Nas últimas campanhas eleitorais, o PT desenvolveu uma prática nem um pouco republicana ao tentar dividir o eleitor brasileiro entre os de primeira e os de segunda categoria, como se poder aquisitivo ou Estado natal pudessem ter pesos diferentes na hora do voto. Essa simplificação grosseira está longe de refletir a complexa organização social do Brasil, empobrece a discussão sobre os problemas nacionais e menospreza um dos principais atributos do País: a sua unidade.

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O recrudescimento desse discurso se deu durante o primeiro mandato de Lula, quando os petistas se viram ameaçados pelas denúncias do mensalão. Acuados pelas acusações, os petistas apostaram no discurso divisionista para não perder a eleição. Deu certo. Em 2006, Lula ganhou do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e, quatro anos depois, Dilma despachou o ex-ministro da Saúde José Serra. Nas duas ocasiões, prevaleceu o discurso das “elites” contra o “povo”, uma transposição para a realidade atual da velha luta de classes identificada por Karl Marx.

Ao lançar mão dessa estratégia, os petistas tentam carimbar a oposição como inimiga das conquistas da população, como se eles fossem os únicos na história a formular políticas que beneficiaram o povo. A releitura da luta de classes, porém, não corresponde ao conceito concebido por Karl Marx, segundo avaliação do sociólogo e pesquisador da Unicamp Daniel Martins. O estudioso afirma que o PT se apropriou de outro fenômeno para confrontar o PSDB no ambiente político. “No Brasil existe preconceito de classe, de regiões. O PT se apropriou de manifestações de preconceitos e criou esse discurso. Mas existem inconsistências”, afirma Martins. Ele lembra, por exemplo, que entre os apoiadores do PT está a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), presidente da CNA. “Não faz sentido essa retórica que distorce o debate”, lamenta. De fato, levada para as ruas, essa divisão entre uma legenda dos ricos e outra dos pobres, uma agremiação que defende os interesses do Sul e outra que representa o Norte pouco acrescenta ao eleitor interessado em conhecer as propostas dos candidatos e contribui para um racha inconcebível na sociedade brasileira.

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Fotos: Hans von Manteuffel; Divulgação