Um ancião barbudo pragueja por não poder entregar os caixões de defunto que fabrica. Tudo porque seu burro de carga resolveu se suicidar, desiludido de amor, empacando em uma linha de trem. Essa é a primeira cena de A vida é um milagre (Zivot je cudo, França/Montenegro/ Sérvia, 2004), que estréia na sexta-feira 18, filme mais recente do iugoslavo Emir Kusturica. O diretor de Underground – mentiras de guerra recorreu a Romeu e Julieta – no caso, Luka (Slavko Stimac), cristão ortodoxo sérvio, e Sabaha (Natasa Solak), muçulmana bósnia – para recriar o conflito que dizimou seu povo nos anos 90. São duas horas e meia de gritos, bebedeira e tiros para o ar, à maneira anárquica de Kusturica, autor do roteiro e da trilha sonora à frente de sua No Smoking Orchestra. Clichê de si mesmo, como Quentin Tarantino, o diretor se diverte. Em uma cena antológica, prostitutas espalham cocaína ao longo dos trilhos da ferrovia, aspirada por gordos engravatados deitados em vagonetes em movimento. “São empresários patriotas”, explica Luka, marido abandonado e pai de um “Ronaldinho” iugoslavo, impedido de jogar porque foi convocado para a guerra.


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