A crise nos aeroportos desencadeada dias atrás pela operação padrão dos controladores de vôo e que deixou milhares de passageiros em desespero é o pano de fundo de uma batalha entre militares e civis em torno do espaço aéreo brasileiro. Está em jogo muito mais do que aumentos salariais e folgas para 2,8 mil trabalhadores. Disputam-se poder, empregos e dinheiro – cerca de R$ 550 milhões por ano. Ainda é impossível saber quem vai vencer, mas já se pode prever que o presidente Lula iniciará o segundo mandato com um novo ministro da Defesa e provavelmente com novos comandantes na Aeronáutica, Marinha e Exército.

O deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) e o ex-ministro Nelson Jobim são nomes cotados para assumir o posto de Waldyr Pires no Ministério da Defesa. Nos comandos militares, a polêmica maior se dá em torno da Aeronáutica. Nos últimos três anos, o brigadeiro Luiz Carlos Bueno conduziu a Força afinadíssimo com os planos de Lula. O presidente reconhece que ele foi hábil ao desengavetar o projeto de US$ 800 milhões para modernização da frota dos caças supersônicos Mirage III e acabou assegurando que o processo de compra dos novos aviões traga tecnologia de ponta para o Brasil, em especial para a Embraer. Lula sabe que a substituição de Bueno pode jogar por terra essa conquista, pois dentro da FAB há oficiais que defendem opções que passam longe da transferência de tecnologia. Na noite da segunda-feira 6, Lula foi informado de que Bueno já alertara tanto o Ministério da Defesa como a Casa Civil de que a situação dos controladores de vôo estava para explodir. A amigos, Bueno tem dito: “Se cair, caio de cabeça erguida.” Mesmo constrangido, porém, Lula avalia que terá de substituir Bueno.

A princípio, o nome desejado pelo presidente para comandar a Aeronáutica seria o do brigadeiro José Carlos Pereira, atual presidente da Infraero. Ele é amigo do presidente, mas sua gestão tem sido muito criticada e a gota d’água se deu durante o colapso nos aeroportos, quando Lula descobriu que ele havia assinado portaria para que todos os funcionários da Infraero enforcassem a sexta-feira 3 por conta do feriado do dia anterior. Com Pereira fora da disputa, o brigadeiro José Américo dos Santos, que trabalha com Waldyr Pires na Defesa, passa a ser o nome mais cotado. É apoiado pelo quase ex-ministro. Também disputa o cargo o brigadeiro Juniti Saito, chefe do Estado-Maior da FAB. O problema é que na disputa pelos novos caças, Saito se posicionou contra o que defendia o Planalto. E ter um comando absolutamente fiel é fundamental para o projeto de Lula. O presidente quer desmilitarizar o setor aéreo. Criou a Agência Nacional de Aviação Civil e agora quer transferir o controle do tráfego aéreo para os civis. Com Bueno à frente, o alto comando da Aeronáutica aceita transferir o controle do tráfego civil para a Anac. Mas a Força Aérea precisaria de um novo sistema de defesa. Na maior parte dos países há dois sistemas, um militar, outro civil. Na França, todo ano os controladores entram em greve – e cria dores de cabeça em toda a Europa. Lula precisa pensar bem antes de tomar uma decisão.

O presidente também está disposto a trocar os comandos da Marinha e do Exército, mas por outras razões. No caso do Exército, trata-se do controle da área de informações. Lula quer tirar a Abin da influência militar. O general Francisco Albuquerque é contra. Nesse efeito dominó, cai também o comandante da Marinha, almirante Roberto Carvalho. Não há nada contra ele. Mas sua queda ajuda na versão de que não haveria crise militar, apenas renovação de governo.

Fidelidade: nos últimos três anos, o comandante da Aeronáutica
garantiu tecnologia para o Brasil