Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) vivem se queixando do acúmulo de trabalho. Concebido para analisar apenas questões constitucionais, volta e meia o STF se vê diante de processos envolvendo brigas de vizinhos ou batidas de automóveis. Pois há um assunto que deveria ser abordado pelo Supremo: a decisão, tomada na semana passada na 20ª Vara Criminal de São Paulo, de retirar do mercado a biografia Roberto Carlos em detalhes, escrita pelo historiador Paulo Cesar Araújo. O autor e a editora Planeta se comprometeram a não republicar a obra e recolher os exemplares disponíveis nas livrarias. É uma vitória do “Rei” – e uma derrota da liberdade de expressão no País. Trata-se de um assunto repleto de nuances. Afinal, se a Constituição garante que são “invioláveis a intimidade, a vida privada”, ela também estabelece o direito à livre expressão.

A discussão é antiga. Até onde o interesse público se sobrepõe à vida privativa das pessoas? A proibição à biografia de Roberto não pode significar uma brecha para a censura? É bom lembrar que o cidadão em questão, o Rei Roberto Carlos, é uma personalidade, que tem como um dos pilares de sua carreira justamente a exposição pública. Também deve-se considerar que os famosos escancaram suas vidas pessoais para manter os holofotes (e o interesse dos fãs) brilhando sobre eles. Nesses casos, eles não se queixam da invasão de privacidade. O tema exige um debate amplo. Talvez o STF pudesse seguir o exemplo de outra casa jurídica, o Superior Tribunal de Justiça, que realiza um amplo painel com especialistas a respeito do momento em que a vida realmente tem início. As conclusões serão utilizadas nas decisões sobre pesquisa com células-tronco, por exemplo. O STF poderia fazer algo semelhante para nortear a Justiça a respeito da velha dicotomia entre público e particular.