03/10/2014 - 19:01
Paulo Maluf chegou às eleições presidênciais de 1989 tentando provar ser um novo homem. Nos quatro anos anteriores o eterno candidato do PDS havia sofrido três duras derrotas consecutivas. A primeira no Congresso Nacional, quando foi preterido na eleição indireta para presdidente por Tancredo Neves, que acabou vencendo, mas não assumindo em decorrência de sua morte. Depois, em 86, no ano seguinte, disputou o governo de São Paulo e tornou a ser derrotado, desta vez por Orestes Quércia. A terceira e mais humilhante derrota havia sido em 1988, quando Eluiza Erundina, então no PT, derrotou o ex-prefeito biônico de São Paulo na disputa pelo comando da capital paulista. Nesta reportagem e entrevista publicadas no final de agosto de 1989, Maluf tenta, uma vez mais, reconstruir sua imagem. Mas, como mostra a matéria, Maluf continua o mesmo. Apesar de não ter chegado ao 2º turno, como parecia acreditar, conquistou quase seis milhões de votos e foi o sexto candidato mais votado.
Basta passar uma segunda vez pela frente do palacete da rua Venezuela, 606, em São Paulo, para notar facilmente a diferença: a cada dia, cresce o número de carros ali estacionados. Desde que Paulo Salim Maluf instalou, um mês, seu comitê eleitoral, na antiga residência do amigo pessoal Jorge Yunes, editor e empresário, é crescente o movimento nos escritórios improvisados desta construção de dois mil metros quadrados. caracterizada pelos amplos espaços, portas e janelas trabalhadas e pelos tetos altos como não se fazem mais.
Cerca de 30 funcionários contratados não param um minuto. datilografando, agendando,telefonando e anotando recados. Há coordenadores para tudo – desde a preparação das viagens do candidato até a compra de materiais de campanha, ou o preparo dos cartazes e adesivos de propaganda. Gente nova disposta a colaborar aparece a toda hora – já não há lugar para os que querem participar e eles circulam, atarantados, pelos corredores.
A campanha de Paulo Maluf vive um nítido momento de euforia. O candidato e seus articuladores, tendo à frente o formulador Roberto Paulo Richter, esperavam, na quarta-feira, dia 23, a próxima divulgação das pesquisas do Ibope, com números que atestariam a subida inexorável de Maluf e sua chance de disputar a vitória, até, no segundo turno. E esse entusiasmo não diminuiu nem quando, na sexta-feira, dia 25, a pesquisa do Gallup revelou que Maluf continua longe de Brizola, embora mantenha firme, a terceira colocação com 6% das preferências do eleitorado. A mera tendência dos números revelados pelas pesquisas era suficiente para justificar a alegria dos malufistas. Eles notavam que Maluf é o único candidato em subida constante. Fernando Collor caiu de 44% para 40%, Leonel Brizola teve 17% e está com 13%, Luis Inácio Lula simplesmente despencou e todos os outros não saem da vala comum inferior a 4%, inclusive Mário Covas, que teve os seus 6%.
Tudo assim parece favorável a Maluf, que chegou entusiasmado ao comitê naquela quarta-feira, para um encontro com uma delegação de tenistas paulistas, dispostos a lhe dar apoio. Ele apertou a mão de Danilo Marcelino e Ricardo Kyrillos, trocou com eles breves amabilidades e logo, incansável, passou a dar declarações às rádios do interior pelo telefone – rotina de todos os dias na sua agenda de campanha. Na sala ao lado, o assessor Carlos Brickman sugeria ao cabo eleitoral que patrocinara a vinda dos tenistas uma nova visita nos próximos dias. Mas ai, observava, os tenistas deveriam vir com suas roupas de jogo, e em maior número – “se possível uns 30, porque a televisão gosta é de imagem e não de palavras”.
Novo e velho
O publicitário Nelson Biondi (acima) começou a mudar a imagem de Maluf
ano passado, mas só o anúncio do 752 permitiu consolidar o trabalho.
