Cerco fechado: Natalie Howson, da Australian Sports Drug Agency: exames de sangue para detectar novas drogas

É uma guerra desigual. De um lado, laboratórios e seus clientes em potencial: atletas dispostos a tudo para melhorar de modo “mágico” seus desempenhos, técnicos interessados no sucesso de seus pupilos, dirigentes esportivos pouco éticos pensando em obter mais medalhas e prestígio para seus países. Do outro, correndo atrás para detectar remédios e métodos antidoping, os médicos do Comitê Olímpico Internacional (COI), em busca da preservação dos atletas. O campo de batalha, desta vez, será Sydney, sede dos Jogos Olímpicos de 2000. A Austrália, desde 1990, considera crime o uso de drogas no esporte. E vem realizando um trabalho cada vez mais rigoroso de detecção prévia do doping. “A investida dos australianos, com milhares de exames antidoping, foi altamente positiva. Muita gente deve ter desistido de dopar-se, ou até de competir aqui, sabendo que poderia ser apanhado a qualquer momento pelo COI ou pelos australianos”, afirma o médico brasileiro Eduardo de Rose, membro da Comissão Médica do COI e uma das maiores autoridades mundiais no combate às drogas no esporte.

De Rose costuma dizer que o doping jamais será totalmente eliminado, mas o objetivo é criar formas rígidas para diminuir o espaço dos infratores. De fato, o cerco nunca esteve tão fechado. Na Austrália, o órgão responsável pela ofensiva é do governo, a Agência Australiana de Drogas no Esporte (Asda), que contabiliza, desde 1990, nada menos que 30 mil testes de doping realizados em atletas – australianos ou estrangeiros – praticantes de todo tipo de esporte. “Fizemos tudo para que os Jogos de Sydney sejam os mais limpos possíveis”, afirma Natalie Howson, diretora-executiva da Asda. Nos últimos 15 meses, até o dia 2 de setembro, quando o COI assumiu o comando dos testes nos atletas olímpicos, aproximadamente sete mil atletas foram testados. Poucos foram fisgados, a maior parte em esportes não-olímpicos como o fisiculturismo e o rugbi.

Eduardo de Rose,
o brasileiro da comissão antidoping: investida

Todos esses testes foram de urina e buscavam detectar os principais vilões do doping, como os esteróides anabolizantes, que aumentam a massa muscular e a força, os estimulantes e novidades como os beta-bloqueadores, que reduzem os batimentos cardíacos e são usados em esportes como o tiro, o arco e flecha e os saltos ornamentais, onde a concentração do atleta é fundamental. Todo o aparato tecnológico, no entanto, não conseguia detectar a nova estrela do doping, a Eritropetina (EPO), medicamento usado originalmente por doentes renais para aumentar a produção de glóbulos vermelhos. O mundo esportivo foi apresentado à EPO pela primeira vez nas Olimpíadas de Inverno de 1988.Os esquiadores soviéticos surpreenderam ao conseguir várias medalhas batendo, nas provas de longa distância, os noruegueses, de quem eram fregueses de caderneta nas competições internacionais. “Sabíamos que havia alguma coisa errada. Ninguém melhora o desempenho tão rápido. O problema era descobrir qual a artimanha usada”, recorda De Rose. A primeira coisa que os especialistas do COI descobriram foi o uso da EPO. Aumentando a produção de glóbulos vermelhos, o atleta aprimora a capacidade de transportar oxigênio no sangue para os pulmões, ganhando fôlego extra em provas de fundo. Depois de muita pesquisa, foi descoberto um teste capaz de detectar a EPO, colocada como droga proibida já nos Jogos Olímpicos de 1992. “A Austrália faz exames de sangue nos atletas para detectar o uso da EPO. Só faltava o método ser aprovado pelo COI, o que felizmente aconteceu agora”, comemora Natalie Howson. Preocupados em ter uma equipe olímpica livre do doping, a Asda decidiu testar todos os integrantes do time australiano.

Esses exames prévios envolveram até os brasileiros que estão fazendo os treinos finais no Instituto Australiano do Esporte (IAE), em Canberra. Quatro judocas e quatro nadadores do Brasil foram examinados na semana passada. A adoção dos testes antidoping ao longo do ano, a maior eficácia dos exames e a aprovação dos testes de sangue devem ter, no mínimo, assustado uma boa parte dos que se dopavam e pretendiam continuar com a prática. Na quarta-feira 6, o Comitê Olímpico chinês comunicou aos australianos o corte de 27 atletas que “não foram aprovados em testes”, entre eles sete remadores que tinham sido anteriormente flagrados com EPO. Mas há uma nova vedete na área: o uso do hormônio de crescimento para aumentar a massa muscular. Como a substância é natural, não aparece nos exames. A luta não acaba.


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