Um novo escândalo se abateu sobre o governo do Espírito Santo. Desta vez, as denúncias estão em um dossiê montado pelo prefeito de Cachoeiro de Itapemirim, Theodorico Ferraço (PTB), que há alguns meses decidiu abrir fogo contra o governador do Estado, o tucano José Inácio Ferreira. Uma das partes mais quentes do papelório de Ferraço é o conteúdo de seis fitas gravadas pelo consultor Nilton Antônio Monteiro, gerente de negócios da Conterv, uma das centenas de empresas especializadas na intermediação de operações com o setor público que exploram o mercado do Estado. A conversa com o advogado João Batista Cerutti, segundo Ferraço, amigo e ex-sócio do governador José Inácio, é a transcrição mais comprometedora. Especialista em direito tributário e dono de uma das maiores bancas do Espírito Santo, Cerutti diz que o governador chegou a entrar em um negócio “porque o valor era alto”.

O negócio envolveria a concessão de um benefício tributário que depende da autorização do governo estadual. Trata-se da possibilidade de as distribuidoras de combustíveis assumirem o recolhimento dos impostos estaduais sobre o produto, pela lei, uma atribuição da Petrobras. Segundo Nilton Monteiro, o caso também envolvia a devolução às distribuidoras de impostos estaduais acumulados. Cerutti diz na degravação que o assunto chegou a provocar um encontro de José Inácio com a direção da Petrobras. Em outras negociações, o governador teria sido representado por um outro amigo: o ex-deputado e ex-ministro do Planejamento do governo Sarney, Aníbal Teixeira. Cerutti é didático ao explicar a distribuição de dinheiro a assessores nomeados pelo governador na secretaria de Fazenda do Estado. “Aí, depois que a gente acerta o valor, a gente vê como é que vai ser dividido. Cem mil para o Padilha (diretor de uma empresa envolvida)… 50 mil pra Cerutti, 50 mil pra Corrêa (Antônio Corrêa, ex-secretário adjunto de Fazenda), 50 mil para Wilson. Wilson era o chefe dos fiscais na época”, explica ele a Nilton, fazendo cálculos.

A língua solta de Cerutti também atinge a primeira-dama, Maria Helena Ferreira, responsável pela secretaria de Ação Social do Espírito Santo. Entre seus orgulhos como secretária, ela contabiliza uma fábrica que produz mistura de sopa para famílias carentes. O empresário José Carlos Alves, dono da distribuidora T.A. Oil, pagou R$ 450 mil pelo equipamento da fábrica. “Foi um acordo proposto pela primeira-dama, que prometeu nos ajudar na liberação de mais de R$ 5 milhões em créditos de ICMS que tenho junto ao Estado”, diz ele. Alves bancou parte da fábrica, mas não recebeu um tostão. Na conversa com Nilton, o advogado Cerutti diz que “a primeira-dama” teria recebido “uma certa importância” na montagem da fábrica. No seu dossiê, Ferraço acrescenta mais ingredientes à história. “A Casa da Sopa fica na capital, mas o dinheiro era movimentado por uma conta aberta em Iconha, a 80 quilômetros daqui”, diz ele. “Foram feitos vários saques na boca do caixa, em dinheiro, e entregues à primeira-dama, em mãos”, revela Ferraço. “O Ministério Público tem que investigar de onde veio e para onde foi esse dinheiro.” As fitas e documentos juntados pelo prefeito também apontam um outro integrante da família como contato para a condução de negociações com empresas: o secretário de Governo e irmão de Maria Helena, Gentil Antônio Ruy. Ferraço quer provocar a criação de uma CPI.

O deputado José Carlos Fonseca (PFL-ES), na época das gravações secretário da Fazenda do Espírito Santo, negou as denúncias de que haveria corrupção no órgão que comandava. “Os únicos créditos acumulados de ICMS concedidos durante a minha gestão foram para a Vale do Rio Doce e a Belgo-Mineira”, diz Fonseca. Antônio Corrêa, seu braço direito na Secretaria, também desmente que tenha participado de um rateio de propina e ataca o consultor Nilton Monteiro: “Trata-se de um chantagista profissional, que inclusive expulsei da minha sala”, afirma. ISTOÉ tentou ouvir José Ignácio e Maria Helena, mas eles não retornaram a ligação.

Colaborou Eduardo Hollanda (DF)