A imagem estampada nas duas páginas anteriores resume com precisão as atuais angústias econômicas e financeiras dos brasileiros: o buraco do ralo é grande; a vazão da torneira, pequena. Pesquisas, teses e manifestações de desespero por todos os lados mostram que pouquíssimas vezes a classe média esteve tão quebrada ou a caminho da falência. A pindaíba generalizada gerou até um novo modismo: os especialistas em administração de finanças pessoais que invadiram rádios, jornais e tevês. Esses jornalistas, contadores, economistas e engenheiros superam em abrangência o comportamento dos analistas tradicionais. Com economês tropicalizado e dicas simples, como resistir aos empréstimos e comprar o ovo de Páscoa a partir do torra-torra das promoções do domingo de Páscoa, eles invadiram a rotina do consumidor. Socorrem o cidadão que toma surras mensais das listas de despesas, vê as economias evaporarem e quer a todo custo desviar o seu Titanic aparentemente indestrutível da rota do iceberg.

ISTOÉ estudou teorias de algumas dessas estrelas da carência: a jornalista Mara Luquet, o engenheiro e economista Luís Carlos Ewald, o economista Marcos Silvestre e o cientista contábil Louis Frankenberg. Além disso, garimpou sugestões nos livros Investimentos, Seu dinheiro e Seu imóvel, do economista Mauro Halfeld, comentarista da Rádio CBN e do jornal O Globo. O objetivo, garantem, não é mudar quem não deseja ser mudado. “O perdulário radical acha o poupador um bobo que não aproveita a vida. O poupador radical acha o perdulário um irresponsável que não pensa no futuro”, revela Silvestre. “Se o sujeito acha que os riscos, o bombardeio dos credores e as eventuais humilhações valem o prazer do momento, problema dele”, conclui. Os conselheiros admitem negociar as proporções de muitas condutas, menos o mandamento de que é proibido gastar mais do que se ganha.

A maior parte dos brasileiros que hoje ganham dinheiro cresceu ouvindo que a moeda não valia nada e que o País era uma ciranda financeira. Por isso, mesmo após dez anos de estabilidade, não aprendeu a lidar com moeda de valor. Gasta mais e poupa menos do que deveria. Os conselhos ajudaram a definir os contornos de Tião Consaldo, o exemplar administrador de finanças, e de seu rival Zé Gastão, as duas personagens do quadro de abertura desta reportagem. Para que a virada seja possível, os especialistas reforçam alguns pontos:

• É sempre possível cortar alguma despesa. Se a situação for perigosa, supere o orgulho e o medo de parecer pão-duro na família. Converse. Mostre que as despesas se aproximaram perigosamente ou superaram a renda. Um filho distante dos livros pode melhorar se descobrir que o custo anual da escola daria, por exemplo, para comprar um carro.

• Informação. “Às vezes, o sujeito se acha conservador mas, no fundo, é mal informado”, explica Mara. “Ele usa a poupança porque, ‘se o banco falir, o governo garante’. Meia-verdade. A garantia vai até R$ 20 mil. Se ele tiver R$ 50 mil, R$ 30 mil irão para o espaço. Quando descobre isso, passa a grana para os fundos de renda fixa e, aí, torna-se um investidor moderado”, completa.

• Fuja a todo custo dos empréstimos, dos juros de cartão de crédito e dos créditos de cheque especial. Vale aqui observar como os conselheiros se comportam. Mara não tem cartão de crédito, cheque, nada. “Só uso cartão de débito, não tenho mais nada”, diz Mara. “Cartão de crédito só para disciplinados que pagam toda a fatura em dia, sem juros. O Brasil possui os maiores juros do planeta. O melhor negócio do mundo é cobrá-los e o pior, pagá-los.” Silvestre possui cheque e um cartão internacional, mas só sai com um deles para compras planejadas. “É preciso manter a carteira vazia para ter a conta cheia”, prega Silvestre.

• Planejamento e controle. Silvestre e Frankenberg anotam em planilhas pessoais todos os gastos, do cafezinho ao almoço, para fechar um contrato. Suas páginas na internet oferecem gratuitamente essas planilhas. “As anotações mostram gastos excessivos e a hora de colocar o pé no freio”, alerta Silvestre, que, coerente, admitiu, na entrevista a ISTOÉ, em um restaurante, a disposição de anotar os R$ 15 gastos na mesa com água e café. A revista pagou a fatura.

• Pechincha. Não existe preço sem juro embutido. Insista no desconto. Se não ganhá-lo, mude de loja ou divida o preço no maior número de prestações, desde que o preço permaneça o original.

• Oportunidade. Negocie com a família o melhor momento de comprar. Ewald costuma comprar presentes de Natal em janeiro e ovo de Páscoa nas promoções
do domingo de Páscoa. Faz suas pequenas compras nos mesmos dias em
que trabalha na Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro. Assim, guarda o
carro de graça no estacionamento do supermercado, dá suas aulas e depois
passa pelas gôndolas.

Se todas essas lições forem capazes de levar o leitor a produzir a sua pequena revolução financeira, a reportagem ao lado será útil para ajudar a definir o que fazer com a sobra de recursos. Porque apostar no futuro é preciso.