Reeleito com 55% dos votos depois de largar com apenas 4%, o governador do Rio defende que o seu partido tenha candidato próprio à Presidência da República em 2018

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NOVO GOVERNO
O governador reeleito promete retribuir a votação
que recebeu: "Vou trabalhar muito"

 

Chamado de poste pelos adversários, quando no início do ano patinava em torno de 4% nas pesquisas de intenções de voto para a sucessão do ex-governador fluminense Sérgio Cabral (PMDB), de quem era vice, Luiz Fernando Pezão, 56 anos, venceu a disputa no Rio de Janeiro alcançando 55,78% dos votos válidos. Em entrevista à ISTOÉ, Pezão atribui a virada ao crescimento da avaliação do governo durante o horário eleitoral e ao fato de ter conseguido unir as lideranças do interior do Estado em torno de sua candidatura. “No segundo turno, tive apoio de 88 prefeitos entre 92”, lembrou.

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"O Beltrame falou que precisa de 60 mil policiais. As UPPs, a partir de agora,
serão bem menores. Mas temos que reforçar os batalhões"

 

 

A estratégia de relacionar o adversário Marcelo Crivella (PRB) à Igreja Universal também se mostrou bem-sucedida na reta final da eleição. “As pessoas não lembravam que o Crivella é sobrinho do bispo Edir Macedo. Ele chegava a ter 75% em algumas denominações evangélicas, e caiu para 50 e poucos pontos percentuais. Também registrou queda acentuada entre as outras religiões”. O governador reeleito dedicou a vitória ao padrinho político Sérgio Cabral, que, segundo ele, deverá dar um tempo na política e voltar a exercer a função de jornalista, profissão na qual é formado. Ao falar sobre a futura gestão, Pezão diz que José Mariano Beltrame não deverá deixar o comando da Secretaria de Segurança Pública nem o projeto das UPPs, que criou e executou. “Segurança Pública é minha prioridade”, afirmou. Ao discorrer sobre o fortalecimento do PMDB nessas eleições, Pezão defendeu a candidatura própria do partido em 2018.

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"Cabral quer descansar um pouco da política. Sete anos comandando
o Estado do Rio não é fácil. Mas ele se dará bem em
qualquer caminho que escolher"

ISTOÉ

 Como o sr. conseguiu virar o jogo eleitoral, depois de largar com apenas 4% nas pesquisas? 

 
Luiz Fernando Pezão

 Estávamos em um momento ruim do governo, mas tínhamos obras, boas políticas públicas para mostrar. O governo  subiu na avaliação durante o horário eleitoral. As pessoas viam as realizações, como as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs). Sabíamos que tínhamos que melhorar, mas sabíamos também que tínhamos o que mostrar. A minha avaliação cresceu muito durante o horário eleitoral, e sinalizava que eu poderia subir muito,  apesar de eu nunca ter concorrido a uma eleição majoritária e de não ser amplamente conhecido pela população. Mas fui prefeito (de Barra do Piraí, no sul fluminense, entre 1997 e 2004), fui presidente da Associação dos Prefeitos por seis anos, participei de movimentos municipalistas, e isso ajudou muito. No segundo turno, tive apoio de 88 prefeitos entre 92.  Consegui unir quase todo o interior em torno de minha candidatura.

 
ISTOÉ

 Qual foi a estratégia adotada para o sr. se tornar conhecido no Estado?

 
Luiz Fernando Pezão

 Tenho facilidade de me relacionar com as pessoas. É um ativo meu. Mas a tarefa de me tornar conhecido não foi fácil. Uma história ilustra bem o quanto eu era desconhecido pela população no início da campanha. Um namorado de uma amiga minha, professor de ensino médio no bairro Saúde (zona Central do Rio), me contou que perguntou aos alunos, cerca de 20, entre março e abril, qual era o nome do governador do Rio. Eles disseram: Sérgio Cabral. O professor corrigiu, dizendo que o Cabral tinha saído. Aí, um deles disse: ‘É verdade, agora quem governa o Rio é o Sapatão’. Aí ele corrigiu: ‘Não é Sapatão, é Pezão’.  O trabalho foi árduo. Mas conheço e me relaciono com muita gente das 92 cidades do Estado. Estou na estrada há 32 anos, fui vereador por uma década e prefeito duas vezes. Isso é um ativo numa eleição acirrada. Nas cidades em que perdi, as margens são muito pequenas, em torno de 300 e 500 votos. Na Baixada, concorrendo contra Anthony Garotinho, Marcelo Crivella e Lindberg Faria, que se uniram no segundo turno em torno do meu adversário no segundo turno (Crivella), perdi  por apenas 20 mil votos. É muito pouco. Considero um empate técnico. Ou até vitória mesmo. A Baixada tem lugares onde a Igreja Universal do Reino de Deus tem vários templos. Belford Roxo e São João de Meriti, por exemplo, têm, cada um, cinco templos da Universal – lembrando que Crivella é bispo.

