Pais que participam do dia-a-dia das escolas e acompanham o desempenho dos filhos e também a atuação dos professores contribuem para um melhor aproveitamento escolar. Pelos dados estatísticos, isso é fato comprovado, como mostraram os resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), realizado no ano passado. A média em português e matemática dos alunos do ensino fundamental, nas escolas onde os pais conhecem os professores e participam de reuniões frequentes, foi pelo menos dez pontos mais alta do que a de colégios onde essa participação não ocorre. O resultado estimulou o Ministério da Educação a criar o Dia Nacional da Família na Escola, comemorado nesta terça-feira 24 nos estabelecimentos de ensino de todo o País. O objetivo do MEC é universalizar uma prática existente nas escolas de qualidade – públicas e privadas. “Imaginamos esse dia de encontro das famílias com as escolas como um modo de aproximar mais ainda os pais, filhos e professores”, explica o ministro da Educação, Paulo Renato Souza.

Os efeitos positivos dessa integração já se mostraram muito mais fortes do que os números do Saeb. A presença dos pais não se limita a acompanhar o dia-a-dia. Através das Associações de Pais e Mestres (APMs) ou como simples voluntários, eles colocam a mão na massa. No colégio estadual Brasílio Vicente de Castro, em Curitiba, por exemplo, o chileno Sergio Torres Roa, 60 anos e há 23 no Brasil, é o responsável pela manutenção dos equipamentos elétricos. Eletricista profissional, Roa era o presidente da APM quando a filha Marion, atualmente com 20 anos, ainda frequentava a escola. Hoje, é voluntário e trabalha de graça pelo prazer de colaborar. “A participação da comunidade ajudou a recuperar essa escola. Nosso trabalho segue em frente com a ajuda de todos”, comemora Roa. A diretora do colégio Brasílio, Juara de Almeida Ferreira, 35 anos, há seis no cargo, admite que a tarefa de reerguer a escola teria sido impossível sem a participação da comunidade. “Somos uma grande família. O colégio agora é considerado padrão porque a integração entre professores e pais é total”, garante Juara.

Bolo de um metro – Exemplos semelhantes são encontrados na Escola Municipal Pedro de Oliveira, em Jundiaí (SP). Além de participar das reuniões periódicas da APM e acompanhar a rotina dos filhos nas salas de aula, as mães de Jundiaí se destacam na organização de muitas festas durante o ano. Na Semana Santa, dezenas de mães estavam na escola fazendo bolos e doces para a festa da Páscoa. “Tenho uma neta de sete anos na escola. Esse bolo é um presente para ela e todas as outras crianças”, afirma Francisca Félix da Silva, 53 anos. Com as amigas Solange Pelozin, 39, Ameris Pereira, 44, e Célia Lemos, 40, integrantes da associação de pais, Francisca passou o dia preparando 25 bolos, um deles com quase um metro de largura. “Mas a gente não aparece só nas festas. O trabalho mais importante é ver como as crianças se comportam nas aulas”, observa Célia. Outra voluntária é Marinez Torricelli, 45 anos, que trabalha cinco horas por dia, de segunda a sábado, como bibliotecária na escola. Ela orienta os alunos, ajuda nas consultas e mantém a pequena biblioteca impecável. “Faço isso por amor à escola”, afirma.

Relatos como esses impressionaram o ministro da Educação, Paulo Renato. Desde o dia 23 de março ele realiza um périplo pelo Brasil a fim de convocar professores e pais para participar do Dia da Família na Escola. Até o dia 24, o ministro percorrerá 20 escolas de 18 cidades e 17 Estados. Em cada lugar, há uma surpresa, segundo Paulo Renato. As escolas visitadas foram escolhidas por terem associações de pais e mestres atuantes. “Pensei que ia gastar muita saliva para convencer pais e professores a participar. Mas quase não precisei falar”, festeja o ministro. “O que vi foram as coisas sendo realizadas na prática, de modo espontâneo, em todos os lugares que visitei”, diz.

