No disputado mercado da animação, que só entre as estréias de fim de ano movimentou mais de US$ 600 milhões no mercado americano, uma nova marca começa a incomodar as líderes DreamWorks, residência de Shrek, e Disney/Pixar, de cujos computadores nasceram as estripulias do peixinho Nemo, entre outros bichinhos coloridos. Trata-se da Blue Sky Studios, produtora nova-iorquina comprada pela 20th Century Fox, que aposta suas fichas no futurismo retrô de Robôs (Robots, Estados Unidos, 2005), em cartaz nacional na sexta-feira 18. Dublado pelo ator inglês Ewan McGregor, o robô adolescente Rodney Lataria não exibe o mesmo poder de sedução do milionário ogro verde. Mas tem lá o seu charme. Especialmente para os brasileiros, já que por trás do mundo dos bonecos falantes da animação está o carioca Carlos Saldanha, 36 anos, co-diretor do filme com o americano Chris Wedge. Ansioso em saber os nomes dados aos personagens no Brasil – Rodney, por exemplo, tem o sobrenome Copperbottom (casco de cobre) no original –, Saldanha explica que a chegada do filme nesta época do ano – nos Estados Unidos a produção entrou em cartaz na sexta-feira 11 – é uma opção estratégica. “Os estúdios procuram combinar para lançar seus filmes em datas isoladas e não competir um com o outro. Como aconteceu com A era do gelo, a gente sempre preferiu o spring break, a duas semanas das férias escolares, que acontecem em março.”

Anunciado como o primeiro desenho de animação passado inteiramente num mundo de faz-de-conta, sem nenhuma referência à realidade, na contracorrente dos similares mais recentes, Robôs optou por uma história mais infantil. Mas é pelo fantástico visual que ele pega o adulto. Nascido numa cidade de conto de fadas – quer dizer, montado, porque na terra dos robôs uma nova vida vem dividida em peças numa caixa de papelão, acompanhada de um manual de instruções – Rodney é o filho único de um casal simpaticíssimo. Para ajudar o pai – uma máquina de lavar pratos já começando a bater pino –, ele cria um robozinho voador que faz o serviço com mais rapidez e eficiência. É com o sonho de ser inventor que ele parte então para Robópolis, a estonteante cidade feita de prédios esféricos e ruas suspensas, de ares orientais.

Logo de cara, ao chegar numa estação desenhada à imagem da Grand Central Station de Nova York, ele conhece Manivela (Robin Williams), em seu primeiro papel animado desde Aladin (1992). O boneco vermelho, de torso de abajur e cabeça de máquina de moer carne, promete levá-lo à indústria de reposição de peças, onde Rodney pretende trabalhar sob a supervisão do Grande Soldador (Mel Brooks). Descobrir de que pedaço de quê é feito cada personagem é um dos bons achados do filme. Piper, por exemplo, a irmã de Manivela, tem duas maria-chiquinhas adaptadas de duchas amarelas. Chris Wedge, que andou pesquisando em ferros-velhos, antiquários e na própria cozinha de casa, diz que as feições de Rodney nasceram da observação do motor de propulsão do barco de seu avô. Bem, é preciso ver o filme mais de uma vez para matar a charada. Mais fácil de identificar é o traçado de Robópolis, uma visão gigantesca de um fliperama, com vias expressas semelhantes às canaletas por onde escorrem as bolas do flipper.

É numa esfera vazada, aliás, que Rodney e Manivela embarcam numa viagem de arrepiar. É como se a câmera voasse numa trajetória alucinante, feita de arremessos, batidas e desmontes calculados, de efeito delicioso. Na verdade, a sequência da Crosstown Express, a primeira inteiramente concebida por Carlos Saldanha, foi inspirada nas chamadas “esculturas cinéticas” do americano Rube Goldberg. Outra sequência de arrasar é o surfe no mar de dominós, que provocam ondas ao caírem numa sucessão hipnótica. Do meio deles surge o Grande Soldador, exilado em um canto qualquer de Robópolis depois que o edipiano Dom Aço (Gregg Kinnear) assumiu o controle da fábrica por pressão da mãe, a megera Madame Junta (Jim Broabent). O plano de Dom Aço é mandar para o forno todos os Enferrujados, robôs avariados como Manivela e sua turma. Assim, ele poderá incrementar o mercado só com peças de reposição lustrosas como as modernas ligas metálicas. É aí que entra em ação a habilidade de Rodney com chaves de fenda, porcas e parafusos. À frente da rebelião dos robôs, Rodney ensina a criançada o lado “desumano” do consumismo. Seguindo a moda do gênero,
essa mensagem vem embalada em números musicais como Singing in the rain, funks de James Brown e bobagens de Britney Spears. Mais uma vez, Michael Jackson não foi esquecido. Um robô verde e desajeitado repete seus passos à perfeição – uma graça!