 
ISTOÉ

 No segundo turno, o sr. fez questão de relacionar o seu adversário, Marcelo Crivella, à Igreja Universal. Dessa forma, a rejeição a ele aumentou. Vocês tinham pesquisas qualitativas que mostravam isso?

 
Luiz Fernando Pezão

 Sim. E as pessoas não lembravam que o Crivella é sobrinho do bispo Edir Macedo. Então, foi bom para mim dar uma lembrada. Ele chegava a ter 75% em algumas denominações evangélicas, e caiu para 50 e poucos pontos percentuais. Também registrou queda acentuada entre as outras religiões. Mostra que a iniciativa de relacioná-lo à Universal deu certo e foi importante que as pessoas soubessem disso.

 
ISTOÉ

 O movimento chamado Aezão, junção de seu nome com o do candidato à Presidência Aécio Neves (PSDB), atrapalhou sua relação com a presidenta reeleita, Dilma Rousseff (PT)?

 
Luiz Fernando Pezão

 Atrapalhar sempre atrapalha, mas quem saiu da minha coligação foi o PT. E entrou o PSDB, que me deu três minutos de TV, e eu precisava muito desse tempo no horário eleitoral. Juntando com os minutos do DEM e do PPS, conseguimos fazer um bom programa e isso se tornou fundamental. Mas meu relacionamento com a presidenta reeleita, Dilma Rousseff, é extraordinário, e ela está muito grata porque ganhou no Rio.

 
ISTOÉ

 Como fica, agora, a relação entre o PMDB e o PT no Rio?

 
Luiz Fernando Pezão

 Tenho um ótimo relacionamento com os parlamentares do PT, tanto que cinco dos seis deputados estaduais me apoiaram, além de alguns federais.

 
ISTOÉ

 O PMDB saiu muito forte dessa eleição. Terá candidato próprio em 2018?

 
Luiz Fernando Pezão

 Sim, o partido saiu fortalecido e eu acho que, se serve para dar governabilidade ao País, o PMDB serve para governar o País. Pode almejar a Presidência, sim. Em 2018, acho que o PMDB deve ter candidato próprio. Chegou a hora.

 
ISTOÉ

 O sr. está para ter uma audiência com a presidenta Dilma e foi noticiado que levará uma enorme lista de pedidos.

 
Luiz Fernando Pezão

 Não vou levar lista grande. Sei que é um ano difícil, e ela já me deu muita coisa. Já liberou dinheiro de empréstimo para botar água em toda a Baixada Fluminense, destinou verba para urbanização de favela e para a construção das linhas 3 e 4 do metrô.  Apesar de ter meu São Pidão (imagem dada por uma freira há muitos anos e que fica em cima de sua mesa de trabalho), não vou ficar lá pedindo sempre.  

 
ISTOÉ

 O que o sr. estabelece como prioritário?

 
Luiz Fernando Pezão

 Segurança pública é minha prioridade.  Também quero alavancar o projeto PPP (parceria público- privada), para instalar a banda larga em escolas e nos postos de saúde. É um sonho meu.

 
ISTOÉ

  José Mariano Beltrame continuará à frente da Secretaria de Segurança Pública?

 
Luiz Fernando Pezão

 Hoje (quarta-feira 29), tive a primeira conversa com ele, e pedi muito que fique. Acho que vai ficar, sim. Um dos argumentos que usei foi uma matéria da ISTOÉ  (“Em áreas com UPPs, garanto que pode fazer campanha”, de 29 de agosto). Eu disse a ele: “Beltrame, você falou naquela entrevista que continuaria se eu fosse eleito governador. Eu fui, pô! Agora a bola é sua.”  Eu recomendei a ele que descansasse um pouco, uns 10, 15 dias, e ele concordou. Tenho certeza que voltará renovado.   