Maluf continua a cortejar velhos cabos eleitorais como o "Comendador"
Penido (abaixo), sem dispensar uma segunda barba para sair bem na televisão
Minutos depois, Maluf, sempre sorridente, já recebia uma delegação de empresários da construção civil e dos transportes. Em certo momento, pegou pelo braço o velho conhecido Peterson Penido, empresário de transportes, e tratando-o por “Comendador”, acariciou: “O sr. é daqueles que nos dão estímulo: podia ficar em sua casa, descansando, que bem merece. E, no entanto, não pára de trabalhar pelo bem do País.” O estilo pode parecer exagerado, mas Maluf dizia exatamente o que aquela gente queria ouvir. Depois de abraçar carinhosamente o correligionário, voltou ao telefone para novas entrevistas. Jornalistas entraram na sala, perguntando sobre as declarações de Collor de Mello, de que passou a temer a candidatura Maluf. O candidato do PDS exultou. “Eu não assusto ninguém. O que quero é tranquilizar o povo brasileiro”, disse.
Maluf poderia ter, por exemplo, atacado Collor, como os jornalistas possivelmente desejavam. Mas ele tem evitado polemizar com o líder das pesquisas. Sua tática parece clara: ele prefere que os outros ataquem Collor, particularmente Brizola e Lula. E isso porque acha que o possível desgaste de Collor e de seus atacantes só tem um provável beneficiário: ele próprio, Maluf.
A idéia não é nova, na medida em que, tradicionalmente, na política, o tertius se aproveita das campanhas muito polarizadas. Mas Maluf, no caso, ainda tem outro bom motivo para ficar bem-comportado, só observando os acontecimentos. É que ele baseia sua campanha, desta vez, na construção de uma nova imagem. Quer surgir perante o eleitorado como um Maluf mais humilde, disposto a fazer o jogo democrático até as últimas consequências, sem nem resquício daquela marca dc auto-suficiência e prepotência que o caracterizou em campanhas passadas.
Maluf tem insistido que sua campanha não vai ter ataques pessoais, caracterizando-se como “educada” e “civilizada”. Sua suposição é a de que o novo estilo é mais agradável ao eleitor, que estaria cansado de tanto ver os políticos trocando acusações. Além disso, a nova imagem o beneficiaria num contexto de marketing político: ele seria agora um produto diferente, que não se confunde com os outros candidatos, facilitando desta forma a venda de outra de suas mensagens básicas – a de que só ele teria competência para realmente resolver os problemas do País. (Leia entrevista à página 38.)
A ideia do novo Maluf surgiu, a rigor, na campanha do ano passado, quando ele concorreu à Prefeitura de São Paulo e perdeu no último momento para Luiza Erundina. Já então o publicitário Nelson Biondi, responsável pela sua imagem, notou que o próprio eleitorado havia mudado em relação a Maluf. Ele agora era carregado pelo povo nos comícios da periferia. As derrotas sucessivas em 85 e 86 pareciam haver “lavado”, nota o publicitário, a imagem do criticado Maluf, concorrente derrotado Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. Afinal,ele perdera duas eleições e nem por isso o País estava melhor, nem o povo parecia feliz. O momento era oportuno para uma virada de imagem, que, no entanto, só chegou a ser ensaiada, dada a urgência da campanha municipal.
Roberto Paulo Richter
O estrategista da campanha
A oportunidade chegou nesta campanha para presidente, quando o próprio Maluf decidiu pôr em prática a ideia. Seu primeiro passo foi tentar contratar o publicitário Washington Olivetto, por indicação do próprio Biondi, que o acompanha desde os tempos de governador de São Paulo. “Simplesmente, eu não tenho a pretensão de ser o melhor, nem de ser o único. Achei que o Olivetto seria um grande reforço”, explica Biondi. Consultado, porém, Olivetto acabou recusando o convite. Mas a manobra resultou bem para Maluf, porque Olivetto voltou a propor que o candidato aparecesse na televisão como garoto propaganda de um anúncio seu -como já o fizera, em vão, em 88. Desta vez, Maluf aceitou. Ele entrou assim na mídia televisiva em horário nobre, demonstrando as qualidades do sapato 752, da Vulcabrás, e o lance serviu exatamente a seu objetivo de apresentar uma imagem mais humana e simples, sem as características anteriores.
