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"Meu amor, você é lindo, maravilhoso! Nota 10. Vai para o trono.” Esta era uma espécie de mantra recorrente que Elke Maravilha, jurada fixa dos programas de calouros de Silvio Santos e Chacrinha, dirigia às figuras geralmente bem simples que se dignavam, muitas vezes, a serem humilhadas por outros jurados mais sisudos ou pela situação em si nos populares programas de auditório das décadas de 1970 e 1980 da televisão brasileira.

Sempre muito “montada”, algo entre uma vedete e uma drag queen, invariavelmente ostentando extravagantes adornos de cabeça, maquiagem carregada e roupas exóticas e fantasiosas, sua figura exuberante e carnavalesca tinha uma única mensagem: a paixão  profunda pelo povo brasileiro e pela cultura popular manifesta nas suas falas amorosas aos calouros dos programas.

A grande surpresa para um público mais desatento e menos informado é que Elke, nascida Elke Georgievna Grunupp e que ficou nacionalmente conhecida como a jurada “maluquete”, desbundada e deslumbrante, é uma mulher com inteligência notável e com uma experiência de vida única. Nascida na Rússia, chegou com a família ao Brasil aos 6 anos fugindo dos horrores da Segunda Guerra Mundial. Até os 20 anos morou com os pais em sítios na zona rural de Minas Gerais, onde foi criada junto com os trabalhadores do campo. Seu espírito independente a levou a mudar-se sozinha para o Rio de Janeiro, onde trabalhou como secretária bilíngue, bibliotecária e professora de latim, francês e inglês. Desde a adolescência já falava nove línguas: russo, português, alemão, italiano, espanhol, francês, inglês, grego e latim. Fez um ano de medicina, formou-se em letras clássicas e fez mais dois anos de filosofia. Linda, de cabelos loiros naturais, altíssima e com muita personalidade e estilo, não demorou muito para entrar para o mundo da moda, tornando-se uma das modelos preferidas dos grandes costureiros da época. Durante a ditadura militar, foi presa por bradar contra oficiais em protesto contra o desaparecimento de Stuart Angel Jones, filho da estilista Zuzu Angel, torturado e morto na Base Aérea do Galeão.

Elke, do alto da alegria e da sabedoria nos seus quase 70 anos, tem muito a dizer e foi uma das grandes atrações da terceira edição do evento “Casa TPM”, despontando num line-up repleto de filósofos, psicólogos e outros pensadores numa conversa interessantíssima sobre estilo, moda e liberdade com o estilista Dudu Bertholini, que a tem como uma de suas musas inspiradoras.

“O Ney Matogrosso, o Dzi Croquettes e a Elke abriram portas no Brasil, dando uma lição de respeito à individualidade. Deram um basta nessa coisa de meninos se vestirem de azul e meninas, de cor-de-rosa.”

Num momento em que a TV e a mídia buscam a reinvenção com  fórmulas que possam misturar as exigências de popularização dos conteúdos com a necessidade de se entregar algo um pouco mais consistente, Elke poderia ser uma das chaves para destravar a mente embotada dos telespectadores e internautas em geral.