Se o diretor de cinema australiano George Miller fosse fiel à sua nacionalidade, agora seria a vez de os cangurus protagonizarem um de seus filmes de animação. Miller já colocou suínos sob os holofotes de Hollywood em Babe – o porquinho atrapalhado. Imaginava-se, então, que era chagada a hora dos cangurus. Imaginou-se em vão. O cineasta preferiu embarcar nas geleiras e vem com o divertido Happy feet – o pingüim (Happy feet, Austrália/EUA, 2006). Essa animação estréia na sexta-feira 24 e é uma grata surpresa deste final de ano. Segundo Miller (criador da série Mad Max), a escolha desse animal que já provocou filas no mundo inteiro com o documentário Marcha dos pingüins e fez muita gente rir no desenho Madagascar não passou de uma coincidência: os pingüins sempre o atraíram devido às suas características antropomórficas, pela particularidade de se abraçarem para se protegerem do frio e, principalmente, pelo fato de escolherem seus parceiros sexuais através do canto. Pode ser que tudo isso não passe de desculpas para o uso desses “personagens” que são garantia fácil de sucesso. Não importa. Conta, isso sim, que Miller realizou uma ótima animação.

Misto de musical e Contatos imediatos do 3º grau, o filme conta a história de Memphis (dublado por Hugh Jackman), um pingüim da raça imperial que anda à maneira de Elvis Presley – corpo balançando, meio roqueiro e meio caubói. Ele conquista o coração da sinuosa Norma Jean (Nicole Kidman) cantando Heartbreak Hotel e ela corresponde às “cantadas” rebolando ao som de Prince na música Kiss. Eles se casam e não conseguem esconder a decepção com o filhinho Mano (Elijah Wood), que não é capaz de emitir sequer uma nota musical sem desafinar. A salvação é que o pingüinzinho se porta desde a casca do ovo como um verdadeiro Fred Astaire – ou seja, é um exímio bailarino. Mano nasce sapateando e com isso acaba despertando a paixão de Gloria (Brittany Murphy) e o respeito de uma gangue latina de pingüins rebeldes da raça Adelie (menores), liderada por Ramon (Robin Williams). Tudo acabaria bem se esse comportamento alegre não chocasse os pingüins mais velhos da comunidade, a começar pelo ancião Noé (Hugo Weaving), que num acesso de fúria culpa o pobre Mano pela escassez de peixes e o expulsa de sua comunidade.

Para dar movimentos personalizados a toda essa turma, a produção consumiu três anos e US$ 85 milhões, envolvendo batalhões de técnicos e sofisticados softwares. Os movimentos de câmera seguem toda a lógica de um filme “de verdade” e as seqüências dançadas por Mano, Ramon, Glória e demais bichinhos foram coreografadas por Savion Glover, discípulo direto de Sammy Davis Jr., e Gregory Hines, mestre do sapateado. Embora inclua nomes como os de k. d. lang, que abre e fecha o filme com Golden slumbers / The end, dos Beatles, a trilha sonora é em sua maior parte interpretada pelo próprio elenco. George Miller acertou em tudo, principalmente em trocar cangurus por pingüins. Não foi à toa que Robert Altman inseriu em seu novo filme, A última noite, a piada clássica dos dois pingüins. Um diz para o outro: “Parece que você está de casaca.” O outro responde: “E o que te faz pensar que eu não estou?” Pingüins são mesmo o máximo.