No início da noite da terça-feira 7, o turboélice King Air prefixo PR-PEG que havia partido de Belo Horizonte alcançou a cabeceira do aeroporto internacional de Brasília. Ao abordar a aeronave, a Polícia Federal encontrou R$ 116 mil em cédulas de R$ 100 e R$ 50 distribuídos em sacolas e mochilas. Três passageiros foram detidos: o empresário Benedito Oliveira Neto, o Bené, conhecido operador do PT mineiro, o segurança Pedro Medeiros e o jornalista Marcier Trombiere, ex-assessor do Ministério das Cidades, indicado pelo PP. Em depoimentos marcados por lacunas e contradições, alegaram que o dinheiro seria pagamento por serviços à campanha de Fernando Pimentel, eleito governador de Minas Gerais. Mas não apresentaram qualquer recibo ou nota fiscal. A PF abriu inquérito para apurar o caso. Os elementos colhidos até agora indicam que quase nada do que disseram os três ocupantes da aeronave é verdade. E levantam a suspeita de que os valores seriam sobra de caixa 2 destinados à campanha de Dilma Rousseff.

abre.jpg
PROCEDÊNCIA SUSPEITA
Donos de avião que levava pessoas ligadas ao PT seriam
laranjas de Bené, conhecido operador do partido

Os investigadores já têm uma pista importante: o King Air não foi fretado pelo grupo. Registrado na Anac na categoria de “serviço aéreo privado”, em nome da empresa Bridge Participações, teria como verdadeiro proprietário o próprio Bené. A Bridge tem como presidente Ricardo Santos Guedes, um advogado de 38 anos que se apresenta como “representante” da Gráfica e Editora Brasil, que pertence ao empresário mineiro. Guedes, seu irmão Alexandre e Cleusa Centeno dos Santos, possível parente de ambos, participam da composição acionária de mais sete empresas de diferentes ramos, como publicidade e propaganda, mineração, construção civil e consultorias.

Apesar do “sucesso empresarial”, nenhum dos dois irmãos possui sequer um veículo, nem mesmo um carro popular. Cleusa, que tem em seu nome um Gol 1999, um Fiat 2000 e outro Gol 2012, não possui habilitação. Além disso, ela viveria numa casa de baixa renda localizada em Canoas (RS). Alexandre e Ricardo, por sua vez, têm endereço nos bairros Asa Norte e Sudoeste, em Brasília. Mas não foram localizados pela reportagem. Para a PF, eles seriam “laranjas” de Bené. Na opinião de uma autoridade ligada à investigação, registrar a aeronave em nome de uma empresa integrada por pessoas interpostas pode significar tentativa de ocultação de patrimônio.

O caso fica ainda mais complexo quando se analisa o relatório dos planos de voo registrados no prefixo PR-PEG do King Air de Bené. Vê-se que o turboélice cumpriu uma intensa agenda de campanha entre 14 de julho e 7 de outubro, e que cobriu o trecho entre Brasília e Belo Horizonte diversas vezes. O avião também percorreu o interior de Minas, usando pequenas pistas de pouso. Diferentemente dos jatos, o turboélice é uma aeronave versátil por ser capaz de pousar até em estradas de terra.

Alguns voos coincidem com comícios de Pimentel. Em 1º de agosto, por exemplo, o então candidato ao governo de Minas participou de comício em Montes Claros com a presença de Dilma e Lula. Os planos de voo também registram em agosto visitas às cidades mineiras de Juiz de Fora, Uberaba, Tatuí e Divinópolis. A PF agora quer confirmar quais voos de fato ocorreram, se possível saber quem embarcou e se houve transporte de valores em outras oportunidades.

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

IEpag46a47_DinheiroVoador-1.jpg

Fontes ligadas à campanha de Pimentel informaram à ISTOÉ que o candidato usou duas aeronaves na eleição, sendo uma delas a de Bené. A assessoria de imprensa de Fernando Pimentel disse que o candidato não contratou serviço de táxi-aéreo de Bené e não utilizou a aeronave citada para nenhum deslocamento. A mesma fonte disse que o King Air também transportou o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamoto. Por meio da assessoria de imprensa, Okamoto disse que nem ele nem o ex-presidente viajaram no referido avião. Afirmou ainda que nem sequer conhece Bené. O empresário também não foi localizado para comentar o caso.

Não será surpresa se a PF descobrir que a aeronave atendeu caciques do PT e da campanha de Dilma, uma vez que Bené tornou-se uma eminência parda na cúpula petista. Em 2010, o empresário envolveu-se na frustrada montagem de um dossiê contra o candidato tucano José Serra, que concorreu com a petista. Bené também foi quem pagou o aluguel da mansão que serviu como QG da campanha de Dilma no Lago Sul.

IEpag46a47_DinheiroVoador-3.jpg

O empresário mineiro foi apresentado a Pimentel pelo ex-deputado Virgílio Guimarães, o mesmo que levou o publicitário Marcos Valério ao ex-ministro José Dirceu. Não por acaso, Bené ascendeu empresarialmente justamente após o escândalo do mensalão e a queda de Valério. Seu nome chegou a estar associado a 11 empresas simultaneamente, sendo a principal delas a Gráfica e Editora Brasil. Até 2004, seus rendimentos não superavam R$ 400 mil. Mas essa realidade mudou bastante. De 2005 até hoje, as empresas de Bené faturaram em contratos com o governo do PT cerca de R$ 300 milhões, 70% desse valor só com a gráfica. Para se defender no TCU, o empresário contratou o escritório de Erenice Guerra, ex-ministra da Casa Civil e braço direito de Dilma.

Para administrar tantas frentes de atuação, Bené costuma repassar o controle de suas empresas a terceiros. Isso foi feito com a Projects Brasil, que em 2011 assumiu a digitalização de documentos do Ministério das Cidades, então comandado por Mario Negromonte. Além de emplacar o contrato, Bené ainda conseguiu que Negromonte nomeasse um ex-funcionário seu na função estratégica de coordenador-geral de modernização e informática. Outro aliado nas Cidades era o então chefe da comunicação, Marcier Trombiere, que estava no avião. Trombiere deixou o cargo a convite de Bené. Trombiere, segundo a assessoria de Pimentel, atuou na comunicação da campanha. Já a Gráfica e Editora Brasil prestou serviços gráficos. “As despesas serão declaradas na prestação de contas final”, informou em nota. Seja como for, nada se falou sobre o empréstimo do avião. Convocados pela PF, piloto e copilotos foram orientados a permanecer em silêncio. 


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias