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PERSEGUIÇÃO Ameaçados de morte, os atores Zekiria Ebrahimi e Ahmad Khan, que interpretam Amir e Hassam, tiveram de fugir do Afeganistão

O filme O caçador de pipas, a esperada adaptação para o cinema do best-seller do escritor afegão Khaled Hosseini, que estréia no Brasil na sexta- feira 18, é tão contundente e emocionante quanto o livro lançado em 2003. É impossível não chorar em diversos momentos da história dos garotos Amir (Zekiria Ebrahimi) e Hassam (Ahmad Khan), que cresceram no Afeganistão na década de 70. Mesmo resumido em sua versão cinematográfica, o drama preserva seu forte apelo emocional. O roteiro enxuto de David Benioff deixou de fora do filme boa parte dos aspectos históricos e políticos que, no livro, ajudam a explicar as razões dos intermináveis conflitos existentes por décadas no Afeganistão. Em contrapartida, o diretor Marc Forster aposta na ação e explora habilmente ingredientes que garantem emoções fortes e singelas, como o lirismo das cenas infantis (destaque para as imagens belíssimas da competição de pipas), a violência da guerra real e a pungente trajetória do protagonista Amir (Kalil Abdala, na parte adulta), que vai ao inferno para tentar resgatar uma dívida pessoal com um amigo de infância. O pecado de Amir: aos 12 anos, ele se omitiu diante do estupro de seu melhor amigo, Hassam, violentado por um adolescente da elite étnica pashtum (a mesma à qual Amir pertence).

O filme começa em São Francisco, em 2000, quando o protagonista, que se tornara um escritor famoso, recebe um telefonema de um tio que foi o seu grande incentivador nas letras e mora no Paquistão. Ele irá revelar ao sobrinho que o seu amigo de infância Hassam foi morto pelos talebãs. É o ponto de partida da saga que levará Amir de volta a Cabul, controlada pelos fundamentalistas, para resgatar o filho de Hassam, aprisionado num estádio de futebol junto a outras crianças órfãs. Amir tem aí a chance de se redimir do passado que o envergonha. O mergulho nos horrores promovidos pelo regime talebã e a escolha de atores do Afeganistão para imprimir mais realismo à história era um objetivo tanto do produtor, o americano Sam Mendes, quanto do diretor, Marc Forster.

A cena do estupro, no entanto, caucausou um imenso transtorno aos atores e suas famílias – e, por tabela, aos estúdios Paramount e ao serviço de inteligência americano. A violência sexual é encarada como desonra inaceitável pela cultura islâmica e o fato de se tratar de uma ficção não aliviou em nada o impacto da notícia desta cena em Cabul. Em razão disso, a estréia do filme precisou ser adiada por duas semanas nos EUA e o próprio governo do Afeganistão aconselhou o estúdio americano a retirar os meninos e suas famílias do país por temer represálias da população, já que eles vinham sendo ameaçados. Com apoio da CIA, os atores e familiares foram levados no mês passado para os Emirados Árabes. A Paramount teve de providenciar escolas para que os meninos pudessem continuar os estudos até poderem retornar ao país. O que ainda não aconteceu.

Na busca de autenticidade, a maior parte das cenas foi rodada em Kashgar, no oeste da China, província majoritariamente muçulmana, cuja população usa burcas e tem a cor de pele mais escura. Ousadia maior, contudo, foi adotar o idioma dari (segunda língua mais falada no Afeganistão) nessas seqüências – a platéia americana não suporta assistir a filmes com legendas. Apesar disso, a história tem ritmo e estilo bem americanos. Guarda poucas semelhanças com o tom contemplativo e semidocumental comum às produções do Oriente Médio. E que ninguém se engane: Caçador de pipas é o primeiro "filme afegão" para americano ver.