Os meninos do Pan

Morador da favela do Vidigal, na zona sul, o carioca Eder Almeida, 16 anos, está acostumado a cenas de violência ao seu redor. Uma das que ficaram em sua memória foi a vez em que um traficante o despertou depois de esmurrar a porta de sua casa em busca de um comparsa. Filho de um mestre-de-obras, Eder espera que momentos como esses fiquem para trás. Principalmente agora que obteve um diploma que lhe permite sonhar com dias melhores. O rapaz é um dos jovens selecionados pela Secretaria Nacional de Segurança Pública, do Ministério da Justiça, que trabalharão nos Jogos Pan-Americanos de 2007. Batizado de Medalha de Ouro, o projeto feito em parceria com as Organizações Unidas (ONU) pretende capacitar, ao todo, 12 mil pessoas de comunidades carentes, entre 14 e 28 anos, para atuar na brigada de primeiros socorros e como guias cívicos, que auxiliarão a organização do evento, entre outras atividades.

A seleção do grupo começou em julho de 2006, a partir da identificação de lideranças em 149 comunidades de baixa renda feita pela Secretaria de Segurança Pública. Na semana passada, os jovens que já concluíram o treinamento ganharam seus diplomas em uma solenidade no Maracanã, na qual estiveram presentes o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os ministros Tarso Genro, da Justiça, e Orlando Silva, dos Esportes. “É uma oportunidade excelente para estes jovens, que melhoram o currículo e recebem bolsa-auxílio”, avalia Ronaldo de Oliveira, gerente do projeto de guias cívicos. O adolescente Johnny Silveira, 15 anos, é exemplo disso. Ele ficou quatro meses estudando espanhol e já arrisca frases, ainda que no estilo portunhol. Johnny é filho de um comerciário e de uma auxiliar de cabeleireiro e está na oitava série. O trabalho como guia vai render à família uma bolsa-auxílio de R$ 175.

Cursos de idiomas (inglês e espanhol) e aulas sobre cidadania, ética, solidariedade, trânsito e turismo foram oferecidos pelo Sistema Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan). A turma dos brigadistas-socorristas foi treinada em combate a incêndio e noções de defesa civil, além das noções de primeiros socorros. Formada nesse grupo, a comerciária Natália da Silva Machado, 28 anos, planeja entrar para o Corpo de Bombeiros. “É uma chance única na vida”, aposta Natália, que mora com o pai, aposentado, na Vila da Penha, na zona norte. Para a estudante Chayane Nascimento, 15 anos, houve ainda mais um benefício. Segundo a menina, melhor do que aprender espanhol foi conhecer os pontos turísticos do Rio. “Adorei o Morro da Urca e o Mirante da Pedra da Gávea”, vibra. Tudo estaria muito bem se durante a cerimônia de formatura não tivesse surgido um tumulto provocado por facções das comunidades atendidas pelo projeto. Contida a confusão, restou a sensação de que iniciativas que resgatam a cidadania são cada vez mais essenciais para de fato virar o jogo da vida.