Londres é uma cidade caleidoscópica. Figuras excêntricas circulam pelo maior centro de artes da Europa – o South Bank Centre –, que fica ao lado de um dos maiores centros financeiros do planeta, a City, onde desfilam os executivos engravatados. A cidade foi o berço do movimento punk, possui uma culinária cosmopolita invejável, que vai dos maravilhosos currys indianos à feijoada e caipirinha brasileiras. Tão cosmopolita que em Londres se falam 300 línguas das minorias que a cidade comporta. Na política não é diferente. A capital da Grã-Bretanha abriga desde uma dama-de-ferro como a ex-primeira-ministra Margaret Thatcher e seus seguidores tories até ministros trabalhistas que admitem abertamente ser gays, como Peter Mandelson, que recentemente assumiu seu caso com um brasileiro.
Em mais uma de suas excentricidades, a capital britânica acaba de eleger como prefeito um esquerdista simpático e polêmico, Ken Livingstone, 54 anos, dissidente do Partido Trabalhista do primeiro-ministro Tony Blair. Na quinta-feira 4, na primeira eleição direta para prefeito da história londrina, Livingstone obteve 58% dos votos, contra 42% do conservador Steven Norris. As eleições para prefeitos e vereadores ocorreram também em 152 outras cidades da Inglaterra e País de Gales. Red Ken (Ken, o Vermelho) fez campanha cunhando frases de efeito como “Os homens que dirigem o Fundo Monetário Internacional deveriam morrer dolorosamente em suas camas” ou “Serei lembrado pelos esquerdistas por não ter sido suficientemente esquerdista”. Acusado pela propaganda do Labour de “trotskista”, que objetivamente favorecia os conservadores, Livingstone prometeu congelar as tarifas do metrô e reconhecer a união de pessoas do mesmo sexo.

A eleição direta para a Prefeitura de Londres foi uma promessa eleitoral de Tony Blair, que chegou ao poder em 1997. Livingstone era o candidato natural do Partido Trabalhista, mas aos olhos do premiê ele representava aquela ala do Labour cujo radicalismo ajudou os conservadores a se manterem no poder durante longos 18 anos. Blair então impôs como candidato o insosso Frank Dobson e Livingstone foi expulso do partido. Disputando como independente, Red Ken disparou nas pesquisas, ganhou a disputa e Dobson acabou amargando um humilhante terceiro lugar.

Alguns jornais ingleses, como o Financial Times e o Mirror, chegaram a classificar Livingstone de um “piadista” que não deveria ser levado a sério pelos cinco milhões de eleitores de Londres. Isso porque as mazelas da capital britânica não são motivo de piada. A cidade tem cerca de 55 mil desabrigados e vive uma onda de criminalidade crescente, além de sofrer com congestionamento de trânsito. E até o metrô há muito deixou de cumprir a tradicional pontualidade britânica. Mas os londrinos, ciosos de sua excentricidade, preferiram dar uma lição a Blair, que sofreu sua maior derrota política em três anos.

“Os que dirigem o FMI deveriam morrer dolorosamente em suas camas”
Ken Livingstone