LEANDRO PIMENTEL

SATISFAÇÃO Novelista afirma que está menos cáustico e mais otimista

Passou o inferno astral do autor Aguinaldo Silva. Depois de amargar uma audiência morna, sua novela Duas caras, que vai ao ar às 21h na Rede Globo, saiu do buraco e chegou a bater até o campeão Jornal Nacional. O folhetim vinha mantendo uma audiência média de 38 pontos no Ibope desde sua estréia. Na segunda-feira 7 chegou a 42 pontos e no dia seguinte atingiu seu pico: 45 pontos. Ficou sete pontos acima do telejornal apresentado por William Bonner e Fátima Bernardes. Para uma novela que parecia sem rumo, cujo autor afastou-se da dianteira alegando stress e cinco dias depois assumiu de novo o posto alegando "saudade", tratase de um resultado surpreendente. De seu escritório no apartamento da Barra da Tijuca, onde tece diariamente sua trama, Aguinaldo explica a receita com a segurança de quem tem uma trajetória de 13 trabalhos: "Duas caras virou finalmente o que é uma novela: um novelo que a gente vai desenrolando."

Nada que lembre o clima de pressão de dois meses atrás. Colocando a culpa na recente concorrência da tevê a cabo e da internet, na época Aguinaldo passava por cima do planejamento global e adiantava cenas da novela em seu blog, espaço em que andou falando mais do que devia. Ao opinar, por exemplo, sobre a decisão do ministro da Cultura, Gilberto Gil, de pedir a dupla cidadania italiana, ele argumentou que o certo seria ele tentar a África. A irritabilidade acabava contaminando sua escrita. "Amenizei o lado mais cáustico que estava adotando e que as pessoas estranhavam", diz ele. "Dei também um tom mais otimista ao enredo." No conjunto de mudanças que acabaram dando resultado, ele apelou naturalmente para o sexo e a violência. Mas o que anda contando mesmo na boa performance de Duas caras é a fórmula infalível de apostar no confronto direto dos personagens segundo a conhecida gradação de vilania e bom-mocismo.

Uma das razões apontadas por Aguinaldo para o desempenho atual do folhetim é a mudança de atitude da protagonista. A mocinha ficou menos chata e resolveu partir para cima do mau-caráter que a enganou. É uma fórmula batida, que não tem como contornar: "O público quer que ela seja doce e não tenha falhas", diz. Foi necessário que acontecesse uma interferência externa – no caso, não dos espectadores, mas do Ministério da Justiça – para que as mudanças viessem de forma emergencial. A tentativa de excitar o público com as cenas de "dança do poste" de uma dançarina stripper acabou rendendo dor de cabeça para a emissora, que teve a faixa etária da novela reclassificada de 12 para 14 anos. Aguinaldo providenciou então a explosão da uisqueria onde aconteciam esses espetáculos e ganhou tempo para intrigas mais quentes.

Na favela Portelinha, por exemplo, a temperatura chegou a quase 40 graus. Apesar de o autor ter dito que não exploraria a violência, dedicou na semana passada quase um capítulo inteiro às fortes cenas da invasão da favela por traficantes. Nunca se viram tantas armas em um folhetim global. Aguinaldo nega ter apelado para a violência com o olho na audiência: "Não podemos fingir que levamos uma vida normal." Ele defende que em Duas caras essa violência é idealizada. Suavizada ou não, o autor segue a tendência realista que tomou conta da teledramaturgia e que também está dando resultados no horário nobre global.