O segundo lance foi a imediata contratação dos jornalistas Carlos Brickman e Ênio Pesce, ambos bem situados na imprensa paulista. Maluf desejava antes de tudo superar seus problemas de relacionamento tradicionais com a imprensa. Para isso,precisava muito de uma assessoria eminentemente profissional, que transmitisse uma idéia de respeitabilidade no trato com os jornalistas. Ele teve de insistir muito para que Brickman e Pesce aceitassem o convite, mas terminou conseguindo, quando subiu sua proposta para níveis desconhecidos no setor. Contratou-os por salários equivalentes a US$ 15 mil mensais – o que dá hoje cerca de NCz$ 60 mil, cerca de dez vezes mais o que cada um ganharia em seus respectivos empregos.
O trabalho de Brickman e Pesce revelou-se eficiente para o candidato. Além da respeitabilidade, eles deram a Maluf uma assessoria honesta, que abre todas as informações possíveis para os repórteres e lhes dá a chance de falar com o candidato quase imediatamente após a chegada ao casarão da rua Venezuela.São ajudados pela jornalista Lúcia Tavares, a Lucinha, como a chama Maluf. Ela é capaz dc armar todo um esquema de entrevistas do candidato em qualquer Estado ou cidade, prevendo exatamente quem vai entrevistá-lo e o tempo de cada entrevista.
Maluf não fica nisso: ele sabe também o que vão lhe perguntar e o que deve responder, porque recebe assessoria de marketing político da Brasmarket, de Sidney e Ronald Kuntz. Eles são especialistas no assunto e nas últimas eleições prepararam as campanhas de Said Xerfan, em Belém, Wilson Braga, em João Pessoa, e Júlio Campos, em Cuiabá, todos vitoriosos. Os Kuntz conhecem a realidade política de cada Estado e passam essas informações para Maluf. Sabem por exemplo que Xerfan, eleito com votação recorde em todo o País, faz hoje uma má administração em Belém do Pará, surpreendentemente. E esse é o tipo da informação preciosa para um candidato a presidente.
A infra-estrutura de Maluf nas viagens supera, de resto, a dos outros candidatos. Seu organizador é Roque Carneiro, que está com o candidato desde os seus tempos de prefeito de São Paulo. Começando como segurança de Maluf, Carneiro evoluiu, com os anos, para a parte administrativa das campanhas sucessivas e hoje é uma espécie de faz-tudo do candidato. Cuida dos seus assuntos privados e dos esquemas de viagens, entre outras funções. Quando Maluf viaja, está sempre a seu lado. Sabe o tempo de cada deslocamento, providencia os carros para transporte e os motoristas, além dos carregadores de malas e tudo o mais. Os motoristas que contrata sabem até a porta onde devem deixar o candidato, o que às vezes não acontece com os que servem Fernando Collor, por exemplo.
Carneiro é, assim, uma espécie de administrador da campanha propriamente dita. Mas o seu formulador é o empresário Roberto Richter, que está ao lado de Maluf desde o início de sua carreira de empresário. Ele trabalhou com Maluf e seu irmão Roberto durante 30 anos na Eucatex. Nas duas últimas campanhas, tornou-se o conselheiro de Maluf, tomando o lugar antes ocupado por Calim Eide Heitor Ferreira. Foi ele quem fez a Maluf uma observação fundamental para a campanha: desta vez, notou Richter, tudo seria decidido pela mídia, e não pelos apoios e estrutura política dos candidatos. Tratava-se, notou, de uma eleição solteira– ou seja, o presidente será escolhido sem que haja, ao mesmo tempo, nenhum outro pleito para o que quer que seja. Normalmente, os pleitos se complementam e possibilitam a formação de grandes estruturas de apoio político envolvendo desde vereadores até deputados e senadores, além dos governadores, Agora, não há outra eleição, fora a presidencial. Além disso, os políticos estão em fase de descrédito.Logo, a mídia passa a ser decisiva.
