O que a natureza cria, a ciência copia. Também é assim no terreno esportivo. Todo treinador de atletismo, por exemplo, sonha em promover a evolução física de um atleta e, nesse sentido, uma nova terapia de manipulação de genes, chamada “doping genético”, está sendo cogitada como instrumento de aprimoramento do corpo – e não sem motivo, uma vez que já se comprovou cientificamente que as gerações se sucedem transmitindo naturalmente alguns de seus traços e de seus “dotes” nos mais diversos campos das potencialidades humanas. Voltando novamente ao campo do esporte, serve de exemplo o recordista mundial do salto com vara, o ucraniano Sergei Bubka, cujo filho Sergei Bubka Junior é um dos melhores tenistas do mundo. No Brasil, há a linhagem de Nelson Piquet, pai e filho. Claro que tal “cadeia genética” não se constitui regra e nem dá para se falar em determinismo dos genes – Pelé se fez um gênio no futebol, mas seu filho, o goleiro Edinho, não foi sequer a mais pálida sombra do pai nos gramados. No terreno mais específico ainda do atletismo, no entanto, o peso genético parece ser cada vez maior e o DNA carrega informações que funcionam como uma espécie de currículo orgânico. É para essa modalidade que alguns times de futebol estão olhando, na tentativa de importar, para si, os “tratamentos genéticos” que podem fortalecer sobretudo os músculos dos atletas.

Equipes européias como o Manchester United, Real Madrid, Celtic e o San Francisco Giants pensam em contratar o cientista escocês Henning Wackerhage para “fazer testes genéticos em atletas, na busca de indícios de um potencial de alto nível”. Outros sonham mais longe. “O técnico de um grande time me procurou para saber se eu poderia injetar em todos os jogadores o gene que, em minhas experiências nos laboratórios, transformou camundongos em super-ratos, com músculos incrivelmente potentes”, diz H. Lee Sweeney, responsável pelo departamento de fisiologia da Faculdade de Medicina da Universidade da Pensilvânia.

Além dos futebolistas, a demanda vem também de equipes de beisebol, esporte que exige músculos de ferro. Qualquer que seja a modalidade, no entanto, a possibilidade dessa forma de “doping genético” cai no campo da discussão ética. “A manipulação de genes não pode se prestar a isso, é para tratar doenças”, diz Wackerhage. Pensa diferente o seu colega Sweeney: “Estamos contribuindo para que os atletas obtenham melhor desempenho.” Enquanto esses limites são discutidos, a empresa australiana Genetic Technology já oferece a US$ 100 testes de DNA para “classificar o potencial esportivo” de interessados. O gene que está em jogo é o ACTN3, responsável pela produção da alfa-actinina-3, proteína que contribui para os músculos gerarem contrações forçadas e repetidas. O “doping genético” é, pura e simplesmente, induzir esse gene a mutações que tornem a musculatura mais ágil, explosiva e resistente.

Essa manipulação de genes pode ser, na verdade, um atalho no caminho da capacidade crescente dos cientistas para alterar a atividade genética de adultos, fazendo com que suas células se comportem de forma diferente daquela para a qual foram naturalmente programadas no nascimento do indivíduo. A equipe americana de Sweeney acredita que tais métodos poderiam ter implicações de tirar o fôlego no tratamento e na prevenção de doenças. Em seu laboratório, Sweeney injetou o gene IGF-1 (hormônio chamado fator de crescimento tipo insulina1) em um camundongo. O resultado impressionou: enquanto os demais roedores perderam cerca de 25% da força muscular devido à idade, o rato apelidado de Schwarzenegger estava com as pernas mais fortes do que nunca. E carregando peso descomunal como se arrastasse um mero pedaço de queijo.