As manifestações e conflitos de rua estão deixando os inquilinos do Palácio do Planalto atordoados. Isso ficou evidente ao longo da última semana. Enquanto protestos pipocavam País afora, os principais assessores presidenciais batiam cabeça até em decisões corriqueiras, como a polêmica sobre a participação do presidente Fernando Henrique Cardoso na visita, na sexta-feira 26, às obras da usina hidrelétrica Luís Eduardo Magalhães, no Tocantins. Os “arapongas” do Palácio advertiam sobre a possibilidade de manifestações estudantis hostis a FHC. O ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Alberto Cardoso, chegou a vetar a viagem na manhã da quarta-feira 24. Horas depois, a decisão foi revogada. A área política do governo avaliou que isso só serviria para difundir a imagem de que o presidente estava sitiado em Brasília. Coube ao secretário-geral da Presidência, Aloysio Nunes Ferreira, a tarefa de convencer Fernando Henrique a manter a programação. Depois de passar a semana reclamando das manifestações, o próprio presidente acabou reconhecendo que estavam indo longe demais. “Está havendo um exagero dentro do governo na avaliação dos protestos”, admitiu FHC em conversa com assessores na quinta-feira 25.

Foto: Ricardo Stukert

BRASÍLIA Funcionários públicos na Esplanada: sem acordo

Os exageros não partem só dos arapongas do general Cardoso. Também vêm da área econômica. Há dois meses, o governo teve a chance de se livrar do garrote do Fundo Monetário Internacional. Chegou a decidir pagar de uma só tacada o saldo final de U$ 8,9 bilhões do empréstimo tomado ao FMI e ganhar autonomia para fazer correções na política econômica. A turma do ministro da Fazenda, Pedro Malan, resolveu, porém, pagar US$ 7,1 bilhões, deixando um débito de US$ 1,8 bilhão, para continuar sob a tutela do fundo. “Correríamos o risco de acenar para o mercado com uma política de volta da inflação”, argumenta um assessor da equipe econômica. Outra opção questionável ocorreu na virada do ano. Em janeiro, o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Amaury Bier, propôs que se aproveitasse o cenário internacional favorável para promover uma redução mais expressiva das taxas de juro. O Banco Central não topou. Preferiu agradar aos especuladores nacionais e internacionais, mantendo a política conservadora de pequenas reduções dos juros. Vieram as turbulências no mercado financeiro internacional e agora as taxas estão engessadas em nível exageradamente alto. “Em vez de baixar os juros, o governo preferiu ficar traçando cenários róseos para o futuro. Mais uma vez, a equipe econômica perdeu uma excelente oportunidade e repetiu o círculo vicioso que levou ao desastre na política cambial”, critica o líder do PPS no Senado, Paulo Hartung (ES). Não dá para negar que foi uma opção coerente do governo. Há tempos é a banca internacional que dá as cartas na política econômica. Em entrevista publicada na segunda-feira 22 pelo jornal Valor, o ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros colocou lenha na fogueira. Ele contou bastidores das discussões, em 1997, da elaboração do “pacote 51” de medidas de ajuste fiscal para enfrentar o terremoto causado pela crise asiática. “O ministro Malan exagerava: ‘Ah, se fizer isso, Wall Street vai reagir mal”, lembrou Mendonça sobre a postura submissa do ministro da Fazenda. Pior foi a reação do atual chefe da Casa Civil da Presidência da República, Pedro Parente. Mendonça de Barros reclamou do corte de metade do valor das bolsas dos estudantes no Exterior, que atrapalharia a vida dos quadros brasileiros em aperfeiçoamento em outros países, em troca de uma economia de apenas US$ 80 milhões. “Wall Street quer sangue”, tentou justificar Pedro Parente. E o governo deu sangue: abriu o pacote de maldades causando recessão, desemprego e arrocho salarial. Algumas medidas, porém, serviram apenas para agradar aos banqueiros internacionais, mas nem sequer saíram do papel. Requentar pacotes é também uma especialidade do governo FHC.