Maluf ouviu essas observações de Richter e trabalhou a partir da sua aceitação. Até porque não se esquecera do seu erro de avaliação na escolha indireta pelo Colégio Eleitoral em 1985: na ocasião, trabalhou exclusivamente os apoios políticos, certo de que eles seriam decisivos – e na hora H, eles lhe faltaram pela influência dominante da opinião publica, contrária a sua candidatura.
Uma amostra de como Maluf evoluiu nesse propósito pode ser encontrada nos roteiros de viagem que tem cumprido pelo Brasil. No Ceará, onde foi no final de julho, por exemplo, sua agenda previa, num só dia, a quarta-feira,26, cinco entrevistas longas a programas de rádio e tevê, contra apenas uma palestra, uma visita a deputados e um encontro sentimental com dona Luiza Távora , do seu ex-amigo e correligionário Virgílio Távora . No dia seguinte, Maluf foi a Natal e deu cinco entrevistas semelhantes, sem se preocupar com a falta de contatos políticos marcados. Na semana passada, na Bahia, sua agenda só previu, em dois dias, um encontro de fundo político, com a célebre Irmã Dulce. No mais, deu, como de hábito, nove entrevistas longas e médias e teve tempo de ser filmado na igreja do Senhor do Bonfim, também com fins de aparecer favoravelmente na mídia local.
O caixa Yunes
A espera das "primeiras doações"
Nessas entrevistas, Maluf procura marcar bem seu novo estilo, contando anedotas, procurando frases de efeito (leia página 36) e utilizando profusamente a técnica dos “bordões” de campanha. Ele chegou à conclusão de que a comunicação única, não funciona. Qualquer mensagem, tem de ser repetida até a exaustão para ser bem apreendida pelo eleitorado.
Sua proposta-base de campanha é a apresentação ao eleitorado com a nova imagem, para a solução definitiva dos problemas do País. Já que os outros não resolveram, insinua Maluf, por que não lhe dar agora uma oportunidade, se o seu passado de administrador confirma-lhe a competência? Além disso, acrescenta, se o eleitorado quer votar na ninguém seria mais oposicionista do que ele, pois todos os outros – todos, diz Maluf – tiveram seus lagos com a Nova República de Sarney.
São mensagens genéricas que vão sendo ouvidas com atenção por onde Maluf passa. Mas ele também se envolve na defesa de pontos dc vista específicos — e, ai, volta a ser polêmico.
Foi o que aconteceu em Belo Horizonte, na segunda-feira, 21 durante debate na Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais. Segundo revelou o Jornal do Brasil, Maluf teria dito, à certa altura, uma frase que chocou a assistência. Discutia-se o problema da violência e ele insistia na sua idéia de que, além das soluções sociais, é necessário, no caso, investir no policiamento ostensivo. Foi quando teria dito: “O que fazer com um camarada que estuprou uma moça e matou‘? Tá com vontade sexual, estupra. Mas não mata.”
Maluf negou veementemente a noticia, na quarta-feira, afirmando nunca ter dito a frase. Mas o professor José Rafael Guerra Pinto Coelho, diretor da faculdade, confirmou a versão do jornal e acrescentou ter em mãos uma que comprova a mativa do candidato. A transcrição da fita revelaria, se verdadeira, um lapsus linguae de Maluf. Pois, logo depois da frase desastrada, ele ainda teria tentado consertar as coisas, explicando: “Vocês são médico e eu posso ter aqui este tipo de linguagem. Tá certo? Eu gosto de fazer amor, não gosto de fazer guerra.”
