Mais uma vez, pornógrafos usam a Constituição americana e suas garantias do direito de livre expressão para garantirem a divulgação de sua produção no país. E, como de outras vezes, acabam fortalecendo ainda mais estas mesmas liberdades de modo geral. Numa histórica decisão com cinco votos contra quatro, a Suprema Corte dos Estados Unidos derrubou uma lei que obrigava os canais do sistema a cabo a impor limites em suas transmissões de caráter sexual explícito. Até então, as emissoras pagas só podiam exibir este tipo de programa no horário entre 22h e 6h. A batalha jurídica iniciada pelo grupo Playboy Entertainment contra a interferência do governo nas exibições resultou em uma decisão que poderá também dificultar os mesmos tipos de intrusões na Internet. “A história da lei de livre expressão é a de defender os casos envolvendo discursos que muitos cidadãos podem achar roto, ofensivo ou mesmo feio”, disse o relator da sentença da Suprema Corte, o juiz Anthony Kennedy. Com isso, a Justiça sepultou mais uma vez as tentativas de censura no país, e colocou o criador de Playboy, Hugh Hefner, no mesmo panteão onde está Larry Flint, outro mercador de obscenidades e campeão libertário.
A decisão poderá não ter efeitos imediatos na programação dos canais a cabo, mas com certeza deverá aumentar a carga horária e as opções de luxúria num futuro próximo. Atualmente 24 milhões de lares americanos recebem os serviços de Playboy, sendo que existem 81 milhões de casas que estão conectadas a sistema de canais pagos. Isso significa que o gênero responde por apenas US$ 177 milhões dos US$ 954 milhões faturados pela indústria anualmente.

As interferências do governo nos métodos do sistema de transmissão datam de 1996, quando a Federal Communications Commission passou a obrigar os fornecedores de TV a cabo a criar mecanismos para proteger as crianças contra a pornografia. Na época existia o “sangramento” de imagens, o que algumas vezes tornava possível para não-assinantes do canal adulto ser captado por outros consumidores. “Com a tecnologia que temos hoje, isso fica difícil e a decisão da Suprema Corte, na prática, tem pouca importância. O maior impacto vem do fato de ela ter mais uma vez afastado as pretensões do governo de controlar o conteúdo da mídia”, diz o advogado Thomas Corliss. “As tentativas de coibir a liberdade de expressão em outros veículos, como a Internet, sofrem também um abalo com este precedente. A corte mostra que não está disposta a ceder espaço para censuras”, diz Corliss.