 
ISTOÉ

 Segundo o Instituto Pereira Passos, em 2012 tivemos quase seis mil pessoas desaparecidas no Rio, muitas delas vítimas da polícia, como o pedreiro Amarildo de Souza, (torturado e morto na UPP da favela da Rocinha, ano passado). Como o sr. pretende enfrentar essa questão?

 
Luiz Fernando Pezão

 Nós tínhamos 30/40 ‘Amarildos’ por dia onde o tráfico estava. Pelo menos, a delegacia de homicídios pôde entrar nessas comunidades, como a Rocinha (zona sul) e fazer de 30 a 60 perícias lá dentro. Quero investir muito em monitoramento, com câmeras, para ajudar a diminuir ao máximo a possibilidade de casos como esse se repetir. No complexo do Alemão (zona norte) e na Rocinha, temos, em cada uma, cerca de 700 e 800 policiais. Claro que é um absurdo a morte do Amarildo, mas temos uma tropa de 49 mil policiais, e toda a tropa não pode ser julgada por uma parte menor. Ninguém cortou na carne como nós. É um processo e vamos  avançar cada vez mais. Não vamos tolerar policiais com esse tipo de formação indequada. Vou acabar com a polícia bandida.

 
ISTOÉ

 O Rio tem 38 UPPs. Quantas mais ainda serão instaladas e onde? 

 
Luiz Fernando Pezão

 Vamos ver as necessidades que o Secretário de Segurança determinar. Beltrame e o Roberto Sá (subsecreatário) já me apresentaram um plano de UPPs, de companhias destacadas, de reforço de batalhões e de número de policiais que eles precisam. O Beltrame falou que precisa de 60 mil policiais. As UPPs, a partir de agora, serão bem menores, com menos policiais, porque os grandes complexos de favelas já receberam as unidades necessárias. Mas temos que reforçar os batalhões. Estamos formando mais soldados, vamos reforçar as UPPs atuais e lutar para que esse projeto seja política de Estado, para que não aconteça o mesmo que aconteceu com os Cieps (Centros Integrados de Educação Pública, criados nos dois governos de Leonel Brizola/PDT 1983-1987 e 1991-1994), que foram descontinuados no governo seguinte, de Moreira Franco (PMDB, 2007 a 2014). Foi um grande erro. Se tivéssemos os Cieps com alunos em horário integral, estudando, comendo e praticando esportes, não teríamos, hoje, tantos bandidos como temos. 

 
ISTOÉ

 Vai ter teleférico na Rocinha?

 
Luiz Fernando Pezão

 Sim. Vai ter teleférico e saneamento na Rocinha. Exploraram muito esse assunto dizendo: ‘Ah, vai ter teleférico em um lugar sem saneamento’. Isso foi exploração política. O teleférico também é necessário para muita gente subir e descer lá do alto do morro. E no projeto está incluído, além do saneamento, também a abertura de avenidas, a retirada de moradias da área de risco, a construção de apartamentos. Tudo isso foi aprovado e discutido pelos moradores.

 
 
ISTOÉ

 O sr. dedicou a vitória ao antecessor Cabral, que, agora, está sem mandato e sem trabalho. O que acontecerá com ele? 

 
Luiz Fernando Pezão

 Acho que vai cuidar da vida, ficar do outro lado do balcão, vai à forra da gente – ele é jornalista, não é? Deve exercer a profissão. Mas ele quer descansar um pouco de política, sete anos comandando o Estado do Rio não é fácil. O Sérgio se dará bem em qualquer caminho que escolher.

 
ISTOÉ

 O Rio teve um altíssimo índice de votos brancos, nulos e abstenções (35,8%). O que o sr. achou disso?

 
Luiz Fernando Pezão

 Lamento, muito triste, muito ruim. Mas o dever do gestor público é ganhar credibilidade das pessoas, mesmo de quem está sem esperança. Vamos trabalhar nessa direção. Sou otimista. Saí de Barra do Piraí e cheguei a governador reeleito, contra Garotinho, Crivela, Lindberg e a Igreja Universal. Tenho que ser muito otimista, retribuir a votação e o carinho. E trabalhar muito.