O candidato preferiu depois enterrar o assunto, dedicando-se rapidamente a outros temas dc campanha. Ele passou a preparar, cuidadosamente, sua viagem a Alfenas, Sul de Minas, no fim da semana, e intensificou seus contatos com os parlamentares do PFL que estão abandonando a candidatura de Aureliano Chaves entre os quais os mais graduados são o líder na Câmara José Lourenço e o senador Hugo Napoleão.
Deslize em Minas
Na palestra aos estudantes, a frase fatídica que ele jura não ter dito
Tanto Napoleão como Lourenço tiveram papel de destaque na derrota de Maluf para Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. No entanto, Maluf está disposto a esquecer o passado para tê-los ao lado na corrida presidencial, De todo modo, o lance, para ele, vale como um sinal de seu crescimento e pode motivar o eleitorado, rendendo muitos votos indiretamente. Depois, Maluf está com problemas no Nordeste, onde suas antigas bases hoje preferencialmente com Collor. A entrada de Napoleão Lourenço pode alterar esse quadro.
Maluf precisa, urgentemente, passar para a segunda fase de sua campanha, segundo revelam os articuladores. Depois da sua fixação como candidato e do polimento na nova imagem, é necessário agora aparecer também como um candidato viável. Particularmente porque é a viabilidade quem pode garantir a entrada de novos recursos financeiros para a campanha. Até aqui, segundo informa o empresário Jorge Yunes, que é o caixa de Maluf, digamos assim, o próprio candidato e seus amigos mais íntimos responsabilizaram-se pelas doações, via partido, que garantem a sobrevivência da campanha. O próprio Yunes cedeu sua residência sem nada cobrar e muita gente mandou cartazetes, adesivos, camisetas e outras doações. Maluf paga o grosso das contas. Agora, será a fase da abertura de novos canais de financiamento – admite Yunes.
Enquanto isso, Maluf supera a falta de recursos com a tradicional economia recomendada por seus ascendentes árabes. Solicitado pelo deputado Delfim Netto para lhe enviar, na quarta-feira, 20 mil adesivos para distribuição em Brasília, Maluf cortou dc pronto: “Mandem quatro mil, apenas. Já é adesivo que dá gosto, para Brasília. Quatro mil carros é muito carro, não é?”, justificou, sorrindo.
Anedotas de Campanha
Uma coletânea do recente humor de Maluf
Em seu esforço para reformar a imagem, Paulo Maluf surge nesta campanha quase sempre bem-humorado e disposto a contar piadas, fazer brincadeiras com seus interlocutores e até mesmo tem tentado as irônicas frases de efeito que nunca foram o seu forte. Alguns dos seus lances principais nesta linha, coletados nos últimos dias:
Aproximação
Intimidade faz parte do tratamento dado aos jornalistas
° Quando recebe jornalistas, invariavelmente vai ao encontro das mulheres e pespega-lhes beijos nas faces, enquanto explica: “As moças dizem que eu sou o nova beijoqueiro. Então, eu preciso manter a fama.
° Quando fala da dívida externa, Maluf costuma contar uma tradicional anedota judaica, só que adaptando-a para personagens ao mesmo tempo judeus e árabes. Mais ou menos assim: “Abraão não conseguia dormir porque devia 10 milhões a Isaac e não tinha dinheiro para pagar a promissória no dia seguinte”. Sarah perguntou o que havia, ele contou, e ela disse: “Deixa comigo”. Pegou do telefone, ligou pro Isaac e disse: “Você está esperando que Abraão lhe pague a promissória? Pois bem: ele não vão pagar coisa nenhuma porque não tem dinheiro”. E desligou o telefone, dizendo para Abrão: “Agora pode ir dormir, que quem não vai dormir é o Isaac!”
