Pode ser efeito da cachaça ou do ritmo hipnotizante do forró. Turistas e cariocas descolados estão descobrindo as delícias da Feira de São Cristóvão, um enclave nordestino na zona norte do Rio de Janeiro inaugurado há mais de 20 anos. O bate-coxa com música ao vivo virou febre entre os modernos habituados ao som techno das boates. Já os estrangeiros, sem a malemolência necessária para encarar passos de nomes exóticos, como o lustra-fivela e a umbigada, preferem percorrer as 818 barracas de comes & bebes. E tome tapioca, beiju, feijão-de-corda, buchada de bode, sarapatel. “Os gringos ficam loucos. Perguntam e querem experimentar tudo. Mas são meio pão-duros para comprar”, diz a cearense Débora da Conceição, dona de uma das tendinhas de doces típicos mais concorridas da feira.

Débora nunca estudou inglês. Para se comunicar com os estrangeiros, usa a linguagem dos gestos. Difícil é explicar os ingredientes de cada guloseima, uma lição aprendida a duras penas pelo professor de Biologia Hervé Bonnaveira, 25 anos. “Às vezes, venho para comprar coração de boi inteiro. Não existe nada parecido na França”, derrama-se ele.

Nem na França nem no resto do Brasil, garantem os barraqueiros, que desde o início dos anos 90 reivindicam uma infra-estrutura mais adequada para receber cinco mil pessoas a cada sábado: banheiros, estacionamento legalizado, tendas padronizadas. Eles também estão brigando para permanecer em seu espaço atual, ao redor do Pavilhão de São Cristóvão, onde a prefeitura quer montar um complexo de turismo e lazer. “Nossa idéia era montar as barracas dentro do pavilhão, para poder receber mais gente com mais higiene e conforto”, afirma o líder dos barraqueiros, Agamenon da Silva.

Foto: Carlos Magno

Já o francês Hervé é um guloso apreciador da culinária nordestina

Os frequentadores agradecem o empenho. Para os artistas de circo Daniela de Castro e Cláudio Parente uma das atrações da feira é a segurança garantida, nada das brigas cada vez mais comuns em outros points da noite carioca. “Apesar da balbúrdia, a visita vale a pena. Mesmo para quem, como nós, é vegetariano e nem passa perto das comidas típicas”, afirma Cláudio.

Os músicos Bertrand Doussain e Sandro Márcio, do grupo Farofa Carioca, não perdem um agito das noites de São Cristóvão. Na semana passada, levaram a amiga Mayra Gomes para conhecer o espaço. Chegaram a ensaiar uns passinhos de forró, antes de passear pelas barracas de carne fresca e apreciar o trabalho dos artesãos locais. “O ambiente é familiar. Você dança, come bem e compra artesanato da melhor qualidade. É um programa imperdível”, diz Mayra.
Melhor ainda se acompanhado de um cigarrinho de palha Arapiraca. O maço com 12 unidades sai a R$ 3 na barraca do paraibano João Manuel da Silva, dez anos no lugar. “Antes a feira era coisa só de nordestino com saudades de casa. Agora, tá cheio de turista e dessa garotada que usa brinco no nariz. Eles acham graça em comprar fumo de rolo e em pitar um cigarrinho de palha. Quando não falam a minha língua, mostro o preço nos dedos. Não é que dá certo?”