Mesmo incomodado com o vento e a feiúra de uma pequena cidade espanhola da Andaluzia, onde se hospedava, David Byrne começou a dar vida a algumas idéias musicais que dançavam na sua cabeça. Passados dois anos, o ex-talking head aproveitou muitas das pinceladas sonoras e as acoplou à inspiração vinda de uma coletânea montada por ele em CD particular, só com músicas de Caetano Veloso, Stevie Wonder, Tricky e Isaac Hayes, entre outros. Byrne queria ter certeza, nas suas próprias palavras, de que um olhar em várias direções despiria seu disco de um certo ar de pretensão. A intuição tomou forma e desembocou com bom resultado no seu quinto álbum solo, Look into the eyeball, no qual se nota empenho, cor e brilho.

Como o cantor e compositor tem bebido, e se saciado, da música latina e principalmente brasileira, ele não poderia deixar de pulverizar alguns talentos tropicais ao longo de um disco no qual dá para constatar a possibilidade de se unir – como Byrne diz – o balanço com a beleza, lirismo e emoção da música erudita. Um ótimo exemplo é a faixa The revolution, na qual a suavidade de cordas interliga-se a uma delicada percussão. A intenção acentua-se em The great intoxication, em que Vinícius Cantuária e Paulo Braga emprestam a vibração brasileira à batucada. Outra presença verde-amarela é a de Jaques Morelenbaum, que imprimiu sua marca registrada no arranjo da delicada Smile. A porção dançante do CD acontece em Desconocido soy, composta e cantada em espanhol com a ajuda de Rubén Albarrán, do Café Tacuba. É trepidação suficiente para levantar e sacudir todos os kilts de David Byrne, um escocês americanizado, mas de rebolado bem latino.