º Quando lhe perguntaram, recentemente, se estava atacando o Collor com sua inefável declaração de que “eleição não é concurso de penteado”, Maluf saiu-se com esta: “Olha, falando assim eu não estou atacando o Collor. Estou é defendendo o Ulysses”.
º Diante da inesperada pergunta de uma espectadora da plateia de um programa de televisão no Rio Grande do Norte, sobre quantas vezes “comparecia” ao leito de sua esposa, dona Sílvia, Maluf não titubeou: “Umas três ou quatro vezes por semana”. Não contente, a espectadora reclamou: “Mas é muito pouco!” Ao que Maluf replicou: “Então, se fosse com você eu precisaria trabalhar menos para poder atender”.
º Outra anedota que Maluf gosta de contar é a do vizir, do folclore árabe. Trata-se de um vizir muito eficiente, sábio e bom administrador. E tanto, que acaba despertando um ciúme mortal no califa a quem serve. Este o chama e faz-lhe um desafio: “Já que é tão maravilhoso,terá de ensinar seu camelo a falar. Se não conseguir, corto-lhe a cabeça!” – anuncia o ciumento califa. O vizir aceita o desafio mas uma ponderação : “Se para ensinar um ser humano é preciso um ano, ou às vezes até dois anos, para um camelo falar eu precisaria…de dez anos”. O califa aceita e, quando o vizir fica sozinho, os amigos vão preocupados a seu encontro. “Como poderá ensinar o camelo a falar?” – perguntam, desesperados, já o vendo sem a preciosa cabeça. O vizir, despreocupado, responde: “Isso eu não sei. O que sei é que em dez anos, ou o camelo estará morto, ou o califa, ou eu”.
“As derrotas me ensinaram”
Maluf, humilde, pede agora uma chance
ISTOÉ – Diante das ultimas pesquisas que lhe chegam às mãos, o sr. Já acha que pode disputar a vitória na eleição de novembro, não?
Maluf– Eu acredito, por um sexto sentido e por pesquisas que eu tenho pessoais, que já estou disputando um lugar entre os dois que chegarão ao segundo turno. E se eu chegar ao segundo turno não tenho dúvida de que posso ganhar a eleição.
ISTOÉ – De qualquer modo, o candidato líder das pesquisas, Fernando Collor, continua tendo em mãos neste momento uma boa parte do voto antes considerado malufista, Como o sr. pretende reconquistar todos esses votos?
Maluf– O perfil do voto, hoje, eu diria que 20% está estabilizado, o restante ainda está livre. Uma boa parte da população ainda está indecisa, não conhece os programas dos candidatos, E outra parte que pretende votar em alguém ainda não está certa de que vai votar nessa pessoa, porque ela pode, afinal, não representar os seus ideais. Tem gente ai interpretando um papel, como artistas num palco, dizendo aquilo que a plateia deseja ouvir. Mas a plateia ainda não está convencida de que aquela representação é idônea e verdadeira. Muita água ainda vai passar por baixo da ponte.
ISTOÉ – O Sr. ataca indiretamente o candidato Fernando Collor. Por que não o ataque direto?
Maluf– A minha campanha é educada, civilizada, Não ataco Collor, nem Brizola, nem ninguém.
ISTOÉ – É sem dúvida um esforço de mudança de imagem.
Maluf– Não. É que não temos tanto tempo na televisão. Temos só dez minutos. Segundo: o nosso dia só tem 18 horas, para conversar com os amigos, correligionários, fazer nossa pregação. E acho que o nosso tempo é pequeno para mostrar o que fizemos e o que queremos fazer. Então eu prefiro gastar meu tempo nesse trabalho do que usá-lo em ataques pessoais aos outros candidatos.
ISTOÉ – Mas o sr. de qualquer forma, realizou um trabalho de abertura de imagem, digamos.
