A Operação Condor, sinistro plano de repressão política multinacional que foi posto em prática pelas ditaduras militares da América Latina nas décadas de 70 e 80, vai ser investigada também no Brasil. O sinal verde foi dado pelo ministro Carlos Velloso, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), e surpreendeu até o juiz argentino Claudio Bonadio, que investiga os crimes da Operação Condor em seu país. “Foi uma boa surpresa. As vítimas estão mortas, mas agora poderemos saber o que aconteceu”, afirmou. A operação, um produto da mente do ex-ditador do Chile Augusto Pinochet e que teve como “sócios” Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia, permitiu que agentes da repressão de cada um desses países atuassem em conjunto como parceiros, especialmente na perseguição a dissidentes políticos e exilados. A decisão de Velloso, respaldada por parecer do subprocurador-geral da República, Cláudio Fontelles, endossado pelo procurador-geral Geraldo Brindeiro, refere-se a uma carta rogatória encaminhada à Justiça brasileira por Bonadio. Na carta, é pedido aos órgãos de segurança brasileiros informações sobre a Operação Condor no Brasil e sobre o destino de três desaparecidos políticos argentinos, que foram presos no Brasil por policiais argentinos em 1980.

Mas o caso dos argentinos Horacio Campiglia, Monica Pinus de Binstock e Lorenzo de Ismael Viñas, que integram a longa lista de desaparecidos do regime militar argentino e sumiram no Brasil, não é o único que poderá começar a ser desvendado com a decisão do STF de permitir as investigações. “Estou mais do que convencido de que a morte de João Goulart em 1976 no exílio na Argentina pode ter sido um assassinato”, dispara o ex-governador do Rio, Leonel Brizola, cunhado de Jango, que passou parte de seu longo exílio no Uruguai. Um dos pontos que Brizola destaca é que nunca foi feita a autópsia de Jango, o que considera estranho. “Tratava-se de um ex-presidente exilado. Como o governo argentino enviou seu corpo ao Brasil sem ter tomado essa providência básica?”, indaga.

Segundo o brigadeiro Márcio Calafange, que foi adido militar em Santiago na ditadura de Pinochet, a cooperação através da Operação Condor envolvia até informações sobre economistas brasileiros da Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) que eram investigados pela Dina (polícia secreta chilena). Na lista de brasileiros que a Dina deveria acompanhar estavam Fernando Henrique Cardoso, classificado como “agitador com elevado poder de persuasão”, Florestan Fernandes, Caio Prado Jr. e outros intelectuais e políticos. Mas àquela altura, FHC, que viveu no Chile nos anos 60, já se exilara em Paris.

O brigadeiro Márcio Calafange afirma que o Brasil “ajudava o Chile na busca de subversivos, no intercâmbio de informações entre os regimes militares. Havia vôos específicos para ajudar o Chile, onde a Dina agia como um poder paralelo”. O general Dilermando Gomes Monteiro, também já falecido, disse em depoimento que uma vez o Serviço Nacional de Informações (SNI) vetou a condecoração de um empresário paulista “com base em informações dadas por agentes argentinos sobre as atividades esquerdistas do empresário na sua juventude”.