A exportação de cientistas do Brasil para o Exterior sempre foi um desafio para a tecnologia e a comunidade acadêmica nacional. Nos últimos dez anos, o Brasil se transformou no maior exportador de cientistas da América Latina. “A perda de um grande número de pesquisadores é consequência do sucateamento das universidades públicas”, sustenta o vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Marco Antonio Raupp. Mesmo sucateada, a universidade investe recursos públicos na formação de muitos especialistas que, em seguida, abandonam o País. O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) decidiu tomar uma dura medida a fim de impedir que um país carente de recursos para a educação como o Brasil continue a financiar laboratórios europeus e americanos com recursos humanos. Os bolsistas de pós-doutorado e de outros estágios de especialização que não retornarem ao País após os cursos no Exterior terão de devolver os gastos do governo com as passagens aéreas e as mensalidades. Para o presidente do CNPq, Evandro Mirra, a medida se tornou necessária porque “aumentou a pressão de países ricos sobre os cérebros brasileiros”.

A iniciativa tem o apoio da cientista Marília Zaluar Passos, que embarcou esta semana para fazer pós-doutorado em neurobiologia na Universidade da Califórnia. “A indenização é justa porque o investimento é feito na formação de quadros para a ciência brasileira”, concorda Marília. Ela foi para a Califórnia graças a um intercâmbio mantido pelo CNPq com uma fundação americana, a Pew Charitabel Thrust. Viajou com a garantia de um apoio de US$ 35 mil para instalar, após sua volta ao Brasil, um laboratório com equipamentos americanos. Se no fim do curso ela decidir permanecer nos Estados Unidos, além de perder o dinheiro oferecido, terá de indenizar o CNPq. A exigência da devolução foi decidida pelo governo ao constatar a permanência de centenas de ex-bolsistas do Brasil no estrangeiro. Marco Antonio Raupp admite haver mais de mil especialistas brasileiros em instituições no Exterior.

Carlos Magno
Na Uni-Rio, o professor Hans Dohmann criou projeto que ajuda a manter especialistas: renda de R$ 500 mil

O Brasil tem hoje um déficit de 25 mil pesquisadores, segundo cálculos de Raupp. Só na área de saúde americana havia 30 pesquisadores brasileiros em 1998, apesar da notória carência de profissionais especializados no setor no Brasil. O salário inicial de um profissional que fez pós-doutorado no Brasil é de R$ 2,5 mil. Nos Estados Unidos, é o dobro. O presidente da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), Eduardo Gouvêa Vieira, calcula que, nos últimos cinco anos, o Brasil perdeu mais de 200 cientistas. Enquanto as universidades públicas não recebem os recursos previstos pelo Fundo Anual para a Ciência (o total será de R$ 1 bilhão), o País enfrenta dificuldades. Na Europa, estão especialistas como Guido Pesoti, responsável pelos projetos de aviões que transformaram a Embraer na quarta empresa do ranking mundial de fabricantes de aviões civis. Para os Estados Unidos foram, entre outros, o pesquisador Edson Albuquerque, premiado com US$ 2,4 milhões por pesquisas sobre o mal de Alzheimer, e Beatriz de Avillez Rocha, que faz estudos sobre dependência química.

Rosane Marinho
Parceria reforça pesquisas sobre combustível alternativo na UFRJ

As parcerias entre as universidades federais e as empresas privadas são um caminho para levantar recursos a fim de manter os cientistas no território nacional, sugere o presidente da Federação das Indústrias de São Paulo, Horácio Lafer Piva. Esse tipo de parceria reforçou em R$ 10 milhões o orçamento da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Vinte por cento dos recursos aplicados em pesquisas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) são resultantes de acordos com o setor privado, mecanismo também adotado pela Universidade Federal de Minas Gerais. A Universidade de São Carlos, primeira do ranking de excelência das federais, tem 800 parcerias. Mas as pesquisas feitas sob encomenda de empresas privadas não são o único caminho para o reforço de caixa das universidades. Na Uni-Rio, o professor Hans Dohmann criou um projeto para um centro cultural capaz, segundo ele, de arrecadar R$ 500 mil anuais. A Universidade Federal de Pernambuco assinou acordos com empresas como a Siemens e a Microsoft. Essas iniciativas têm conseguido reduzir a penúria financeira das universidades, mas ainda se mostram insuficientes para garantir a permanência dos cientistas no País. Poucas são as exceções, como a Coordenação de Pós-graduação em Engenharia da UFRJ, que assinou um contrato com a Renault, no valor de US$ 1 milhão, para o desenvolvimento da tecnologia de hidrogênio como combustível alternativo.