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Surgido nas redes sociais há um ano, o bordão “Imagina na Copa” se tornou uma advertência contra o futuro sombrio que estava por vir. Se o trânsito não fluía, se o voo atrasava, se manifestantes promoviam quebradeiras, se qualquer indicador negativo aparecesse, alguém sempre evocava o “Imagina na Copa” para lembrar que os brasileiros estavam prestes a viver o próprio inferno na terra. O Mundial no Brasil começou há dez dias – e ninguém poderia imaginar que ele seria tão bacana. Na quinta-feira 19, o trem que levou torcedores à Arena Corinthians para a partida entre Uruguai e Inglaterra era uma festa de gritos, bandeiras e fantasias, e quem estava ali desfrutou de uma atmosfera contagiante que ficará cravada na memória por muito tempo. O jogo, que terminou com a vitória do Uruguai por 2 a 1 depois de dois gols do brilhante atacante Luis Suárez, teve momentos épicos e provavelmente será lembrado por gerações. O mais surpreendente é que os fatos descritos acima não são exceções. Eis aqui uma verdade inegável: o Brasil está realizando uma Copa extraordinária. E por diversos motivos: recordes de gols, estádios sempre lotados, show das torcidas também nas ruas, embates cheios de drama e emoção. Quem poderia imaginar tudo isso?

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Será esta a melhor Copa da história? Impossível responder com certeza, mas os sinais são promissores. E quem diz isso são as estrelas que fazem ou que já fizeram o espetáculo. Craque da seleção alemã em dois Mundiais e atualmente técnico dos Estados Unidos, Jürgen Klinsmann vai direto ao ponto. “Nunca vi uma Copa como essa, com os times apresentando tanta vocação ofensiva”, diz ele. Artilheiro da Copa de 1986, o inglês Gary Lineker encantou-se com o hino cantado à capela pelos torcedores brasileiros. “Não dá para competir com isso”, afirma ele. Capitão da seleção italiana campeã do mundo em 2006, Fabio Cannavaro declarou que nunca houve uma primeira fase com jogos tão espetaculares. Entre os brasileiros, a percepção é a mesma. “O nível da Copa está altíssimo”, diz Roberto Dinamite, que defendeu o Brasil nos Mundiais de 1978 e 1982. “Ainda estou procurando entender o motivo de tantos gols”, fala Carlos Alberto Torres, o capitão do tri. “O Mundial está bom de se ver, com jogos interessantes e o clima dos torcedores no Brasil”, diz Zico, um dos maiores craques da história. Meio-campo convocado para o Mundial de 1990, Tita é só elogios. “De 1990 para cá, essa é a melhor Copa em termos de futebol e de público”, diz o ex-jogador do Flamengo. “Tenho amigos mexicanos hospedados na minha casa e eles admitiram que estavam preocupados porque só viam notícias ruins sobre o Brasil. Agora, disseram que estão encantados.”

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Alguns indicadores confirmam a excelência dos jogos realizados no País. Após o encerramento da primeira rodada, foram marcados, em média, 3,06 gols por partida. É a melhor marca desde a Copa de 1958. O número surpreende porque o futebol mudou nas últimas décadas. Os sistemas defensivos ficaram mais eficientes e a disparidade técnica entre os times diminuiu. Não existem mais aquelas seleções bisonhas, os sacos de pancadas que faziam a alegria dos atacantes. O que poderia explicar a fartura observada no Mundial do Brasil? Para Klinsmann, uma das razões está na geração excepcional de jogadores. “Há muito goleador em grande forma”, diz o técnico alemão que comanda os Estados Unidos. O brasileiro Neymar, o uruguaio Suárez, o francês Benzema e os holandeses Van Persie e Robben fizeram dois gols em uma única partida. O alemão Thomas Müller marcou três. Além deles, o argentino Messi brilhou com um golaço e o inglês Rooney balançou as redes pela primeira vez em uma Copa do Mundo.

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Dentro de campo, os números da Copa no Brasil são superlativos. Na primeira rodada, o tempo de bola rolando foi de 70 minutos por partida. Para efeito de comparação, na primeira rodada do Campeonato Brasileiro a marca mal chegou a 54 minutos. Como se deu o milagre? A resposta é fácil: os times estão fazendo menos faltas. Foram, em média, 26,6 infrações por jogo na primeira semana de Copa, dado muito abaixo do registrado em 2002 (35,4), ano da última conquista mundial do Brasil. O resultado disso tudo é um jogo que flui melhor, mais dinâmico e de maior qualidade. Os jogadores acertaram ao final da primeira rodada 86% dos passes, o maior percentual da história das Copas (o recorde era o de 2006, com 84,1% de precisão). Pirlo, da Itália, acertou 95% dos passes que tentou contra a Inglaterra. O Mundial no Brasil parece ser o de recordes. Na histórica partida em que a Holanda destruiu a Espanha por 5 a 1, Robben fez um gol depois de uma disparada a 37 km/h. Segundo a Fifa, é a maior velocidade já registrada em um campo de futebol (o recorde anterior era do inglês Walcott, que correu a 35,7 km/h).

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Quais seriam os fatores que levaram os craques a brilhar de forma tão intensa? “Disputar uma Copa no Brasil, o país do futebol, motiva qualquer jogador”, disse o uruguaio Luis Suárez após a vitória contra a Inglaterra. A fantástica festa nas arquibancadas parece mover os atletas. Na semana passada, as torcidas sul-americanas, especialmente do Chile e da Colômbia, empurraram seus times rumo à classificação para a próxima fase, e é de se pensar até que ponto elas podem levar as seleções adiante. Mas a festa não é apenas de um único continente. Os estrangeiros da Holanda, da Alemanha, da França e de várias partes do mundo lotaram as ruas da Vila Madalena, em São Paulo, encheram a Praia de Copacabana, no Rio, e muitos outros lugares País afora. A Copa no Brasil tem sido uma surpresa até no campo econômico. Estimativas do governo indicam que os turistas brasileiros e estrangeiros devem gastar R$ 6,7 bilhões nas 12 cidades-sede, bem acima do que havia sido projetado. Muita gente subestimou o Mundial. Em São Paulo, previa-se a chegada de 256 mil turistas durante o torneio. Na quinta-feira 19, a SPTuris informou que pelo menos 400 mil virão à cidade. Ou até mais. A festa está linda, dentro e fora dos gramados. Quem poderia imaginar tudo isso?