US$ 104 milhões foi o valor pago pelas duas refinarias
bolivianas em 1999

Paciência tem limite, teria dito recentemente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao colega boliviano Evo Morales. A decisão da Petrobras de sair da atividade de refino de petróleo na Bolívia, anunciada na semana passada, indica que a habitual paciência de Lula com o hermano Morales está chegando ao fim. E não sem motivo: o governo esquerdista boliviano, que há um ano adota medidas para nacionalizar o setor de petróleo e gás, transferiu para a estatal YPFB as exportações de petróleo reconstituído e de gasolina branca. Pelo decreto, a Petrobras tem de vender os produtos à YPFB pela metade do preço praticado no mercado internacional. Irritado com mais uma medida unilateral e sem aviso prévio, o mandatário brasileiro autorizou a Petrobras a ser mais dura nas negociações.

Além de anunciar a venda das duas refinarias locais da empresa – as únicas do país – para a YPFB, o presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, disse na segunda-feira 7 que irá brigar nas cortes internacionais se a Bolívia não pagar um preço justo por esses ativos. As instalações nas províncias de Cochabamba e Santa Cruz foram compradas em 1999, por US$ 104 milhões. A Petrobras estava negociando a venda do controle para a YPFB e pretendia manter-se como sócia minoritária, mas mudou de idéia. “Não se torna viável mais a nossa participação nas refinarias”, afirmou. O diretor de Abastecimento e Refino da empresa, Paulo Roberto Costa, foi mais longe e disse que “não há clima para manter qualquer investimento” na Bolívia, exceto o mínimo necessário para sustentar a produção de gás naquele país. É exatamente aí, no gás, que reside o maior problema do governo Lula na Bolívia.

A economia do Brasil depende fortemente do gás boliviano para crescer e o País não pode se dar ao luxo de ter o fornecimento interrompido caso haja um agravamento das relações diplomáticas com a Bolívia. O próprio sucesso do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) poderia ser comprometido. Como também não pode ficar refém dos vizinhos nem demonstrar mais sinais de fraqueza aos outros parceiros latino-americanos, como o Paraguai (que quer receber mais pela energia de Itaipu), Lula endureceu com Morales – mas sem perder a ternura. Reduziu o impasse à esfera da estatal, e não a um indesejável conflito diplomático. “Isso é uma briga, por enquanto, da Petrobras, e não uma briga do governo”, afirmou na terça-feira 8.

Como forma de pressão, o governo brasileiro deixou vazar que, enquanto durar a pendenga, ficam suspensos todos os acordos de cooperação econômica (foram assinados 23 desde 2003) e investimentos oficiais do Brasil no país vizinho. Entre eles, a construção de uma ponte sobre o rio Acre. De seu lado, o “durão” Evo Morales sentiu a pressão, amenizou o discurso nacionalista e exortou ao diálogo bilateral. “Estou convencido de que, com países vizinhos como o Brasil, jamais será necessário recorrer às arbitragens internacionais”, afirmou. Se o governo Lula bobear, como fez nos últimos 12 meses, esta será a única opção para a Petrobras defender seus direitos – e os de milhares de acionistas.