Em plena era digital, quando os efeitos e as definições de infinitos megapixels seduzem cada vez com mais sofisticação os espectadores, um grupo respeitável de artistas brasileiros faz sucesso levando filmes e programas de televisão para o teatro. Peças como “220 Volts”, “Se Eu Fosse Você” e “Meu Passado me Condena”, nascidos na tela, têm seus ingressos esgotados em questão de horas e estão chamando o público e a atenção das produtoras de volta para as casas de espetáculos. Estrela de “220 Volts” — que fez sucesso de 2011 ao ano passado no canal a cabo Multishow —, Paulo Gustavo, que atua e assina o roteiro, diz que são dois os motivos que o levaram a criar a versão de palco: a repercussão na internet e “saudades”. E elenca o ritual que o encanta: “Me preparar por trás das cortinas, o feedback do público, a possibilidade de amadurecer o personagem, toda essa dinâmica teatral me faz mais realizado.”

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"Se eu fosse você"
Segunda maior bilheteria do cinema brasileiro voltou aos palcos no
formato musical, uma das tendências do mercado de entretenimento

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Segunda maior bilheteria do cinema nacional, “Se eu Fosse Você” (2006) virou musical. Depois do sucesso no Rio de Janeiro, este ano, o espetáculo se prepara para estrear em São Paulo. Já o longa campeão de público, “Tropa de Elite”, teve sua versão cênica vetada pela alta complexidade operacional, considerada inviável para o teatro. A série “Meu Passado me Condena”, com Miá Mello e Fábio Porchat, pulou do Multishow para o cinema e, deste, para o teatro. Agora acaba de estrear em São Paulo.

Por terem histórias de sucesso em outras mídias, essas peças estreiam com altas expectativas de atuação tanto nos palcos quanto nas bilheterias. Fernando Campos, diretor de “Se Eu Fosse Você”, afirma que, apesar do sucesso de público, as leis de incentivo ainda são vitais para a indústria cultural no teatro. “Sem isso, nenhuma produção de grande porte se viabiliza.” A professora de teatro da PUC-Rio Vera Novello diz que tudo depende do custo de produção e do elenco. “Se contar com um artista querido da televisão e do grande público, a peça consegue até se bancar com o dinheiro dos ingressos, mas isso ainda é muito raro”, afirma. Ela alerta, porém, para produções caça-níqueis, que fazem o espetáculo perder a qualidade.

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“Só funciona se for algo devidamente adaptado para o teatro. Se for para produzir o espetáculo apenas porque fez sucesso em outra mídia, tem grandes chances de desapontar.” Paulo Gustavo defende o ineditismo em suas peças: “A maior parte do texto é original, mantenho só alguns jargões ou falas muito famosas das personagens, mas adaptar é sempre muito difícil, porque também é preciso manter a essência”.

O professor de direção teatral da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) José Henrique Barbosa Moreira explica que hoje existe um número muito maior de meios e uma velocidade cada vez mais alta na migração de um veículo para outro. Fábio Porchat é um dos rostos desse entrelaçamento de meios. Seus projetos passam, paralelamente, por teatro, internet, televisão e cinema e não necessariamente nessa ordem. Porchat garante que os vídeos que disponibiliza gratuitamente na rede não ameaçam o sucesso do espetáculo. “Tem gente que vem cobrar no fim do espetáculo porque eu não fiz aquela piada que está no Netflix. O público quer ver aquilo ao vivo e só o teatro tem isso.” E confidencia: “Meu sonho é fazer um musical do Porta dos Fundos”, referindo-se ao programa que é estrondoso sucesso na internet. A notícia é boa para os oito milhões de fãs que seguem o canal no YouTube. Se o desejo do humorista se concretizar, a luta por ingressos promete ser boa.

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Fotos: Paprica Fotografia; Divulgação