Na virada dos anos 70, a juventude ainda dividia-se entre fãs dos Beatles e dos Rolling Stones. É um período curioso, que pode ser revivido sob a ótica de seus protagonistas em dois livros recém-lançados no Brasil: Lembranças de Lennon (Conrad, 166 págs., R$ 19,80), de Jann S. Wenner, e Os Rolling Stones no Brasil – da descoberta à conquista (1968-1999) (Ampersand, 292 págs., R$ 75), de Nélio Rodrigues. O primeiro traz a íntegra da famosa e polêmica entrevista concedida por John Lennon, em 1970, já como um ex-Beatle, e publicada em 1971 com cortes no então jornal americano Rolling Stone. No prefácio escrito pela viúva de Lennon, a artista plástica Yoko Ono, ela diz que o ex-fab four não é sutil nem mesmo particularmente esperto. Atira para todos os lados. Começando pelos ex-parceiros. Sobre o álbum McCartney, de Paul McCartney, diz que é tolo; All things must pass, a obra-prima de George Harrison, tacha de meloso; Beaucoups of blues, de Ringo Starr, define como um bom disco mas….”Pelo menos não me constrange tanto quanto o anterior.” Seus colegas de profissão, então, não merecem misericórdia. “Os Beatles decidiram não se mover como Elvis, depois veio o Mick Jagger e ressuscitou aquela idiotice de rebolados”, fulmina.

De fato, desde 1967, os Stones rebolavam. Mesmo sem querer. Lançavam discos entre temporadas na cadeia, o que impedia a realização de shows e lhes dava consequentes férias. A primeira parte do livro de Nélio Rodrigues – biólogo de formação que se dedica à pesquisa musical –, que inclusive tem um autógrafo de Jagger, faz um verdadeiro dossiê das visitas individuais dos componentes do grupo ao País. Jagger veio ao Brasil regularmente a partir de 1968. Com Keith Richards, que trouxe na segunda vinda, compôs Honky tonky women na Fazenda Boa Vista, propriedade do banqueiro Walter Salles, situada em Matão, interior de São Paulo. Sempre bem acompanhado por Marianne Faithfull, Bianca Macias e Jerry Hall, estas duas últimas esposas de fato, Jagger voltaria várias vezes aos trópicos, onde sua banda finalmente se apresentou, em 1995. Mas seria na segunda turnê dos Rolling Stones pelo Brasil, em 1998, que ele conheceria a hoje apresentadora Luciana Gimenez. O encontro se deu na véspera do show de estréia no Rio de Janeiro, durante uma festa em Santa Tereza. Depois de borboletear pelo salão, sendo rechaçado, entre outras, pela cantora Simone Moreno, mulher do guitarrista Pepeu Gomes, avistou Luciana.

Os dois desapareceram durante meia hora, provocando comentários. Voltaram sorridentes do jardim. No ano seguinte, enquanto Jerry Hall literalmente movia céus e infernos para conseguir o divórcio do cantor, no dia 18 de maio nascia em Londres Lucas Maurice Morad Jagger, filho de Luciana e Mick. Como se vê, os dois livros trazem flashes íntimos e reveladores de personalidades planetárias. A diferença é que, enquanto Lennon se esforçava para lembrar as próprias peripécias, Jagger, certamente, hoje gostaria de ver algumas das suas esquecidas.