Maluf– Quem sabe o meu trabalho tem sido o de mostrar o verdadeiro Paulo Maluf, aquele que não foi fabricado num estúdio de televisão, nem criado por uma mídia, que apresenta as coisas na base do maniqueísmo. Em 85, o bem era Sarney, Tancredo, e o mal era Maluf. Decorridos quatro anos, póde-se verificar que nem eles eram tão bonzinhos nem eu era mau.
ISTOÉ – Então, a historia esta trabalhando a seu favor?
Maluf– A história, com o tempo, repõe a verdade. Alguns conseguiram repor a verdade depois da morte, como foi o caso do Juscelino. Eu, por sorte, estou conseguindo isso ainda em vida.
ISTOÉ – O sr. é um homem que no começo da vida só colecionou vitórias. Essas derrotas sucessivas dos últimos anos lhe ensinaram alguma coisa?
Maluf– Eu consegui vitórias dos 35 aos 53 anos. Só nos últimos quatro anos é que tenho sido derrotado. Como a Bíblia fala em sete anos de vacas gordas e sete anos de vacas magras, até que tenho sido feliz, é? Mas eu aprendi nessas derrotas. A derrota é pedagógica, ela ensina. A vitória deseduca. Ela coloca em torno de você os áulicos ou, ou na linguagem popular, os puxa-sacos. E a derrota te mostra as verdadeiras causas do acontecido e te mostra os verdadeiros amigos.
ISTOÉ – O sr. já andou revelando nomes de seu hipotético futuro ministério e por coincidências são todos nomes de empresários. É esta a sua ideia de salvação nacional: um ministério só de empresários?
Maluf— Também de empresários. Só, não. O que apresentei foi um perfil dos ministros que desejo. Por exemplo, este governo teve seis presidentes de Banco Central em quatro anos. Isso não existe. Então o perfil do meu presidente de Banco Central é um homem honesto e competente como Amador Aguiar. Se eu tivesse de escolher um ministro da Fazenda, ele teria o perfil de um Afonso Pastore. Se eu tivesse de escolher um ministro de Planejamento, eu escolheria o de um Antônio Ermírio de Moraes. E assim por diante. Para a Indústria e Comércio, eu escolheria o de um Jorge Gerdau Johannpeter, um homem que entende muito de aço.
ISTOÉ — O sr. já conversou com toda essa gente?
Maluf– Não, não conversei com ninguém. Por exemplo, se eu tivesse de escolher alguém em Santa Catarina, escolheria da família Hering ou da família Fontana. No Paraná, eu pegaria o José Eduardo de Andrade Vieira. Quer dizer, esse é o perfil de gente correta e competente, bem-sucedida com seus negócios. Eu me nego a fazer um ministério imposto por políticos viciados que desejam pura e simplesmente fazer as suas nomeações e praticar seus escândalos.
ISTOÉ – Há duas hipóteses otimistas para o sr. nessa subida de índices: chegar ao segundo turno com Collor ou com Brizola. Qual o sr. acha mais fácil de enfrentar no segundo turno?
Maluf— Olha, eu não desejo ser pitonisa, adivinho ou profeta. Mas qualquer que eu venha a enfrentar, ganhando ou perdendo, o meu esforço vai ser de fazer uma campanha eleitoral pedagógica. Veja os Estados Unidos: eles têm 202 anos. Por que hoje as eleições lá basicamente dão certo? Porque eles quebraram muito a cara nestes 202 anos. Então o povo pode até votar errado. Mas precisa saber que se escolher mal ele é que vai sofrer. Eu vou dar os argumentos que podem até não convencer, mas vou tentar. Na verdade, eu tenho feito um esforço para dizer ao povo que aquilo que eu penso pode estar errado, mas é exatamente o que eu penso. Todos sabem: eu perdi as últimas eleições, mas eu pergunto: será que o Brasil ganhou? Então, eu peço ao povo: me deem uma oportunidade e vocês vão ver que o único candidato sincero, de oposição pode transformar o Brasil.