Quando o vice-presidente José Alencar entrou na manhã da quarta-feira 8 na sala de reuniões do Palácio do Planalto para um encontro do grupo de coordenação política, não pôde deixar de notar os olhares evidentes de comoção. Algumas horas depois, ele embarcaria no avião que o levaria aos Estados Unidos para o início de um delicado tratamento de combate a um câncer no abdome. Alencar respondeu aos olhares com um largo sorriso. “Ninguém precisa se preocupar comigo”, avisou. “Meu médico é o papa, já tratou de mais de cinco mil casos iguais ao meu”, continuou. Alencar referia-se ao cirurgião americano Murray F. Brennan, que de fato tem no currículo mais de cinco mil operações bem-sucedidas. Na próxima sexta-feira 17, Brennan vai operar o vice-presidente no Memorial Sloan-Kettering Cancer Center, considerado um dos maiores centros oncológicos do mundo. Na terça-feira 14, Alencar terá a primeira consulta com o cirurgião.

A confiança de José Alencar baseia-se num ponto, conforme contou a seus colegas de governo. No dia 18 de julho, ele submeteu-se a uma operação de retirada de um tumor, considerado maligno, na região retroperitoneal. Em exames depois da cirurgia, verificou-se a reincidência em dois pequenos pontos no mesmo local em que foi extraído o primeiro tumor. São esses dois nódulos que o vice-presidente tratará agora. Seu otimismo baseia-se na informação, dada pelos médicos, de que a reincidência da doença é comum em mais de 50% dos casos. Como está circunscrita a esses dois pontos, ela pode ser tratada. “Podem ficar tranqüilos que ainda vou dar muito trabalho nas próximas eleições", assegurou ele antes de se despedir.

O pedido de Alencar, no entanto, não surtiu o efeito desejado. Seus colegas de governo estão apreensivos. Primeiro, porque o simpático vice-presidente é muito querido por todos. Segundo, porque, de qualquer maneira, a cirurgia e o tratamento de José Alencar o deixarão afastado do cargo por um bom período. Isso, de saída, dá outros contornos à disputa pela presidência da Câmara dos Deputados. Na linha de sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o terceiro nome é o do presidente da Câmara. Será aquele que substituirá Lula nas suas ausências e impedimentos. A vez, agora, é do comunista Aldo Rebelo. Lula viajará para a Venezuela na noite do domingo 12, com volta marcada para a noite da segunda-feira 13. Nesse período, o presidente será Aldo. Até a doença de Alencar, o presidente não pretendia interferir diretamente nessa disputa. Manifestava, nas conversas reservadas, a sua preferência pela reeleição de Aldo, mas admitia que os acertos acabassem por fazer com que o cargo ficasse com o PMDB, dono da maior bancada. Agora, Lula começa a trabalhar de fato para que Aldo Rebelo permaneça. É em quem ele confia. Se não der, trabalha para que o eleito seja, ao menos, um nome palatável dentro do PMDB. Nesse partido, o nome que hoje desponta como provável sucessor de Aldo é o do deputado Geddel Vieira Lima. Geddel foi aliado importante na vitória do petista Jaques Wagner na disputa pelo governo da Bahia. Mas é um neófito na tropa governista. Antes das eleições, era ferrenho adversário do governo e próximo do grupo oposicionista em seu partido. “Por enquanto, está tudo bem. Mas, e se houver uma crise, o Geddel fica comigo?”, questionou Lula numa conversa esta semana. Ele precisa de alguém de confiança para guardar o lugar de Alencar até a sua volta. E torce para que Alencar, bem, volte o quanto antes.