Dono de um império de jogatina e indiciado pela CPI do Narcotráfico, o presidente da Assembléia Legislativa do Espírito Santo, deputado José Carlos Gratz (PFL), está fazendo a sua maior aposta: botou todas as fichas na tomada do governo do Estado. Gratz aproveitou as investigações da CPI da Propina, que está atingindo a administração do tucano José Ignácio Ferreira, para forçar o governador a entregar-lhe o comando das finanças e da área de segurança pública. José Ignácio resiste à pressão e não promoveu as mudanças exigidas por Gratz. Foi o suficiente para o presidente da Assembléia jogar mais pesado: depois de fechar um acordo com o vice-governador Celso Vasconcelos (PSDB), ele anunciou o rompimento com José Ignácio. Com controle absoluto da Assembléia, passou a articular a destituição do governador. “Não posso comungar com as vastas irregularidades que aparecem no dia-a-dia. Ocupo a segunda posição no Estado, sei o que pode vir a ocorrer e não quero precipitar nada”, revelou Vasconcelos, que até compor a chapa com José Ignácio era um obscuro vereador de Vila Velha. As oposições, que foram às ruas distribuir pizza para denunciar a situação de impunidade no Estado, perceberam a manobra. Na quinta-feira 5, resolveram adiar a decisão sobre um pedido de impeachment do governador. “Queremos tudo apurado e a punição dos corruptos, mas de maneira nenhuma vamos entrar no jogo de Gratz”, justificou a presidente do PT do Espírito Santo, Iriny Lopes.

No vale-tudo comandado por Gratz, estão sendo mostrados a políticos e empresários novos dossiês contra José Ignácio. Essa nova ofensiva começou na segunda-feira 2 logo depois de o governador frustrar Gratz com o anúncio de mudanças no primeiro escalão. Ele esperava a nomeação de um apadrinhado do deputado Gilson Lopes (PFL) para o comando da segurança pública. Lopes é integrante da Scuderie Le Cocq – o esquadrão da morte capixaba – e foi indiciado pela Polícia Federal na famosa “Operação Marselha”, que desbaratou uma quadrilha que trocava automóveis roubados por cocaína na Bolívia. Gratz também queria escolher todo o comando da área econômica e indicar o ex-ministro da Defesa Élcio Álvares para a presidência de um banco estatal. Em vez disso, o governador escalou secretários interinos para tocar a máquina. A principal mexida foi a demissão da primeira-dama, Maria Helena Ferreira, da Secretaria de Ação Social. Ela foi acusada de participar de um esquema de cobrança de propina de empresas em negócios com o governo de seu marido. Divulgadas pela primeira vez em abril na edição de ISTOÉ 1647, as denúncias faziam parte de um dossiê montado pelo prefeito de Cachoeiro de Itapemirim, Theodorico Ferraço (PTB), com um pacote de seis fitas gravadas pelo lobista Nilton Antônio Monteiro. Um laudo da PF divulgado na quinta-feira 5 confirmou a autenticidade das gravações.

Na Justiça – Além das apurações na CPI da Propina, em que empresários e funcionários confirmaram o pagamento de pedágio nos negócios feitos em terras capixabas, também foram abertos oito inquéritos pelo Ministério Público. Dois deles encontraram indícios de crimes praticados pelo governador contra a administração pública e foram enviados ao procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, a quem compete decidir se denuncia José Ignácio no STJ. O governador também está sendo investigado pelo Ministério Público Estadual. Sua campanha a governador teria sido financiada pelo Banco do Estado do Espírito Santo. Um relatório do Banco Central confirmou: “Foi apurado que o Banestes admitiu a abertura de conta de movimento sem depósito, com saldo devedor da ordem de R$ 2,6 milhões, em nome da pessoa física do sr. José Ignácio Ferreira – conta 6.654.214, da agência central do Banestes, em 30 de outubro de 1998, cujo crédito foi utilizado para saldar débito de campanha do mesmo, por interpostas empresas.”

Mas se a situação de José Ignácio está difícil, a da turma de Gratz é também complicada. Gratz vem se apegando à imunidade parlamentar para escapar da Justiça. Mesmo assim as investigações avançam, inclusive as promovidas pelo Ministério Público Federal a partir das denúncias feitas no relatório final da CPI do Narcotráfico. Mantidas em segredo de Justiça, também estão bem adiantadas as apurações que mostram como foi construído e é hoje sustentado o poder de Gratz na Assembléia. “Há um gravíssimo colapso institucional no Estado e o governo federal assiste a tudo isso como se nada estivesse acontecendo”, critica o deputado federal Ricardo Ferraço (PPS).