Até maio de 1999, um visitante se perdia a cada dez dias no Parque Nacional da Tijuca, encravado no coração do Rio de Janeiro. No último caso trágico registrado, pai e filho tentaram subir o Bico do Papagaio e só saíram do mato 18 horas depois, resgatados pelo Grupo de Defesa Ambiental. Pela primeira vez em 25 anos, o parque – a segunda maior floresta urbana do mundo, visitada anualmente por dois milhões de turistas – comemora um ano inteiro sem nenhum visitante fora de rota em seus 3,2 mil hectares. A boa notícia é fruto de um bem-sucedido contrato de gestão compartilhada entre o Ibama e a prefeitura. Trilhas foram sinalizadas, cinco quilômetros de atalhos fechados, lixo e entulho recolhidos e contratos de parceria assinados. Cerca de R$ 6,5 milhões saíram dos cofres de empresas privadas para preservar e modernizar o parque.

A grandeza da floresta levou a Unesco a conceder-lhe, em 1991, o título de Reserva da Biosfera. Agora, ela se prepara para o próximo passo: candidatar-se a Patrimônio da Humanidade. Suas montanhas cobertas de Mata Atlântica compõem um enorme paredão verde, dividindo a cidade ao meio. Tanta exuberância faz do Rio uma metrópole privilegiada, onde os moradores não precisam
esperar o fim de semana para respirar ar puro. A natureza fica ao alcance das mãos, ou melhor, dos pés. São 39 trilhas, 42 vales, 43 córregos e rios, dois lagos, 43 cascatas e cachoeiras, 19 represas e 61 grutas e cavernas.

Braile – Em breve será aberta ao público uma trilha circular de longa duração, rodeando o parque num percurso de seis dias. Há ainda um projeto interessante em gestação: o trilha Braile. Para percorrer 2,5 quilômetros, deficientes visuais terão o auxílio de um corrimão de corda pontilhado por anéis de metal com informações sobre as diferentes regiões da floresta. “Acabamos com a face negra do Parque Nacional da Tijuca”, comemora o gerente do parque, Luiz Otávio Langlois, referindo-se aos casos de visitantes que se perdiam na floresta. Desde que a gestão compartilhada começou, Langlois e o diretor Pedro Menezes da Cunha, trilheiros desde criancinha, promovem uma megafaxina na floresta.

Foto: Carlos Magno

Segurança trilhas sinalizadas agora evitam que o visitante se perca

A idéia de dividir a gestão do parque com outro órgao público foi importada do Parque Nacional da Península do Cabo, a maior floresta urbana do planeta, na Cidade do Cabo, África do Sul. As duas reservas são consideradas irmãs gêmeas: estão nas montanhas e cercadas por metrópoles em crescimento permanente. Os principais pontos turísticos do Rio estão no Parque Nacional da Tijuca. Do Cristo Redentor à Pedra da Gávea, passando por trilhas selvagens às margens de praias desertas e outras nem tanto. “Explorar trilhas é um hábito saudável que incorporei a minha vida”, diz Nelson Dart, 47 anos, viciado em caminhadas pela floresta. Depois de trilhar a primeira, do Parque da Cidade ao Horto – braços do Parque Nacional que cobrem os bairros do Jardim Botânico e Gávea –, há três anos, o bancário não parou mais. Nos fins de semana, ele e mais 25 colegas participam dos passeios gratuitos do projeto Trilharte-Redley. Rodeados pela mata praticamente virgem, trilheiros de carteirinha ou urbanóides que querem desestressar em pouco tempo se esquecem do burburinho da cidade.

Café – Em muitas trilhas, há ruínas e escadas de pedras construídas por escravos – resquícios dos tempos áureos do café. Um dos plantadores pioneiros foi o conde Gestas, nobre francês que chegou ao Brasil em 1810, fugido da guerra napoleônica. Em pouco tempo, os morros foram desmatados para abrigar os pés de café do conde. O projeto de reflorestamento, aprovado em 1861, levou 12 anos para ser concluído. Cem anos depois, o governo federal criou o Parque Nacional da Tijuca, que abrange os morros do Corcovado, Sumaré, Gávea Pequena, Andaraí, Tijuca, Três Rios, Pedra da Gávea e Pedra Bonita. É um patrimônio nacional, com 600 espécies vegetais e 300 espécies de animais de pequeno e médio portes. Poetas, seresteiros e namorados sempre exaltaram as belezas do parque, mas foi o poeta francês Paul Claudel quem melhor traduziu sua imponência: “O Rio de Janeiro é a única grande cidade das que conheço que não conseguiu expulsar a natureza.” Os diretores do Parque Nacional da Tijuca se esforçam para imortalizar a frase do poeta.