Ninguém melhor do que Antônio Poteiro para simbolizar através de sua obra e vida os 500 anos do Brasil. Não à toa o quadro As duas pátrias se encontrando desse pintor português, radicado no Brasil desde os dois anos de idade, foi escolhido para ser o presente oficial que Fernando Henrique Cardoso deu ao presidente português Jorge Sampaio durante os festejos brasileiros em Porto Seguro. Mas não foi somente esta a participação do pintor nas comemorações. Na semana passada, Poteiro, 75 anos, abriu uma exposição sobre a história do Brasil no Teatro Nacional Cláudio Santoro de Brasília. Em 22 telas ele fez um retrato antropológico do povoamento do País desde a chegada das primeiras caravelas até a construção de Brasília. Em seu traço primitivista estão retratados os momentos mais importantes da história nacional, como o tráfico de negros, a expulsão dos franceses e holandeses, a proclamação da República, a Inconfidência Mineira e a inauguração da nova capital.

A exposição é também autobiográfica. No quadro que o artista chamou de Poteiro no cerrado, ele mostra a primeira vez que visitou a cavalo a área onde seria construída Brasília. Alguns anos depois, Poteiro, que ainda não era pintor, chegou à capital carregando um caminhão de potes de barro (daí seu apelido) para vender na inauguração da cidade. Esse outro momento da sua vida está retratado na tela Capital da esperança. Na sequência, pintou O sonho de Dom Bosco, no qual aparecem o presidente Juscelino Kubitschek e os arquitetos Oscar Niemeyer e Lúcio Costa em cima de um arco-íris. “O arco-íris é o sonho e Brasília era um sonho”, conta. “Minha obra é muito influenciada por essa cidade, pelo Centro-Oeste. As cores dos meus quadros são as cores do céu de Brasília.”
Mas Poteiro só veio mesmo experimentar os pincéis sete anos depois da inauguração da capital. Foi depois que conheceu o artista plástico Siron Franco, em 1967, que se entregou à pintura. “Ele viu os potes que eu fazia e disse: ‘Poteiro você é pintor.’ Eu nunca havia pintado nem parede e ele jogou o pincel na minha mão e disse para eu fazer o que quisesse”, recorda. Há quem veja na obra do artista um desenho de criança. Ou então quem já o considere o maior primitivista das Américas, ou mesmo quem, como o crítico Olívio Tavares de Araújo, repudie o rótulo de primitivista. “O que sobra ao artista português/mineiro/goiano é exatamente o que falta aos primitivos de carteirinha: a qualidade plástica, a serviço de uma imaginação borbulhante”, define Araújo. “Eu faço o que quero. Sou irresponsável, um molecão. Quem fala que eu sou pintor são os outros”, resume Poteiro.


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