País árabe mais pobre do mundo, onde cerca de 60% da população precisa de assistência humanitária para sobreviver, o Iêmen é conhecido hoje como base do braço agressivo da Al Qaeda. Na semana passada, o governo do país deu início a uma nova ofensiva contra a rede terrorista, a maior desde 2012. Realizada na terça-feira 29, a ação do Exército contra a Al Qaeda resultou na morte de 18 soldados e 12 terroristas. De acordo com o presidente Abdu Rabbu Mansur Hadi, entre os 12 integrantes da Al Qaeda mortos estariam cidadãos “do Brasil, da Holanda, da Austrália, da França e de outros países.” Na esteira das declarações de Mansur Hadi, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil e das demais nações citadas iniciaram uma investigação em conjunto para confirmar a informação de que os ataques teriam vitimado cidadãos naturais de seus respectivos países, mas até a quinta-feira 1º o governo iemenita não havia identificado os mortos. O Itamaraty não descarta que os passaportes sejam falsos. Integrantes do Itamaraty ponderam que, embora o modelo novo do passaporte brasileiro – de capa azul, com registros biométricos e outros itens de segurança similares aos existentes em cédulas – seja difícil de fraudar, já foram encontrados vários casos de falsificações recentemente. Por não ter uma representação diplomática no Iêmen, o Ministério das Relações Exteriores deslocou um funcionário locado em Riad para acompanhar o caso. Se a tese da falsificação dos passaportes for derrubada e a nacionalidade dos terroristas confirmada, será o primeiro caso da existência de jihadistas brasileiros.

abre.jpg
ATAQUE
A ação do Exército do Iêmen contra a Al Qaeda,
na terça-feira 29, foi a maior desde 2012

Hadi é um presidente ainda em busca de legitimidade. Ele foi vice-presidente por 20 anos de Ali Abdullah Saleh, que deixou o poder pressionado por protestos em massa em 2011. Ao assumir o cargo, depois de uma eleição de candidato único e baixo engajamento, Hadi enfrentou dezenas de rebeliões do Exército, que estava politicamente dividido. Tornou-se aliado próximo dos Estados Unidos – Washington transfere anualmente milhões de dólares ao país – e colocou como prioridade o desmantelamento da célula da Al Qaeda na Península Arábica (AQPA, na sigla em português). O enfraquecimento da sede da Al Qaeda no Paquistão, seguido do assassinato de Osama bin Laden, em 2011, coincidiu com o avanço dos redutos da organização islâmica no Iêmen. Se em 2009 as estimativas davam conta de que a AQPA, então recém-formada, tinha entre 200 e 300 membros, hoje o número está em cerca de mil, segundo o Departamento de Estado americano. No ano passado, a suspeita de uma conspiração terrorista da AQPA levou os EUA a fecharem dezenas de escritórios diplomáticos no Oriente Médio, na África e no Sul da Ásia por duas semanas. Em dezembro, membros da AQPA atacaram um hospital dentro do Ministério da Defesa, matando mais de 50 e deixando mais de 100 feridos.

01.jpg
"Esses estrangeiros não se importam com a situação
do Iêmen nem se nos destruírem"

Abdu Rabbu Mansur Hadi, presidente do Iêmen

A resposta americana está centrada em drones (aviões não tripulados), iniciativa polêmica apoiada pelo presidente iemenita. As estatísticas oficiais mostram que a CIA (serviço secreto americano) e o comando de operações especiais do Exército coordenaram 92 ataques de drones no Iêmen durante o governo de Barack Obama. Eles mataram quase mil pessoas, inclusive civis inocentes, mas os números podem ser ainda maiores, dada a falta de transparência da Casa Branca neste tópico.

No Brasil, atividades extremistas ligadas a grupos internacionais são investigadas há quase dez anos. O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Alexandre Camanho, acompanha as atividades de inteligência relacionadas a esse monitoramento desde o início e diz que não se surpreenderia se de fato houvesse brasileiros envolvidos com a Al Qaeda no Iêmen. “O terrorismo é um fenômeno globalizado”, afirma. “Há uma nova geração de pessoas nascidas no Brasil a serviço da causa jihadista e um permanente recrutamento de brasileiros para a participação em cursos de religião, que na verdade são cursos de extremismo.” A cooptação seria maior nas regiões rurais do Sul e do Nordeste. Embora não ocorram ações jihadistas no País, o procurador sustenta que há atividades de financiamento, conspiração, propaganda, ciberterrorismo e radicalismo virtual. Ainda assim, seria ingênuo interpretar a denúncia do presidente do Iêmen sem ressalvas.

02.jpg

Fotos: Yemen’s Defense Ministry, Natalia Kolesnikova – AP