A crise financeira que assola o planeta teve início nos Estados Unidos com a inadimplência do setor imobiliário. No Brasil, esse mercado, que há alguns anos vem de vento em popa, ainda não sentiu seus efeitos. E parece pouco provável que venha a senti-lo de maneira significativa. O Brasil já passou por uma crise no Sistema Financeiro da Habitação, criou regras rígidas para o setor e hoje opera recursos que não sofrem influência externa. Soma-se a isso uma demanda crescente. Para Rodolpho Vasconcelos, da Domus, empresa de crédito imobiliário, uma crise nos moldes da que ocorre nos Estados Unidos é muito difícil de acontecer no Brasil.

"Aqui, o crédito imobiliário é muito responsável; lá é muito mais livre", diz. Essa também é a opinião de Rogério Zylbersztajn, vice-presidente da RJZ Cyrela. "O nosso sistema é bem diferente, não temos nada a ver com o subprime americano", diz o executivo. Ele considera que, como o déficit habitacional ainda é grande no País, o mercado imobiliário vai continuar surfando boas ondas. Fábio Rossi, diretor de lançamentos do Secovi, maior sindicato imobiliário da América Latina, compartilha da mesma opinião de Zylbersztajn. "Podemos dizer com segurança que imóvel ainda é um ótimo investimento a longo prazo", diz Rossi. "Se há uma crise de crédito, é nesse momento que os investidores vão em busca de ativos reais, ou seja, aqueles que não oscilam, e o imóvel é um deles", afirma Zylbersztajn.

Com regras bem diversas das americanas, o Brasil de 2004 para cá vive um reaquecimento no setor imobiliário. Vale lembrar que há cerca de 20 anos o País viveu uma crise no Sistema Financeiro da Habitação (SFH). A recessão econômica durante o período de 1980 a 1990, o arrocho salarial, a queda do poder aquisitivo, a elevação das taxas de juros e a inflação ocasionaram elevada inadimplência do SFH. "Só a partir de 2003, 2004 vimos um reaquecimento", explica Vasconcelos. Paulo Simão, presidente da Câmara Brasileira da Indústria de Construção (CBIC), explica que o fim da crise e a volta do crescimento são frutos de modificações e aperfeiçoamento do sistema de financiamento habitacional. "A Lei 10.931 contribuiu muito para que hoje tenhamos bases jurídicas sólidas que dão segurança ao mercado", diz Simão. Ele se refere à lei que dispõe, entre outras coisas, sobre o patrimônio de afetação, instrumento que permite a criação de um patrimônio próprio para cada empreendimento, que passa a ter a sua contabilidade separada das operações do incorporador- construtor. Isso faz com que o comprador de um imóvel e os investidores tenham maior segurança, pois o empreendimento apenas responde por dívidas e obrigações vinculadas à própria incorporação. "Essas novas regras trouxeram como resultado o fato de que neste ano o mercado vai financiar R$ 32 bilhões só com recursos da poupança", conta Simão, explicando que os dois grandes financiadores do setor são o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e a caderneta de poupança. "Esses fundos não sofrem influência externa", completa, elogiando o sistema financeiro brasileiro. "É muito desenvolvido."

16.539 imóveis foram lançados na capital paulista no primeiro semestre deste ano, segundo o Secovi

19.224 imóveis foram comercializados em São Paulo também no primeiro semestre de 2008

De fato, os números do setor são positivos, até agora. Pesquisa do mercado imobiliário do Secovi-SP mostra que foram lançados 16.539 imóveis e comercializados 19.224, na capital paulista, no primeiro semestre deste ano. A pesquisa sugere que tanto os lançamentos como a procura por imóveis andam em alta na cidade. O mesmo tem ocorrido no Rio de Janeiro, onde foram lançados 6% a mais de imóveis no primeiro semestre em relação ao mesmo período do ano passado, num total de 6.218 unidades. E espaço para o crescimento existe porque o ramo da construção civil ainda é tímido dentro do PIB nacional. "Representa apenas 2%. No México, por exemplo, este número salta para 15%", explica Paulo Fabbriani, vice-presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi).

O setor cresceu 9,9% só no segundo trimestre deste ano, segundo o IBGE. Mesmo os menos otimistas descartam a possibilidade de paralisação no setor. Admitem, no máximo, uma diminuição no crescimento. "Haverá uma redução na atividade do setor imobiliário de 30% a 50% nos próximos anos", diz Fabbriani.