas penas que costuma aplicar aos investidores espertalhões de todo o planeta. O motivo da briga é nacional. Trata-se da compra da antiga Companhia Riograndense de Telecomunicações (CRT), adquirida pela Brasil Telecom em 14 de julho do ano passado. O Opportunity, a Telecom Italia e alguns fundos de pensão são sócios da Brasil Telecom Participações, que alega ter adquirido a companhia telefônica gaúcha por um valor superfaturado em pelo menos US$ 100 milhões. Os sócios brasileiros sustentam que o prejuízo foi provocado pelo parceiro italiano e tentam agora um ressarcimento. No primeiro semestre de 2000, depois de várias reuniões, a Brasil Telecom e a Telefônica da Espanha (que vendeu a CRT) haviam sacramentado as bases do negócio, que envolveria no máximo US$ 730 milhões. No entanto, sem informar os demais sócios, o presidente da Telecom Italia, Roberto Colaninno, fez um acerto com os espanhóis prometendo pagar US$ 850 milhões pela CRT. Ou seja, o comprador agiu de forma a favorecer o vendedor, prejudicando seus próprios sócios. A princípio a negociação ficou interrompida, mas no final a Brasil Telecom acabou fechando o negócio por US$ 800 milhões, para evitar que o governo brasileiro cassasse a concessão da Telefônica da Espanha e a CRT fosse a leilão. “Vocês são os responsáveis pelos danos que advirão à companhia”, advertiu o advogado Modesto Carvalhosa, presidente do Conselho de Administração da Brasil Telecom, em carta destinada à Telecom Italia 16 dias antes de ser fechado o negócio.

A decisão da Brasil Telecom de levar a briga para um tribunal internacional teve repercussão imediata na mídia italiana. É que, apesar de o artigo 9.2 do acordo de acionistas da Brasil Telecom prever que os casos de controvérsia sejam analisados pelo tribunal de Londres, não é comum investidores internacionais chegarem a esse ponto. Trata-se de uma instância judiciária que os empresários evitam por causa da intensa repercusão dos julgamentos naquela corte. A imagem de Colaninno, porém, já está comprometida. Na Itália, há quem afirme que o empresário já providencia um endereço em Miami (EUA), para onde deve se mudar quando deixar o comando da Telecom. O empresário estaria de olho em uma casa vizinha à do espanhol Juan Villalonga, ex-diretor da Telefônica da Espanha, com quem Colaninno superfaturou a transação da CRT. Acusado de gerir a empresa priorizando os próprios interesses em detrimento dos demais sócios, inclusive do Estado italiano, segundo maior acionista da Telecom Italia, há três meses Colaninno está na mira de promotores de Turim. Os negócios nebulosos no Brasil não se esgotam na compra da CRT. Um outro caso que poderá ser analisado pelos promotores italianos é a compra de 30% do capital da Globo.com. Nessa transação, Colaninno investiu US$ 810 milhões em um negócio que meses depois perdeu 80% de seu valor. “Foi investido 1,7 trilhão de liras em uma sociedade que não é cotada em Bolsa de Valores e não figura nem na lista dos maiores provedores do Brasil”, registrou o Il Giornale do domingo 8.

Devassa – Há duas semanas, agentes da polícia federal italiana, comandados pelo promotor Bruno Tindi, revistaram escritórios e até residências de dez diretores da Telecom Italia. “Recolhemos diversos documentos que serão analisados”, disse Tindi, e acrescentou que falta pouco para haver indiciamentos. Entre a papelada encontrada na devassa, destacam-se alguns relatórios que apontariam irregularidades até então desconhecidas da Justiça italiana, entre elas a provável prática de suborno envolvendo transações feitas na Turquia e no Brasil. Na terça-feira 10, o banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity, embarcou para a Itália. Em sua agenda estavam previstos encontros com investidores e autoridades financeiras. Os promotores não descartam a possibilidade de aproveitar a presença do brasileiro no país para ouvi-lo sobre detalhes da conduta da Telecom Italia em relação aos demais acionistas nos negócios mantidos no Brasil.

As suspeitas contra Colaninno são antigas, mas se fortaleceram em 1999. Naquele ano, ele foi o mentor da aquisição da maioria das ações da Telecom Italia pela Olivetti. O problema é que a maior acionista da Olivetti é a Hopa, empresa também comandada por Colaninno. Uma outra transação que está na mira da Justiça italiana é a compra da Seat Pagine Gialle, empresa de catálogos telefônicos, feita pela Telecom. A suspeita é a de que o próprio Colaninno tenha sido o maior favorecido em toda a operação. Nesse imbróglio, o que se tem de concreto até agora é que tanto as ações da Telecom como as da Olivetti estão em queda vertiginosa, o que alimenta as especulações sobre o afastamento de Colaninno. Segundo os advogados da Telecom, a queda das ações das empresas está relacionada à divulgação das investigações feitas pelos promotores de Turim e à forma como Colaninno dirige seus negócios.