Em agosto de 2009, ISTOÉ estampava na capa a então candidata à Presidência pelo PV, Marina Silva, sob o título: Brasil não é só PT e PSDB. Desabrochava ali a esperança por uma terceira via política capaz de quebrar a polarização entre os dois partidos hegemônicos da política nacional. Cinco anos e uma eleição depois, está nas mãos de Marina e de seu novo partido, o PSB, o destino da alternativa política a petistas e tucanos. Confirmada, a ascensão de Marina à cabeça da chapa consolida a terceira via e altera os rumos da eleição presidencial. A disputa até então tinha tudo para ganhar um caráter plebiscitário cujo desfecho poderia até se dar no primeiro turno das eleições, no dia 5 de outubro. Com a candidatura de Marina pelo PSB, com possibilidades de largar com pelo menos 16% das intenções de voto (o dobro dos índices de Eduardo), as chances de segundo turno se multiplicam, já que no cenário anterior a diferença entre a primeira colocada Dilma Rousseff (PT) e a soma de todos os outros candidatos era apertadíssima.

02.jpg

Ao longo da semana, de maneira compreensível, políticos do PSB evitavam publicamente entabular projeções sobre o futuro. Destinatária de 20 milhões de votos, a vice Marina, como era de se esperar, adotava a mesma postura. Visivelmente abalada, desautorizou qualquer articulação sobre uma provável candidatura. Em reservado, porém, membros do partido e da coligação “Unidos para o Brasil” não conseguiam escapar do tema sucessão. Embora a solução seja menos simples do que aparenta, já que ainda será preciso pacificar as notórias diferenças entre o PSB e os apoiadores de Marina oriundos da Rede , além de azeitar os palanques regionais, até a sexta-feira 15 os socialistas convergiam para a consolidação da ex-senadora como candidata ao Planalto. Pelo raciocínio dos integrantes do PSB, mesmo que haja algumas defecções, e elas são consideradas naturais, essa seria a única saída para evitar a implosão da aliança e consequentemente da candidatura. A despeito do constrangimento geral, coube ao único irmão de Eduardo Campos, o advogado Antonio Campos, escancarar o desejo pela candidatura da ex-ministra do Meio Ambiente. “Marina vai agregar valor à chapa presidencial e ao debate no Brasil”, afirmou ele. “Se meu irmão chamou Marina para ser sua vice, com essa atitude ele externou sua vontade”, acrescentou Antonio Campos, confiante de estar defendendo a posição que o ex-candidato aprovaria. “Acho que o mundo está nas mãos daqueles que têm coragem de sonhar e de correr riscos para viver seus sonhos”, encerrou ele. Na quinta-feira 14, uma das alas do PSB passou a defender o nome de Antonio Campos para ocupar o posto de vice de Marina. No fim de semana, a opção seria submetida aos demais integrantes do partido. A preferência de Marina, porém, recai sobre outro nome: o da viúva Renata Campos. Para Marina, além de Renata ser familiarizada com administração pública, por ser auditora do Tribunal de Contas de Pernambuco, a inclusão dela na chapa seria uma bela jogada de marketing político.

01.jpg
A HERDEIRA
Abalada emocionalmente, Marina Silva evitava, na semana passada,
projeções sobre o futuro político, mas sua candidatura se impõe

Na sexta-feira 15, estrategistas do PSB, o marqueteiro Diego Brandy incluído, faziam os ajustes necessários para adaptar os programas do horário eleitoral gratuito do partido à nova realidade. A propaganda na tevê começará na terça-feira 19. Para o meio político, o horário eleitoral marca o início da campanha de fato. É quando os candidatos atingem o maior contingente de eleitores. Nesta eleição, os últimos meses que antecedem o escrutínio das urnas ganharam um novo ingrediente: na atual fase da campanha o número de indecisos supera em quase duas vezes a média das três últimas eleições (2002,2006 e 2010). De acordo com a pesquisa ISTOÉ/Sensus, hoje os que ainda não sabem em quem votar somam 46 milhões de eleitores, cerca de 33% do eleitorado – contra 18% dos últimos pleitos. No PSB, a expectativa é de que Marina atraia parte expressiva desse eleitor claudicante. Acreditam que, por dialogar com os setores sociais que ocuparam as ruas do País em junho e julho de 2013, ela será capaz de encarnar o “novo” e a “mudança”, trazendo de volta à ribalta a turma dos desiludidos com a política. Além, é claro, de ser depositária da esperança de fatia dos eleitores por “representar um herói morto”. Seria a junção, segundo palavras de um socialista, do “voto de protesto” com o “voto do luto”. Não por acaso, Eduardo Campos, morto tragicamente num acidente aéreo na quarta-feira 13, será a estrela do primeiro programa de tevê da coligação. A peça de propaganda política trará Campos ao lado de Marina Silva, com pequenas inserções em homenagem à memória do líder socialista. A partir do dia seguinte, a lógica muda e Marina passa a ocupar o primeiro plano.