Boas experiências se multiplicam de Norte a Sul. No bairro de Casa Amarela, em Recife (PE), a dona-de-casa Valdeci dos Santos, 51 anos, praticamente adotou a Escola Estadual Dom Bosco. Lá, estudam – ou já estudaram – seus sete filhos e seis netos. Participante assídua de reuniões da APM, Valdeci vai à escola pelo menos uma vez por semana para fazer alguma tarefa. “Sempre pergunto onde posso ajudar. A educação é o bem mais precioso que posso dar aos filhos e netos”, ressalta Valdeci. A diretora da escola, Cleonilda Miranda, reconhece que o trabalho dos pais ultrapassa em muito a simples presença nas reuniões. “O telhado estava em péssimo estado. A reforma foi feita por um grupo de pais, de graça, nos fins de semana. Pagamos apenas o material”, conta a diretora. No ano passado, a escola ficou sem professor de história e um dos pais, Antônio de Oliveira, com formação superior na mesma disciplina, o substituiu, também gratuitamente, durante dois meses.

Modernidade – Em Joinville, a escola visitada fica em uma área pobre da cidade. Construída há um ano pelo Bradesco, a pedido da prefeitura, numa área de vários conjuntos habitacionais populares, a escola Amador Aguiar também depende do trabalho dos pais para manter um bom padrão de ensino. Vice-presidente da APM, o pintor de painéis Hermes Bisewski, 37 anos, com três filhos na escola, passou as últimas semanas preparando a instalação dos computadores que equiparão o novo centro de informática. Seu fiel escudeiro é o vigilante Ademir de Morais, diretor da APM, que tem quatro filhos matriculados no colégio. “A gente faz de tudo aqui, desde instalar computador, trocar lâmpadas, até promover torneios de futebol para arrecadar fundos para projetos especiais”, afirma Ademir. Para a diretora Gisélia Busarello, essa participação é fundamental para o sucesso de seu próprio trabalho. “Aqui, a cobrança é constante, mas o resultado é bom para todos”, assegura Gisélia.

Em Campo Grande (MS), o desafio de Maiza Delmonis, 35 anos, presidente da Associação de Pais e Mestres da escola Plínio Barbosa Martins, com 1.300 alunos, é integrar os vários grupos de pais. Inaugurada no final do ano passado, a escola absorveu alunos de quatro pequenos estabelecimentos de ensino da periferia da cidade. “Já estamos conseguindo que 250 pais e mães participem das reuniões. A dificuldade é que muitos só aparecem na escola quando existem problemas graves com seus filhos. Mas, aos poucos, vamos mudar esse quadro”, promete Maiza. Ela acha que o dia nacional proposto pelo ministro é apenas o começo. Para Paulo Renato, a lição mais importante aprendida em suas viagens é que já existe entre muitas famílias uma clara consciência da necessidade de participar da rotina escolar dos filhos.

Será que é?

Parece cena de um candidato em campanha, mas Paulo Renato jura que não é. O coro de crianças na escola Amador Aguiar, em Joinville, canta o jingle da campanha do Dia Nacional da Família na Escola. Entusiasmado, o ministro Paulo Renato rege as crianças e canta junto com familiares que lotam o ginásio da escola. “Continuo tentando ser candidato ao Senado pelo PSDB de São Paulo. Qualquer passo além disso não depende exclusivamente da minha vontade”, garante. Em nenhum momento de suas andanças pelo País, o ministro da Educação tem falado de qualquer assunto, nos discursos, que não seja o do programa da família na escola. Não deixa, porém, de ser submetido a um teste de popularidade.

A regência do coro se repetiu em Curitiba, Jundiaí e em todas as outras cidades. O ministro também carregou criancinhas no colo e foi saudado com gritos de “lindo” por mães entusiasmadas. Teve também a companhia de políticos de diversos partidos. Em Cuiabá, o governador Dante de Oliveira (PSDB) levou o ministro ao tradicional Liceu Cuiabano, onde uma fanfarra fez uma exibição. Em Campo Grande, o prefeito André Puccinelli (PSDB) tentou aparecer mais do que o ministro, louvando a escola que inaugurou pouco antes das eleições de 2000. Ao lado do governador Zeca do PT, anfitrião na escola Maria Constança de Barros Machado – cujo prédio, um projeto de Oscar Niemeyer, foi tombado pelo Patrimônio Histórico –, o ministro encontrou dificuldades. Zeca e Paulo Renato foram surpreendidos por professores em greve que faziam um corredor para eles, no caminho para o auditório. No final, o ministro conversou com os líderes do movimento e até marcou uma audiência, em Brasília. “Não posso mais cancelar compromissos por causa de manifestações contrárias”, observou. Pode ser que, em 2002, ele seja mesmo candidato ao Senado por São Paulo. Mas o treino para vôos mais altos, na verdade, já começou.