Ricardo Giraldez
Viagens levaram a empresária Keila a optar por curso a distância

Primeiro, foram os cursos por correspondência. Depois, o ensino pela televisão e rádio. A terceira geração do ensino a distância, que conta com a internet como principal aliada, está apenas começando, mas já provoca uma disputa no meio acadêmico. Trata-se de uma briga virtual envolvendo as principais instituições de ensino superior do País. O eterno embate entre o ensino público e o privado agora inclui a internet. No dia seguinte ao lançamento da Unirede, primeira universidade virtual pública do País, com a participação de 63 instituições de ensino superior, um outro consórcio de dez faculdades privadas comemorou a aula inaugural da universidade virtual brasileira (Uvb.br). É uma corrida contra o tempo. Os cursos de graduação online, gratuitos ou pagos, só estarão disponíveis a partir do segundo semestre de 2001, mas o que já está em jogo é o modelo de universidade virtual que tomará conta do País. “Neste momento está sendo definido o DNA do ensino a distância. Há uma luta do público contra o privado. O primeiro modelo vai capitalizar para si os recursos existentes”, avalia Dóris Faria, decana da Universidade de Brasília e presidente do Comitê Gestor da Unirede. A disputa, na verdade, se dá pelo conteúdo do ensino virtual. É certo que outros países já estão bem mais avançados no que diz respeito a esse tipo de ensino e também bastante animados com a possibilidade de exportarem seus cursos para países como o Brasil. E do ponto de vista do setor empresarial, a tradução de cursos custaria muito mais barato do que a criação de um conteúdo próprio.

Helcio Nagamine
Vianney era da Unirede e foi para a área privada: “Essa idéia não tem dono”

Cursos de extensão – Ainda que o ensino superior a distância não conte com a simpatia de todo o meio acadêmico, uma coisa é certa: a universidade virtual já é uma realidade. São milhares de alunos matriculados em cursos de especialização universitária online e outros milhares aguardando a abertura de cursos de graduação. A partir de outubro deste ano, os dois consórcios, o público e o privado, colocarão no ar seus primeiros cursos de extensão. As coincidências entre os dois vão além da agenda. A começar pelo nome. A pública atende pelo nome de Universidade Virtual Pública do Brasil, a Unirede, e a privada foi batizada de Universidade Virtual Brasileira, a Uvb.br. O diretor-executivo da segunda, João Vianney, até abril deste ano era da Unirede e participou ativamente da sua criação. “Essa idéia não tem dono. O mundo inteiro está vivendo esse fenômeno. Queremos compartilhar tecnologias e conquistas. Quem tem a ganhar é a educação brasileira”, defende Vianney. Ele garante que as universidades privadas estão preocupadas com a qualidade. “Os cursos importados podem ter excelente conteúdo, mas não têm a didática para atender o aluno brasileiro. Estamos empenhados em produzir conteúdo próprio”, afirma. O ministro da Educação, Paulo Renato Souza, disse que o MEC não entrará na disputa e pretende criar uma biblioteca pública virtual para ser usada pelas áreas pública e privada.

A preocupação dos professores do ensino público, porém, vai além da disputa pelo mercado interno. Até porque as necessidades brasileiras nesse campo são de proporções oceânicas. Basta recorrer aos números para se ter uma idéia. O primeiro curso de extensão da Unirede, o TV-Escola (com o objetivo de capacitar professores para o uso de novas tecnologias em sala de aula), excedeu em muito o número de vagas disponíveis na rede. Foram mais de 170 mil inscrições para 30 mil vagas.

Leopoldo Silva
“Neste momento está sendo definido o DNA do ensino a distância. Há uma luta do público contra o privado” Dóris Faria, presidente do Comitê Gestor da Unirede

Novas tecnologias – Privado ou público, o modelo de ensino virtual que se desenha está longe de substituir o tradicional. Para credenciar um curso a distância, o Ministério da Educação exige que ele também seja oferecido do modo tradicional e que pelo menos as provas finais sejam feitas ao vivo. Além disso, existe todo um corpo de tutores e monitores que vão acompanhar o desempenho de cada aluno ligado à rede. “A experiência da Inglaterra com a Open University mostra que o ensino a distância pode ter excelente qualidade. Nesse primeiro momento da universidade virtual, o benefício maior será a incorporação de novas tecnologias na universidade tradicional”, acredita o ministro Paulo Renato.

Os primeiros cursos de graduação só vão ganhar vôo a partir do ano que vem, mas as experiências na área de extensão e especialização são animadoras. Desde 1998, a Universidade Virtual do Centro-Oeste (filiada à Unirede) oferece cinco cursos nas áreas de educação, turismo e saúde. Iniciativas como essa já foram testadas em quase todos os Estados. E há quem, mesmo no Japão, esteja matriculado num curso daqui. É o caso da estudante Michelle Maruyama, de 24 anos, que mora no outro lado do mundo há três anos e faz o curso de extensão em moda pela faculdade paulista Anhembi-Morumbi, associada ao consórcio privado. Sua “colega” de curso, a empresária Keila Queiroz, mora em São Paulo e também optou por um curso a distância porque viaja muito. “Nunca fiz um curso tão sério. O esquema de aulas é criterioso, as provas são bem feitas e há uma preocupação com cada aluno”, garante Keila.