Os britânicos são aficionados por um jardim. Em qualquer cantinho da tumultuada Londres ou das quadriculadas áreas rurais da Escócia, eles são capazes de produzir uma horta ou uma estufa com plantas tropicais num país onde a maior parte do ano o tempo é ruim, com chuvisco e neblina – o famoso fog. Na rede de livrarias Dillon’s, por exemplo, encontram-se todos os tipos de livros sobre jardinagem. A duquesa de Northumberland não foge à regra da paixão pelo verde. Só que com ela não é jardinzinho, não. O jardim de Jane Northumberland, 42 anos, em seu Castelo de Alnwick, na Inglaterra (quase fronteira com a Escócia) custará nada menos de 15 milhões de libras (cerca de US$ 25 milhões). Tão mirabolante o empreendimento que já está sendo comparado aos jardins de Versalhes, idéia de que a realeza inglesa faz questão de rapidamente afastar. “Não é um jardim classista como os dos franceses”, explicou a duquesa a ISTOÉ. A comparação com Versalhes fará sentido se acontecer o sonho da família Northumberland de transformar esse parque na maior atração turística da Europa do século XXI.

Tudo começou quando descobriram nos fundos do castelo remanescências de um jardim clássico italiano dos anos 1750-1850, com peças de mármore e ruínas do que deve ter sido um teatro. Isso foi há quatro anos, quando a família Northumberland mudou-se para o castelo de Alnwick. A duquesa, então, foi convidada a reavivar os jardins, mas não mais nos moldes clássicos restaurando o que lá havia. Ela desejava realizar um sonho antigo, um parque inglês que fosse aberto ao público. Jane já tinha vivido essa experiência na infância, quando sua mãe resolveu abrir os jardins de sua casa rural à população. “Cresci numa casa assim e portanto para mim criar um parque é uma idéia natural. É muito mais sociável abrir os jardins para as pessoas da comunidade e será muito bom ver as crianças brincando por aqui”, disse. Aliás, foram os ingleses que inventaram o parque e espalharam árvores pelas praças públicas (leia quadro à pág. 114).

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A idéia é fazer um parque de visitações que agregue alta tecnologia ao talento dos paisagistas. “Um projeto para as próximas gerações”, definiu a duquesa. São 12 acres (48 mil metros quadrados) com tudo que um parque dessa grandiosidade tem direito: um jardim em espiral interativo com água espirrando nas pessoas e uma área com plantas aromáticas com inscrições explicativas até em braille. Haverá também outra área educativa com plantas venenosas onde as crianças vão se deliciar com as utilidades dessas plantas e as lendas fantásticas que giram em torno das poções da Idade Média. Afinal, esta é uma terra onde a cultura celta deu margem às várias histórias de bruxas e suas receitas mágicas. A beleza bucólica do castelo de Alnwick já pôde ser vista em várias produções cinematográficas, como na cena em que o herói Robin Hood, na pele de Kevin Costner, atira uma flecha que voa ao longe. A intenção da duquesa é unir essa paisagem bucólica à alta tecnologia.

Efeito mágico – Tecnologia de ponta que será necessária para as 25 áreas com um aparato hidráulico jamais visto. Cada uma dessas áreas terá um desenho diferente e um curso de água independente. Mas o mais delirante será uma cascata de 200 metros que passará por cima de um gigantesco arco. O visitante poderá sentir os respingos da cascata debaixo dela porque será construída ali uma passarela. “Com o barulho da água e do vento balançando a vegetação, será um efeito mágico”, afirma a duquesa.

Magia mesmo será necessária para conseguir esses milhões de libras para custear o projeto, uma vez que ele não sairá do bolso da realeza. Mesmo com a fortuna da família Northumberland estimada em 250 milhões de libras. “Até agora, esta está sendo a minha maior dor de cabeça”, disse a duquesa. E o analgésico por hora foi contratar um caça-níquel nos Estados Unidos para arrecadar fundos. Apesar de o príncipe Charles ser o patrono do parque, não é fácil convencer as instituições britânicas a financiar um jardim de ouro. Para manutenção do parque serão cobradas 10 libras (US$ 16) por ano aos sócios-moradores da região e 20 libras (US$ 32) aos forasteiros. Aos poucos, as empresas começam a se engajar. A Philips Morris irá se encarregar da sofisticada iluminação. À noite, o parque terá uma belísisma paisagem digna de um conto de fadas.

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Críticas – Mal os guindastes começaram a escavar as ruínas do antigo jardim e a polêmica já começou. A vizinhança do castelo anunciou estar temerosa de que além das muralhas seja erguida uma espécie de Disneylândia. Depois as farpas vieram contra a contratação de dois arquitetos belgas, Jacques e Peter Witz, pai e filho que trabalham há anos juntos e foram justamente premiados pelo governo francês. Os ingleses mais conservadores não gostam de profissionais estrangeiros metendo o bedelho nas coisas da realeza. Até a princesa Diana, que era adorada pelos plebeus, foi criticada quando começou a se vestir com grifes francesas e italianas. Com o projeto da duquesa não é diferente. Mas ela faz questão de bancar sua equipe vinda do continente. “Como responsável pelo projeto contratei pessoas competentes e especializadas neste tipo de arquitetura, o que infelizmente não pude encontrar por aqui”, justifica-se. Até a data oficial da inauguração, que deverá acontecer em maio do ano que vem, esse Éden de orçamento fantástico estará sujeito ainda a muitas serpentes.