03.jpg

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

Quem aparentemente mais perde com a substituição de Eduardo por Marina, o PT já refaz as contas para tentar liquidar a eleição no primeiro turno – o principal objetivo do partido desde o início da campanha. Se antes reinava o otimismo, agora os petistas são quase unânimes em afirmar que o cenário aponta para a realização da eleição em duas etapas. Para evitar a sangria de votos nesse momento de luto, os petistas decidiram entrar no clima de comoção nacional. Por isso, o marqueteiro João Santana se moveu às pressas no fim da semana para inserir nos primeiros programas de Dilma na tevê um depoimento dela e do ex-presidente Lula lamentando a morte de Eduardo Campos. Na quarta-feira 13, logo que soube da notícia, Dilma seguiu o script. Decretou luto oficial, suspendeu os eventos de campanha, se revelou “tristíssima” com o trágico acidente que tirou a vida do ex-adversário e se referiu a ele como “grande companheiro e grande brasileiro” por quem nutria muito “respeito”.

04.jpg

Tal como o PT, o PSDB também avalia destacar na propaganda eleitoral a relação de amizade e comunhão de ideais entre Aécio Neves e Campos. No início da noite da quarta-feira 13, o tucano fez um pronunciamento no qual elogiou o ex-governador de Pernambuco, qualificando-o como “valoroso, um homem público especial e um grande amigo”. Para Aécio, Campos era um dos maiores representantes da boa política. De fato, apesar de estarem em trincheiras distintas, Aécio e Campos mantinham uma ótima convivência. Desde o início da campanha, não ficaram uma semana sequer sem se falar ou trocar mensagens pelo celular. No próprio PSB, já havia quem considerasse o caminho de Campos rumo à oposição sem volta. Atravessado o rubicão, seria natural o apoio a Aécio num segundo turno. Agora, entre os tucanos, o raciocínio é que, se a presença de Marina na corrida eleitoral praticamente sela o segundo turno, ao mesmo tempo corre-se o risco de a ex-senadora se consolidar em segundo lugar, deslocando Aécio para terceiro e eliminando-o da disputa. Por isso, o partido se reunirá no início desta semana para rediscutir as estratégias de campanha. Diante da perplexidade com a morte trágica de Eduardo Campos, os políticos ainda parecem tatear no escuro. No PSDB e no PT, sobram dúvidas em relação a um cenário ainda nebuloso. Em comum, entre tucanos e petistas está a convicção de que as eleições de 2014 não serão mais as mesmas.

O ÚLTIMO RETRATO ELEITORAL

Nas campanhas eleitorais, as pesquisas são retratos da imagem dos candidatos junto aos eleitores em um determinado momento. Para Eduardo Campos, um último retrato foi revelado nos quatro dias que antecederam sua morte, na quarta-feira 13, em um acidente aéreo na cidade de Santos (SP). No período de 9 a 12 de agosto, brasileiros de 136 cidades em 14 Estados demonstraram, nas respostas dadas aos entrevistadores da pesquisa ISTOÉ/Sensus (registrada no Tribunal Superior Eleitoral sob o número BR – 00336/2014) que o apoio à candidatura de Campos havia aumentado em um ritmo um pouco mais rápido que os dos adversários Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB), desde o levantamento feito há um mês. Na votação estimulada, Campos foi o escolhido por 9,2% dos entrevistados, dois pontos percentuais a mais que na enquete anterior. Oscilou dentro da margem de erro (de 2,2%), assim como os demais candidatos, mas de forma mais significativa. Dilma subiu de 31,6% para 32,7%. Aécio saiu de 21,1% para 21,4%. O resultado – que em virtude da fatalidade deixa de ter interesse eleitoral para se tornar apenas um registro histórico – revelou o efeito de um maior conhecimento do candidato e suas propostas às vésperas também do início da propaganda gratuita na tevê.

Com reportagem de Claudio Dantas Sequeira, Josie Jeronimo e Ludmilla Amaral 


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias