i68772.jpg

Gomorra, a cidade bíblica que sucumbiu à corrupção e à devassidão, serve de trocadilho para Camorra no best seller do jornalista italiano Roberto Saviano sobre a máfia napolitana envolvida com tráfico de drogas, prostituição, pirataria de altacostura e depósito de lixo tóxico, entre outras atividades ilegais. Segundo Saviano, a organização criminosa fatura por ano 150 bilhões de euros, quase o triplo do que movimenta mundialmente a Fiat. E isso à custa de dez mil mortes em 30 anos de existência, mais que as vítimas do conflito entre Israel e a Palestina. Maior sucesso editorial da Itália nos últimos anos (foi lido por mais de 1,5 milhão de pessoas, cerca de 2,5% da população), o livro foi adaptado para as telas pelo diretor Matteo Garrone e está sendo considerado um marco do renascimento do cinema italiano. Vencedor do prêmio da crítica do Festival de Cannes, Gomorra representará seu país no Oscar 2009 e promete ser a grande sensação da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo que se inicia na sexta-feira 17. Não é para menos: o filme é o Cidade de Deus italiano.
Filmado na degradada periferia de Nápoles, o policial sociológico entrelaça cinco histórias de pessoas afetadas pela violência criminosa. Entre eles está o garoto Totò, cujo sonho é ser aceito na máfia (a cena de sua iniciação, vestido com um colete à prova de bala e recebendo um tiro no peito é arrepiante). O autor Roberto Saviano não teve medo de revelar os tentáculos globalizantes da organização e há dois anos vive ameaçado de morte e sob proteção policial. O filme tem a mesma coragem. A pirataria é mostrada por meio de um alfaiate que trabalha para a Camorra copiando modelitos de alta-costura. Contratado pelos imigrantes chineses para ensinar o ofício, escapa da morte a tempo de ver um vestido que fez e vendeu por uma ninharia ser usado pela atriz Scarlett Johansson. Paralelamente, vê-se um camorrista que enterra centenas de barris de lixo tóxico na periferia da cidade. Seu ajudante, ao jogar fora um cesto de pêssegos deteriorados pela poluição do solo, colhidos por sua mãe esclerosada, decide sair do negócio sujo. "Vá então fazer pizza", diz o patrão, sintetizando o caráter "industrial" e globalizado da Camorra, completamente desnudada nesse filme assustador.